Com diagnóstico de diabetes tipo 1 aos 21 anos, Emerson Bisan não imaginava que poderia ser atleta. Na época, a dúvida se sequer poderia finalizar a graduação em educação física pairou sobre sua mente. Para seu alívio, o médico que o acompanhava informou que poderia, sim, continuar com os treinos e os estudos, e que era, inclusive, o recomendado. O principal exemplo dado pelo médico foi Gary Hall Jr, nadador olímpico e ganhador de cinco medalhas de ouro que tem diabetes tipo 1, assim como Emerson.
Em uma atitude de "enfrentamento" do diagnóstico, segundo suas próprias palavras, buscou se informar e receber o tratamento adequado. Com isso, foi mostrando a todos — inclusive a si mesmo — que a descoberta da doença não era uma sentença de vida limitada, sem saúde e sem objetivos, e que poderia correr atrás de seus sonhos, literalmente. Um ano após o diagnóstico, correu a primeira maratona da vida. "Foi uma experiência emocionante e libertadora, fez com que me sentisse capaz", relembra Emerson.
Após a primeira experiência com a corrida, não parou mais, o que o levou a, após a trigésima maratona, decidir aumentar a quilometragem. Com treinos e preparação física, migrou para a categoria de ultramaratonas, que se caracterizam por ultrapassar os 42km tradicionais de prova. Logo na primeira participação, Emerson percorreu 137km e venceu a categoria. Para ele, foi gratificante superar seus limites e poder inspirar pessoas que convivem com a mesma doença, que demanda atenção e acompanhamento frequente.
Durante as provas, utiliza a tecnologia e os avanços das últimas décadas a seu favor: monitora o nível de glicemia por meio de um adesivo com escaneamento no braço, que gera resultados em segundos e otimiza seu tempo. Além disso, mantém uma alimentação equilibrada, aplicações de insulina nos horários adequados, realiza os exames de rotina e segue à risca a orientação médica.
Somado a uma série de realizações pessoais, começou a mentorar e a direcionar treinos de outras pessoas, tanto para corridas quanto para atividades físicas com outros objetivos, como ter a saúde em dia. Emerson é graduado em educação física e se especializou em educação em diabetes para entender ainda mais as especialidades do grupo. No entanto, foi somente no ano de 2019 que ganhou o maior prêmio de sua vida: foi eleito o melhor atleta com diabetes pela Sociedade Brasileira de Diabetes (SBD), coroando anos de trabalho e dedicação.
Com o espaço, o atleta pôde levar a mensagem de que é possível não só conviver bem com a doença, como também ser um modelo de saúde e foco. Hoje, aos 48 anos, acumula passagens por todos os estados brasileiros e diversos países. Correu por toda a extensão da Muralha da China; pelas montanhas da Patagônia; na África do Sul; dos mangues do Chile até a Argentina; na maratona de Nova York por quatro vezes e chegou a participar da Corrida na Disney, onde aproveitou para passear com as filhas.
Com tantas memórias e experiências, lançará um livro em novembro deste ano. "São histórias para repensar como lidar com as dificuldades e vai além da diabetes", explica Emerson. Após o marco de participação em 100 maratonas, que aconteceu no último domingo, o ultramaratonista visa espalhar ainda mais a mensagem de perseverança e de que é possível conquistar seus sonhos, independentemente de quais sejam eles. Além disso, afirma que em setembro conquistará outro sonho: participará da corrida de 250km de Atacama, o deserto mais alto e árido do mundo.
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Imparável
A síndrome de Wolff-Parkinson-White é uma doença cardíaca que faz com que os batimentos do coração do paciente sejam mais acelerados do que o normal. Dentre vários sintomas, pode levar a dificuldade de realizar exercícios físicos. Mas não foi esse fato que parou a advogada Ana Maria Valls, que hoje pratica jiu jitsu de segunda a sexta e já chegou a participar de competições do esporte.
Ana descobriu ter a doença quando realizou exames pré-operatórios de uma cirurgia plástica. “Meu cirurgião plástico anteriormente era cardiologista e viu no exame algo que não gostou e mandou repetir. No fim, descobrimos que era essa síndrome”, relata. Depois da devida avaliação, foi necessário realizar a cirurgia de ablação para tratar o caso específico da bacharel em direito.
