Especial

Tendência casamenteira: todo dia é dia de se casar e todo mês é o das noivas

Com a demanda reprimida por causa dos dois anos de pandemia, o mercado de casamentos nunca esteve tão aquecido. Só no primeiro semestre de 2022, houve aumento de 103,6% no número de cerimônias, quando comparado ao período anterior

Por Mariana Saraiva*
postado em 28/08/2022 09:00
 (crédito:  Arquivo Pessoal)
(crédito: Arquivo Pessoal)

Para muitos casais, foram mais de dois anos de espera. A pandemia da covid-19 adiou o sonho de vários apaixonados de subir ao altar para selar o amor diante de parentes e amigos. Sem segurança para festejar, casamentos ficaram em suspenso, datas tiveram de ser remarcadas e muitos prejuízos passaram a ser computados. Em 2022, com o avanço da vacinação, a redução de mortes pelo coronavírus e a queda do número de contaminações, os matrimônios voltaram a ser realizados a todo vapor. É chegado o momento também de cumprir contratos rompidos durante a crise sanitária.

"Analisamos a data escolhida por mais de 300 mil casais que se inscreveram na plataforma Casamentos.com.br para organizar a celebração, e nos surpreendeu o fato de que, este ano, não haverá um dia no Brasil sem que aconteça a realização de pelo menos um casamento", afirma Juliana Gallo, vice-presidente de Vendas do Casamentos.com, plataforma de marketplace para a organização de matrimônios.

E o imaginário popular de que maio é o mês da noiva caiu por terra. Agora, todo dia é dia de casar. O mais difícil tem sido encontrar uma data disponível para dizer o tão esperado sim. "A estimativa é de que mais de 80% dos casamentos que iriam acontecer em 2020 precisaram ser adiados. Em Julho de 2021, sentimos a retomada dos eventos e o volume de casamentos acumulados se estendeu ao longo de todo o primeiro semestre de 2022. Com esses números, temos um aumento de 17,5% na quantidade de eventos de um ano para o outro. Além disso, se compararmos o primeiro semestre de 2021 com o mesmo período de 2022, esse crescimento chega a 103,6%", compara Diego Magnani, CCO do iCasei, plataforma de sites dos noivos e listas de presentes.

De acordo com a plataforma Casamentos.com, em 2022, os dias mais concorridos para a celebração são 12 de novembro, 10 de setembro e 15 de janeiro, sendo sábados, seguidos por domingos e sextas-feiras, os dias preferidos dos noivos. "Esperamos que aconteçam, aproximadamente, um milhão de casamentos este ano no Brasil. Até agosto, já foram registrados quase 500 mil, e a temporada de enlaces no país ainda nem começou", conta Juliana Gallo.

Adiamento e insegurança

Planejar um casamento não é uma tarefa fácil: leva tempo, gera expectativas e muitos casais se estressam com as adversidades que envolvem o grande dia. Mas tudo se complica ainda mais quando se sente que não se tem o controle da situação. O matrimônio é um dos dias mais importantes da vida de uma casal, e a pandemia forçou várias celebrações a serem adiadas ou até mesmo canceladas, deixando os noivos inseguros e de mão atadas sobre seu evento dos sonhos.

A cerimonialista Simone Couto conta que o período de pandemia foi desafiador "Precisávamos ser fortes para cumprir todos os sonhos que haviam sido confiados em nossas mãos. Foi bem complicado porque trabalhamos com expectativas. Remarcar um casamento não é fácil, encontrar uma nova data compatível para todos os fornecedores do casal é uma tarefa difícil", conclui a cerimonialista.

Suellen e Paulo Henrique iam se casar no início da pandemia, mas a cerimônia só aconteceu meses depois e com restrições
Suellen e Paulo Henrique iam se casar no início da pandemia, mas a cerimônia só aconteceu meses depois e com restrições (foto: Arquivo Pessoal)

Foi o que aconteceu com Suellen Sousa, 25 anos, e Paulo Henrique Vieira, 30. Estava tudo certo para o casal subir ao altar em abril de 2020. Mas a pandemia mudou os planos da secretária executiva e do técnico em secretariado. O número de casos da doença e de mortes se multiplicava a cada dia e a crise sanitária ganhava proporções inimagináveis. "No início, quando tudo começou, a gente pensou que daria para acontecer o evento, sem precisar alterar a data, mas conforme o dia ia chegando, a gente viu que realmente as restrições estavam muito grandes", conta Suellen.

Eles tiveram, então, que adiar o dia do casório para novembro de 2020. Mesmo com a mudança, porém, não tinham certeza de nada, nem se o casamento, de fato, aconteceria. Com a nova data marcada, os contratos precisaram ser adequados, o que resultou em prejuízo financeiro, já que o orçamento previsto para a celebração precisou ser totalmente revisto. "O bufê, por exemplo, cobrou uma taxa extra para garantir a segurança da equipe. Tivemos que pagar até o álcool em gel disponibilizado para os convidados", lembra Paulo Henrique.

