A capoeira é expressão cultural que mescla dança, esporte e arte marcial. Possui um valor histórico inestimável e milhões de praticantes no país, mas ainda tem presença majoritariamente masculina. Apesar disso, mulheres vêm ocupando cada vez mais espaço na prática, incluindo como mestres, figura que exerce função importante no ensino e tradição da capoeira.
Carla Baía, capoeirista, formada em dança e pós-graduada em história e cultura afro-brasileira explica que o esporte é "um dos maiores símbolos de representação da importância dos negros africanos para a construção da cultura brasileira". Fato que levou a Organização das Nações Unidas (ONU), em 2008, a classificar a capoeira como Patrimônio Cultural Brasileiro.
Muito difundida em escolas e diversos espaços, pode chegar a ser ferramenta de transformação social. Carla começou a treinar no ensino médio, por meio de um projeto social que oferecia atividades físicas aos alunos no horário contrário às aulas. O que começou com uma atividade extra se tornou uma paixão, e a capoeirista passou a treinar todos os dias, inclusive em locais além da escola.
Com a mãe costureira, ganhou o primeiro abadá — calça utilizada na prática — e passou a se desenvolver, mesmo em turmas majoritariamente masculinas. "A capoeira se tornou uma das coisas mais importantes na minha vida", afirma. Como exemplos de benefícios diretos da atividade, cita a constância de exercícios, o bem-estar, a força, o equilíbrio e a consciência corporal.
Por não estar à parte da sociedade, Carla relata que o machismo perpassa esse meio também. "São inevitáveis certas atitudes e enfrentamentos, porque o que acontece fora das rodas reflete dentro e vice-versa. Então, se ser mulher de forma geral não é fácil, na capoeira também existem suas dificuldades." Há 12 anos na capoeira, já teve seu trabalho e mérito questionados em diversas ocasiões. "Não basta apenas ser boa em algo, eu tenho que todos os dias estar provando que eu mereço estar naquele lugar", afirma.
Apesar de ser uma realidade, com o passar dos anos, a situação vem melhorando, principalmente pelo fortalecimento das mulheres presentes nesses meios e suas redes de apoio. Cláudia Anhuma, orientadora socioeducativa, está no meio da capoeira há 22 anos e, tendo sido alguém inspirada por mulheres, visa apoiar e incentivar outras, principalmente por meio da música.
"Vejo como uma arte da transformação, pois a capoeira possibilita se enxergar. Hoje, eu me enxergo como mulher preta porque a capoeira me fortaleceu para isso", completa Cláudia. Com o aumento de líderes e professoras do sexo feminino, diversas barreiras têm sido quebradas, que a capoeirista encara como vitórias coletivas.
Trocas e apoio mútuo
Marcando os avanços, "Mestra Michelinha", como Michelle Lima é conhecida no meio, criou o Encontro de Bambas, em 2014. O nome "bamba" significa alguém que é muito bom em um assunto e foi escolhido justamente para honrar as profissionais convidadas. O encontro reúne capoeiristas para trocar vivências, histórias e, claro, praticar capoeira e tocar instrumentos como o berimbau.
"É um encontro de mulheres que encanta a todos. Acredito que só temos a ganhar unindo forças e talentos", afirma Michelle, que reforça que o grande objetivo é realizar esse intercâmbio de práticas e ideias entre mulheres, que sempre ocorreu do lado masculino.
A próxima edição tem confirmadas convidadas de todas as partes do país, ocorrerá entre 8 e 10 de julho e contará com palestras, workshops variados, como de percussão, samba de roda e expressão corporal, e as clássicas rodas de capoeira.
*Estagiária sob a supervisão de Sibele Negromonte
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