Na moda, na gastronomia, na música, nas telas, nas leituras… A cultura coreana está em todo lugar e tem conquistado, nos últimos anos, inúmeros adeptos pelo mundo. Muito dessa popularidade se deve à influência do k-pop e dos k-dramas, séries de TV produzidas no país e veiculadas em serviços de streaming. As redes sociais, em especial o Tik Tok, não ficam para trás e trazem consigo tutoriais de coreografias, maquiagens e composição de looks.
A espetacularização do gênero musical é intrínseca ao olhar mais voltado para a moda coreana. Mas nem sempre foi assim. Nos anos 1990, a estética não chamou tanto a atenção, porém, ao perceberem que os artistas poderiam ter espaço como ídolos, as empresas começaram um investimento significativo no segmento, segundo Caroline Lardoza, historiadora da moda, social media especialista em varejo e produtora de conteúdo no perfil @carollardoza.
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"Há um interesse comercial capitalista dessas grandes empresas ocidentais em aderir à moda sul coreana, pois percebem o poder na venda das peças, a inspiração que são para outros criadores e a conexão com seu público, que gera muitas demandas com alta procura para o mercado da moda", explica. Marcas de alta costura, inclusive, já perceberam a potência do estilo e fazem parcerias de modo a trazer essas referências para suas coleções e atrair um novo público.
Para a designer Débora Cross, por exemplo, essa conexão com a Coreia se intensificou em um intercâmbio, no qual passou um ano no país asiático. A adaptação foi rápida e o encantamento com as descobertas, frequente, como com a equilibrada combinação do antigo e do moderno — na arquitetura, com edifícios e muralhas; na culinária, com pratos típicos e refeições importadas de outros países; e, claro, na moda, em que estilistas criam looks artísticos usando versões modernizadas do hanbok, tradicional roupa coreana.
Entre as particularidades do k-style, a jovem cita as composições mais básicas, com cortes de alfaiataria e sobreposições com blazers, jaquetas, coletes ou suéteres. Preto, cinza e marrom são cores presentes em todas as estações. E, por falar nessas temporadas, vale mencionar a primavera, na qual é comum a prevalência de roupas com tons pastéis, estampas floridas e peças com babados e laços.
"Pessoas mais jovens, entretanto, podem apresentar um estilo em que é possível observar a maior influência da música e da dança, em especial do hip hop. A cor preta prevalece, as calças são mais largas e as correntes, acessórios constantes", detalha. Débora lembra, ainda, que as tendências costumam se espalhar com rapidez, mas traz a ressalva de que o estilo pode se mostrar de diferentes maneiras a depender do bairro. Por exemplo, Gangnam, localidade com muitos prédios empresariais, exibe looks mais discretos; na contramão de Hongdae, que abriga estudantes e artistas, onde é possível ver peças mais ousadas, inspiradas em artistas de k-pop.
Conhecer mais a cultura coreana e consumir desse gênero musical influenciou diretamente o estilo pessoal da designer. Hoje, ela se sente mais confortável para arriscar em suas produções e aprendeu a aproveitar melhor as peças básicas, estilizando-as. Calças de alfaiataria, blazer e coletes não faltam no seu closet, já que são coringas, tanto na hora de compor um look formal quanto um casual. O desejo é incorporar, gradualmente, saias e vestidos longos, além de itens inspirados nas vestimentas de palco de artistas de k-pop, relacionados à estética "teachwear" — calças cargo, colete utilitário, coturno, "harness" e correntes.
As inspirações ficam por conta dos looks de k-dramas e das roupas que artistas e celebridades coreanas utilizam no cotidiano, como das cantoras Hyuna, Hwasa e Joy. O Seoul Fashion Week e a marca Stylenanda também têm peso na hora das escolhas. "Quando encontro alguma peça que gosto em clipes, analiso quais elementos foram usados e estilizados e tento reproduzir com o que já tenho no meu guarda-roupa. Posso, por exemplo, transformar um blazer em cropped", conta. Sua segunda opção está em brechós ou na costura das composições mais desejadas.
No seu guarda-roupa
Quer se inspirar no estilo e não sabe por onde começar? Confira as dicas de Caroline Lardoza:
- Valorize a sobreposição das cores e os elementos gráficos, que dialogam com a estética mais divertida e fora de padrões de gênero;
- Opte por peças do streetwear;
- Considere usar saias plissadas, estampas xadrez, cores neon, coletes de tricô e camisetas com mensagens relacionadas à cultura coreana;
- Vestidos com corte e mais fluidos abaixo da cintura podem ser uma escolha para quem deseja delicadeza, mas não quer perder a liberdade dos movimentos;
- Dê preferências a acessórios criativos, como chapéus floridos, buckets hats, bolsas coloridas e meias longas;
- Moletons, camisas oversized, minissaias, botas e tons pastéis estão em alta e podem ser uma alternativa.