O casamento aconteceu, mas com mesas bastante afastadas e vários parentes ausentes por medo do contágio. "O principal impacto, com certeza, foi o emocional. Além de ter sido adiado, muitos parentes e familiares não compareceram por medo; na época, ainda não tinha vacina", relata Suellen. "A gente se questionou muito, se era realmente o momento, e se a gente não estaria colocando as pessoas em risco. Mas, no fim, tudo deu certo", comemora.

A nutricionista Bárbara Ricken, 28 anos, e o advogado Renato Abreu, 30, também passaram por muita tensão até trocarem as alianças, em outubro do ano passado. Durante o namoro, em 2019, ainda antes do início da pandemia, planejaram uma viagem. Bárbara sentiu que o pedido de casamento viria durante o passeio e decidiu se adiantar, para garantir a data do evento no local que sempre sonhou em se casar, em Natal, no Rio Grande do Norte. E, assim, agendou a cerimônia antes mesmo do pedido.

Bárbara Ricken e Renato Abreu guardam as recordações do grande dia em que subiram ao altar
Bárbara Ricken e Renato Abreu guardam as recordações do grande dia em que subiram ao altar (foto: Ed Alves/CB)

"Minha mãe foi para Natal e eu pedi para ela já fechar o salão de festa e o contrato, para garantir a data." Em janeiro de 2020, o casal fez um jantar de noivado e anunciou aos convidados que o casamento seria em outubro de 2021. Logo em seguida a pandemia começou, e eles não imaginavam que duraria tanto tempo. Mesmo durante o pico da crise sanitária, Bárbara seguiu fechando os contratos e os fornecedores. "Todo mundo me chamando de louca, falavam que eu nem sabia como estaria a pandemia na data do casamento e, mesmo assim, seguia pagando tudo. Eu acreditava que nada daria errado, tinha certeza de que me casaria no dia em que idealizei. Enquanto isso, os casamentos das minhas amigas iam sendo adiados ou cancelados."

Quando chegou em 2021, Bárbara já havia fechado todos os contratos. "Todas as pessoas que não se casaram em 2020, estavam se casando em 2021, e se eu não tivesse reservado minha data, eu teria perdido, então, graças a Deus, eu ouvi a minha intuição", conta Ricken. Quando chegou em outubro, o mês do casamento, as medidas de prevenção à covid-19 começaram a ser relaxadas, e Bárbara, seguindo todos os protocolos de segurança — ela chegou a criar um vacinômetro para que os convidados se sentissem seguros —, conseguiu se casar, assim como acreditou que aconteceria. Hoje, o casal espera a chegada do herdeiro.

 2022. Crédito: Arquivo Pessoal. Revista. Casamentos. O casal Bárbara e Roberto.
2022. Crédito: Arquivo Pessoal. Revista. Casamentos. O casal Bárbara e Roberto. (foto: Arquivo Pessoal)

O peso no bolso

Os fornecedores foram os primeiros a sentirem os impactos da crise sanitária, precisando flexibilizar contratos. O faturamento foi comprometido de imediato, muitos achavam que a pandemia seria rápida e, nesse período, foram obrigados a fechar as portas. Para o economista César Bergo, o setor de eventos foi afetado de forma decisiva. "O que se viu foram pequenas empresas de casamento fechando suas portas sem condições de seguirem adiante com contratos."

A proprietária da empresa D-reis Decorações, Nathalia Mota, conta como foi atravessar e se manter durante a pandemia, nos anos de 2020 e 2021. "A dificuldade financeira não foi só para a empresa, mas também para os colaboradores. Nós tínhamos uma grande equipe de pessoas, na parte de montagem e decoração, e tivemos que dispensar o pessoal."

A decoradora conta que precisaram buscar novas formas de renda. "Passamos a alugar mobiliários, coisas que não fazíamos antes", relembra. Com o baixo faturamento mensal, a empresa teve de fechar o escritório e remanejar o valor que pagava no aluguel do espaço. Mota conta que alguns casais continuaram a pagar seus casamentos, mesmo com a crise. Graças a isso a empresa conseguiu se manter. Agora, com o cenário favorável, Nathalia conta que já há meses em 2023 em que todos os finais de semanas estão reservados.

O presidente da Associação Brasileira de Eventos (Abrafesta), Ricardo Dias, fala que o maior desafio vivido no atual momento é se adaptar ao aumento de custos que se tem observado nos últimos meses, com a alta da inflação. Isso tem dificultado fornecedores a manterem o preço de contratos fechados antes da pandemia. "Fica uma situação muito complicada para o fornecedor negociar com os noivos, porque a empresa precisou usar o faturamento para se manter e, agora, vai ter que tirar do próprio bolso para cumprir os contratos ", explica Ricardo Dias.

