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Em conexão com a ancestralidade

Ator Bukassa Kabengele completa 25 anos de carreira em duas séries e comemorando a ligação entre o Congo e o Brasil

por Vinicius Nader
postado em 07/08/2022 00:01
Como Nelson Mandela em Falas negras, Bukassa esteve em conexão direta com a África -  (crédito: Victor Pollak / TV Globo)
Como Nelson Mandela em Falas negras, Bukassa esteve em conexão direta com a África - (crédito: Victor Pollak / TV Globo)

Bukassa Kabengele é daqueles atores que enchem a tela. O talento desse congolês que está desde criança no Brasil é imensurável. Comemorando 25 anos de carreira, ele pode ser considerado um especialista em levar a realidade para a tela. Na segunda temporada de El president (Amazon Prime Video), ele viverá o jogador de futebol africano Tessema; em O jogo que mudou a história (Globoplay), mostrará o início do narcotráfico no Rio de Janeiro.

E talvez tenha sido com a tocante interpretação de Nelson Mandela na primeira temporada do especial Falas negras (Globo) que Bukassa Kabengele tenha aparecido para o grande público. 'Minha africanidade e memórias da minha juventude como criança no Congo fazem parte da minha força e assinatura artística. É dessa relação que conecto minha ancestralidade. Estabeleço meus mistérios e olhares", afirma o ator, em entrevista ao Correio.

Bate-papo em que Bukassa fala sobre a carreira, a luta pela inclusão racial na televisão, o fato de nunca ter feito novelas e muito mais. Os principais trechos você lê a seguir!

Entrevista // Bukassa Kabengele

Você está completando 25 anos de
carreira. Que balanço faz desse período?

Estou feliz com a minha caminhada. Sinto estar num momento diferenciado e possuo, agora, respeito e maior diálogo com equipe, produções e por parte de diretores. Está mais saboroso, pois minha compreensão de textos e personagens aumentou. Tenho melhores papéis e personagens, além da maturidade. Isso ajuda bastante.

Que conselho daria para um ator que está começando a carreira agora?

Sonhe, mas trabalhe as bases bastante em termos de estudos para que esteja pronto na hora em que as chances aparecerem. Seja ousado, pense fora da caixa. Faça seu melhor com o que tiver à sua mão. Os trabalhos virão, faça contatos... Mostre a cara e esteja alerta. Confie na sua voz interna, mas entenda o seu entorno.

Você veio do Congo para o Brasil ainda criança. O que da África ainda está em você e aparece na sua arte?

Minha africanidade e memórias da minha juventude como criança no Congo fazem parte da minha força e assinatura artística. É dessa relação que conecto minha ancestralidade. Estabeleço meus mistérios e olhares.

Na segunda temporada da série
El President (Amazon Prime), você dá vida ao jogador de futebol africano Tessema. O que você sabia dele
antes de gravar?

Não sabia nada. Essa é a beleza de nossa profissão. Às vezes, entramos em universos desconhecidos, lemos, estudamos, vemos vídeos e abrimos nossas mentes. Ampliamos nossos saberes mergulhando e aprendendo com a vida que os personagens, e suas histórias, nos oferecem. Por isso a arte é tão importante: por ela ampliamos nossa capacidade de sentir e compartilhar a vida de forma mágica.

Como foi, para você, viver um ídolo africano na ficção?

É sempre uma honra... Tive uma recepção muito positiva de africanos na figuração, o que me deu ainda mais orgulho. Entendo a importância da representatividade. Isso mexe com a autoestima, e o fato de ser um africano me conecta e traz novas camadas à negritude e a minhas lutas anti-racistas pelas minhas posturas e vigílias no trabalho.

Você chamou bastante a atenção do público da televisão vivendo Mandela no especial Falas negras. Como foi essa experiência?

Posso dizer que tive a honra e o privilégio de ter interpretado Nelson Mandela em um belíssimo e importante projeto a convite de uma das pessoas que mais admiro e respeito, que é Lázaro Ramos. Foi bastante desafiador, fiz um dos textos mais extensos no programa. Um impactante trecho do discurso de Mandela em 1964, antes da prisão. Meu desafio foi sair da imitação e trazer humanização na fala... Na minha estrutura de decupar o longo texto, a cada parágrafo imaginei Mandela em um momento específico da vida, desde a infância até a saída dele da cadeia antes de se tornar presidente. Eu me permiti fazer essa viagem, e procurei viver e trazer para os dias de hoje essa fala que ainda nos afeta. O texto era inteiro original e não acrescentamos nada. Tive que achar meu Bukassa em Mandela.

O especial foi um sucesso de crítica e de público e trouxe de maneira muito poética a questão urgente do racismo. Por que a televisão brasileira tem tão poucos programas como esse?

Vivemos uma estrutura social racista. Não estamos representados nas narrativas, nos profissionais e lugares de poder nos setores criativos e bem como produções, direção e roteiros nos mercados do audiovisual. A televisão brasileira, por anos, vem reproduzindo modelos e formatos de conteúdos que colocam a negritude à margem e estabelecem olhares do lugar que esperam que o negro esteja. Sempre abaixo da soberania branca. Isso para resumir um tema complexo e bastante polêmico. A melhora é pequena e gradual e não corresponde à parcela de 56% da população negra no Brasil. A desigualdade impera, e a reparação é urgente.

Seus trabalhos na
televisão/
streaming são em séries. Sente vontade de fazer uma novela?

Tive alguns convites nesses dois anos de pandemia. As agendas não bateram e sinto que na hora certa, com mais engajamento e respeito do público, acabarei fazendo algo bacana. Mas a quantidade de projetos que realizei me dá maior liberdade e me permite maior diversidade de temas e para diferentes públicos. Em tempo de fazer uma novela, cheguei a realizar quatro distintos projetos, por exemplo. Para pegar uma novela, tem que valer muito a pena.

Leia mais da entrevista com Bukassa Kabengele em https://blogs.correiobraziliense.com.br/proximocapitulo/

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  • Ator Bukassa Kabengele
    Ator Bukassa Kabengele Foto: Mauro Motta/ Divulgação
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    Ator Bukassa Kabengele Foto: Mauro Motta/ Divulgação

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