A brasiliense Juliana Valentim acaba de lançar seu quarto livro e busca levar o alento que encontrou na poesia durante os anos de pandemia aos seus leitores. Durante o isolamento, a escritora usou as redes sociais para compartilhar seus poemas e interagir com o público.
Depois de perceber o quanto essa interação fez bem a si e aos outros, resolveu escolher alguns dos escritos mais curtidos e compartilhados e transformar em livro, para permitir que a experiência se tornasse também física.
Assim nasceu o Palavras que dançam ao redor do sol, que reúne 365 poemas. Batemos um papo com a poeta e falamos sobre a importância que as palavras compartilhadas podem ter na vida das mulheres.
Como começou a sua relação com a poesia e a escrita?
Sempre digo que comecei a ler e escrever antes mesmo de ler e escrever. Minha família sempre teve uma relação próxima com a leitura. Meu pai, além de ler muito, também lia para os filhos, estava sempre com um livro na mão. Tenho lembranças vivas das primeiras vezes que visitei bibliotecas e me apaixonei. Quando comecei a escrever, nunca mais parei. A poesia é um gênero em que me sinto mais confortável. Ela brota naturalmente, faz parte da minha vida desde sempre.
O que te motivou a escrever o último livro e por que escolheu um poema para cada dia do ano?
Fiz o caminho inverso dos primeiros livros. No primeiro que lancei, eu publiquei e depois compartilhei as poesias na internet. Este foi o contrário, escrevi essas poesias nas redes sociais, as relacionando com a pandemia e com o que as pessoas precisavam e queriam ler. Senti um engajamento muito grande, as pessoas curtiam e compartilhavam mais. Acredito que todo mundo estava precisando de um pouco mais de poesia. Ao ver o quanto aquilo foi positivo, resolvi fazer uma curadoria e publicar o livro, afinal ele é diferente, tem um charme e encanto especial. O formato seguiu a ideia de termos uma pílula poética para cada dia. Um pouquinho de encanto por dia.
Entre elas, quais as suas preferidas e por quê?
Meu Deus! Essa é difícil. Tenho algumas que gosto mais, converso muito com público e, quando vejo que um ganhou mais espaço, ganhou o mundo, acabo me apaixonando um pouco mais por esse poema. Uma professora da Universidade Federal do Acre me mandou mensagem, dizendo que todo dia antes das aulas, ela lê um poema meu para os alunos. Sou de Brasília, criada aqui, e é muito legal ver a poesia de Brasília alcançando tantos lugares. Também gosto muito das que falam sobre coragem. A coragem de colocar um trabalho na rua, viver de arte, escrever, cantar, de uma forma geral.
Como é o seu processo de criação e interação com o público?
Os dois estão muito juntos. Eu já tinha publicado dois livros antes de começar a colocar nas redes. O alcance e o engajamento cresceram e eu vi que fui ganhando novas formas. Isso me fez conhecer melhor o meu leitor e hoje eu consigo saber quais são os assuntos que as pessoas mais querem ler. Nos momentos de maior isolamento, eu falava mais sobre resiliência, paciência. Era o que estávamos precisando. Hoje sinto que estamos em outro momento e trago novas reflexões.
Acredita que as redes sociais impactam na criação poética e no consumo de poesia pelas gerações mais jovens?
Percebi que o interesse na poesia cresceu muito durante a pandemia e o isolamento. Acredito que estamos em um momento de transição. Quando as pessoas, principalmente as mulheres, começaram a jogar poesia na internet, ainda tinha muito preconceito. As pessoas diziam que não era poesia de verdade, mas vimos isso mudar. Existem escritores gigantes e incríveis que nasceram na internet. Sinto que esse preconceito contra a poesia nas redes tem desaparecido. Além disso, esse movimento permite uma democratização. Talvez a gente não conseguisse chegar a tantas pessoas em tantos lugares e as redes permitem isso, o que beneficia quem escreve e quem lê.
Enxerga uma relação especial das mulheres com a poesia e com as palavras? Acredita que podem ser, de certa forma, um caminho para a libertação?
Eu acho que isso é muito real. A sensação que tenho é de que quando escrevo um texto que chega ao coração das pessoas, elas se sentem menos sozinhas. Adoro falar com mulheres, para mulheres, sobre mulheres. Elas são cerca de 85% do meu público e eu vejo que vamos nos ajudando. Esse apoio fortalece o coletivo e, quando a mulher entende o seu poder, ela fica mais atenta e mais forte para lutar contra as violências que sofremos todos os dias.
Como a poesia e a arte, de forma geral, podem ser aliadas no combate da violência contra a mulher?
Uma coisa que vemos e falamos muito sobre é a síndrome da impostora. Temos muito essa coisa de duvidar de que somos boas o suficiente, que as pessoas vão nos olhar e descobrir que somos fraudes. Mas a arte nos ajuda a descobrir que não somos. A arte empodera. Quando você escreve e mostra, você chega nas pessoas, acredita na sua voz, no seu ofício. E quando mais a mulher sabe qual é o lugar dela — onde ela quiser —, mais ela vai entender que é longe de qualquer violência a ela imposta. A arte liberta quando você produz, mas também quando você consome. Durante esses últimos dois anos, a arte foi fundamental. E eu aproveito para incentivar que as pessoas valorizem os artistas, a cena brasileira e brasiliense. Que busquem conhecer e apoiar as mulheres que produzem arte na sua região e perto de você.
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