Refazendo orçamentos

Os preparativos para o casamento de Júlia e Rafael estão a todo vapor: orçamento dobrado
Os preparativos para o casamento de Júlia e Rafael estão a todo vapor: orçamento dobrado (foto: Arquivo Pessoal)

A publicitária e fotógrafa Júlia Campos Altoé, 24 anos, e o contador e estudante de direito Rafael Peres Nunes, 28, têm sentido no bolso as movimentações do mercado. Eles ficaram noivos em 19 de março de 2021 e marcaram a data da celebração para 15 de julho do próximo ano.

"Sentimos a diferença no valor. Tudo está muito caro, porque parece que todo mundo esperou o auge do período pandêmico passar e vai se casar agora. Do dia em que a gente começou a olhar valores para agora, as coisas encareceram demais", constata Júlia. Ela conta que a meta inicial era gastar R$ 15 mil com a cerimônia, programada para 250 convidados. "Já dobramos esse valor e ainda não fechamos todos os fornecedores", lamenta.

A servidora pública Amanda Godoi, 26 anos, e o analista de sistemas Moisés Abreu, 30, também precisaram rever orçamentos. Em setembro de 2021, eles resolveram que se casariam em 2022, quando a crise sanitária estaria mais controlada. A decisão afetou diretamente o casal, tanto pela data quanto pelo alto valor das despesas da cerimônia e da festa. "Percebi que, com o aumento da procura por festa de casamento, tudo aumentou consideravelmente", constata a servidora.

Amanda lembra que muitos espaços não tinham mais sábados disponíveis em 2022. "Inclusive, eu me casei em junho porque não consegui data para o mês que queria, que era setembro", recorda. Para ela, a indústria de casamento ganhou mais força depois da pandemia.

Primeiro, porque tudo o que se relaciona com a cerimônia, como alimentação, bebida, itens de decoração, tecido para fabricar roupas, etc., teve o preço reajustado, o que resulta em aumento no aluguel e no fechamento de contrato com o bufê. "Segundo, porque tem relação com um evento único na vida de qualquer pessoa, então pode subir o preço, mas quem tem o sonho de se casar não vai deixar de fazer uma festa, por mais simples que seja."

Ao adiar a cerimônia  para 2022, Amanda  e Moisés tiveram os custos aumentados
Ao adiar a cerimônia para 2022, Amanda e Moisés tiveram os custos aumentados (foto: Rafaela Camelo/Divulgação)

Duas vezes remarcado

A graduanda de direito Catherine Louise, 25 anos, e o professor Giovanni Oliveira, 30, ficaram noivos em dezembro de 2019 e logo marcaram a data do enlace: 16 de janeiro de 2021. Quando ia se aproximando o tão esperado dia, a pandemia passava por um de seus maiores picos de contágio. Catherine viu duas amigas remarcarem seus casamentos e temia que o mesmo acontecesse com o dela.

Depois de pensar muito, decidiu dar uma pausa nos preparativos até agosto de 2021, e ver se o cenário estaria melhor, mas não foi isso que aconteceu. Quando chegou o mês de agosto, a situação estava ainda pior, e o casal precisou adiar, novamente, a cerimônia. "Foi uma decisão difícil. Eu, como noiva, fiquei extremamente chateada, já tinha fechado um monte de fornecedores", conta Catherine.

Não foi fácil para eles lidar com a frustração. "Quando chegou em janeiro, no dia que era pra ser nosso casamento, foi muito triste pensar que naquele dia eu deveria estar me casando, mas não aconteceu." Na terceira tentativa, em 19 de maio de 2022, finalmente o sonho de Catherine e Giovanni se realizou.

 

*Estagiária sob a supervisão de Sibele Negromonte

 

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  • Bárbara Ricken e Renato Abreu guardam as recordações do grande dia em que subiram ao altar
    Bárbara Ricken e Renato Abreu guardam as recordações do grande dia em que subiram ao altar Foto: Ed Alves/CB
  • Suellen e Paulo Henrique iam se casar no início da pandemia, mas a cerimônia só aconteceu meses depois e com restrições
    Suellen e Paulo Henrique iam se casar no início da pandemia, mas a cerimônia só aconteceu meses depois e com restrições Foto: Arquivo Pessoal
  •  2022. Crédito: Arquivo Pessoal. Revista. Casamentos. O casal Bárbara e Roberto.
    2022. Crédito: Arquivo Pessoal. Revista. Casamentos. O casal Bárbara e Roberto. Foto: Arquivo Pessoal
  • Os preparativos para o casamento de Júlia e Rafael estão a todo vapor: orçamento dobrado
    Os preparativos para o casamento de Júlia e Rafael estão a todo vapor: orçamento dobrado Foto: Arquivo Pessoal
  • Ao adiar a cerimônia 
para 2022, Amanda 
e Moisés tiveram os custos aumentados
    Ao adiar a cerimônia para 2022, Amanda e Moisés tiveram os custos aumentados Foto: Rafaela Camelo/Divulgação
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