Após a cirurgia, o corpo precisou de uma adaptação e repouso, mas com o tempo, Ana pôde retornar e seguir praticando o esporte pelo qual é apaixonada. Sobre as competições, Ana conta que sente uma infinidade de emoções e adrenalina e, por isso, pretende seguir fazendo parte das que se encaixarem em sua rotina. Com muita saúde e devido acompanhamento profissional e hoje aos 37 anos, conta que a doença não a limita: “Meu maior sonho é ser faixa preta de jiu jitsu”.
Psicóloga clínica e da saúde, Renata Panico Gorayeb é especialista em desenvolvimento humano e enfrentamento de doenças crônicas. Ela explica que a atividade física é recomendada no consultório médico e psicológico para a maioria desses pacientes. Uma das justificativas é a produção de hormônios como endorfina e serotonina, responsáveis pelo bem-estar, vitalidade e satisfação — aquela sensação de missão cumprida, sabe?
O que diferencia quem, apesar das limitações, persiste nos cuidados com a saúde? “Embora possa ter dificuldade de se expor e pensa que não é pra ele, é como se o paciente criasse uma uma nova versão de si com a realidade que ele tem”, explica.
Segundo Renata, o primeiro passo para iniciar em uma prática é procurar um médico para avaliar o que é mais adequado em cada caso. O que funciona e o que pode piorar alguma limitação pré-existente. “Alguns neuropatas não devem levar a musculatura à fadiga. O ideal é que façam um trabalho constante, mas suave”, exemplifica. O paciente também precisa conhecer muito bem a própria condição para garantir cuidados pré e pós treino, como os que vimos Emerson tomar.
O exercício é tão importante que grandes centros de reabilitação em cardiopatia costumam oferecer atividade física porque o coração dos pacientes precisa funcionar no ritmo adequado à vida saudável e isso só é possível com algum esforço do corpo. Em termos de cuidado com a mente, Renata lista o treino de novas e necessárias habilidades, autoconhecimento, autonomia e amadurecimento como ganhos tanto do esporte como do acompanhamento psicológico voltado para a saúde.
Vitória em vários sentidos
Mulheres que lutaram contra uma doença muitas vezes devastadora encaram novos horizontes nas águas do Lago Paranoá. À bordo de um dragon boat (bote dragão, na tradução), sobreviventes do câncer de mama praticam canoagem havaiana como forma de se reabilitar fisicamente, se aceitar, driblar traumas, serem acolhidas e servirem de abraço para outras.
O grupo Canomama (@canomama_time) foi iniciado por Larissa Lima, 49, depois que ela mesma teve a doença. Hoje, 46 mulheres integram o projeto. Em cada bote, vão 22: 20 remam, uma usa um tambor para dar o ritmo das remadas e uma conduz o leme. Ou seja, mesmo quem não deseja remar pode participar de um outro jeito.
No fim de julho, o Canomama venceu o 3º Festival Dragon Boat do Nordeste, que reúne sobreviventes do câncer de mama de todas as regiões do país. Larissa lembra que, mais que a competição, eventos do tipo trazem divulgação para o esporte e para a realidade da doença.
Os benefícios são muitos. “É como um alimento para a alma. Vemos que a maioria dessas mulheres eram sedentárias e acabaram se apaixonando pelo remo. Depois, passaram a se dedicar a outras modalidades esportivas. Começam a se cuidar, saem da obesidade, melhoram o humor, ficam em contato com a natureza e tudo isso é uma maneira de cuidar da saúde e prevenir complicações”, relata.
Larissa é exemplo do que defende. O Canomama surgiu como protocolo de reabilitação para ela mesma, quando estava tratando o câncer. Com o apoio do técnico fisioterápico, decidiu reunir outras pessoas para testar o protocolo. O remo funciona para prevenir o linfedema — quando há acúmulo de linfa no membro ao lado da mama que foi acometida —, uma consequência natural da mastectomia.
*Estagiária sob supervisão de Sibele Negromonte
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