Elegante-minimalista ou streetwear-tendência: qual o seu estilo?
A publicitária e criadora de conteúdo Luíza Akemi concorda com a estilista Débora Cross quando o assunto é diferentes formas de se inspirar no k-style. Tal constatação se deu durante seu intercâmbio ao país, no qual passou a compartilhar com seus seguidores todo tipo de assunto que envolvia a Coreia e a Ásia, em especial, sobre moda. Para ela, apesar da diversidade de subculturas, os estilos elegante-minimalista e streetwear-tendência são os mais adotados pelos jovens.
O primeiro, mais popular nas ruas das cidades, é caracterizado pelo uso de peças modestas, que não mostram tanto decote, cores neutras ou pastéis, roupas de alfaiataria e sem muitas estampas além dos florais. As mulheres costumam usar vestidos e saias com tecidos leves, longos ou curtos, mas normalmente com mangas e em cores suaves. O blazer — sempre ele — é utilizado em peso no dia a dia, misturado a uma camiseta mais casual e a um tênis branco. "A chave desse look é parecer clean e arrumado", resume.
O segundo, comum em produções de k-pop, conta com cores neon, jaquetas oversized, coturno, camisetas com estampas gráficas e acessórios "pesados", como colares choker, cinta-liga de couro, cintos de tecido e bucket hats. Já as silhuetas tendem a ser mais retas, sem marcar o corpo. Muitos itens que são tendência mundial, inclusive, podem ser encontrados em lojas de Hongdae por preços acessíveis, segundo a jovem.
Por estar em um processo de mudança de estilo, atualizando-o para uma versão mais adulta, Luíza se identifica com o modelo elegante-minimalista, com seus tecidos grossos e peças de alfaiataria. Gosta muito, também, de peças em preto e branco, que mantêm um contraste com sua pele. Sobre as inspirações, a criadora de conteúdo aprecia os looks cotidianos das celebridades, entre elas, as integrantes do grupo Blackpink.
"Quanto mais eu amadureço meu estilo, menos me identifico com as roupas de palco. Uma ótima dica para quem gosta do k-style que diverge um pouco do street é seguir blogueiras coreanas, tanto no Instagram quanto no Tiktok. Elas normalmente mostram o que está em alta na Coreia no estilo que você realmente gosta. O Pinterest também salva vidas", sugere.
Em busca do estilo ideal para além das tendências
O processo de emagrecimento foi o pontapé para o estudante de letras João Eduardo Guimarães "reconstruir" seu guarda-roupa — como perdeu em torno de 30kg, poucas roupas serviam adequadamente. Esse período coincidiu com a decisão de se firmar em estilos específicos, já que sempre gostou muito de moda. Assim, passou a se permitir usar mais alfaiataria, por exemplo, além de peças inspiradas no light academia, que conta com roupas mais clássicas, semelhante ao k-style.
Manter o estilo, entretanto, esbarra em alguns empecilhos, como o clima quente, que dificulta a utilização de casacos pesados por muito tempo, e a busca por peças nesse modelo em lojas brasileiras. Tal questão corrobora para a crítica do estudante sobre a falta de um mercado de moda masculina mais aberto a determinadas peças, com uma pegada retrô, por exemplo, bastante procurada em brechós. "As marcas, principalmente as mais acessíveis, precisam expandir suas possibilidades. Percebo que certas lojas de departamento estão há tempos reproduzindo os mesmos modelos de looks, sem novidades que sejam atraentes ao público, além de as roupas serem muito parecidas, como uniformes", ressalta.
Peças diferentes, com estilos ecléticos, tendem a fazer parte de grifes, o que as tornam caras e inacessíveis, conforme pontua o jovem. Como exceção, sugere a marca Dendezeiro que, mesmo tendo preços mais altos que as lojas de departamento, investe em roupas agênero e tem modelos mais interessantes. Fora isso, restam os brechós e as fast fashions, a exemplo da Shein, onde consegue encontrar vestimentas que se identifica. No que tange a influência da moda asiática, há, para ele, clara referência a gigantes como a Nike, além de um apreço por looks básicos, mas nem por isso deselegantes.
"É um básico bem-feito, com alfaiatarias que modelam o corpo, marcam a cintura e trazem um ar de sofisticação, mais clean. Esses aspectos eu certamente incluiria no meu guarda-roupa", destaca. Ao mesmo tempo, o estudante avalia que o costume exagerado de seguir tendências e vestir as "peças do momento", no k-style, suprimem parte da individualidade, uniformizando seus usuários. "Vestir-se do que está na moda e sentir-se bem é incrível, agora, optar por determinadas roupas por pressão do consumismo é incentivar um mercado que, por vezes, é bastante desigual", finaliza.
Vale lembrar que, ao importar peças de países asiáticos, é imprescindível estar atenta às medidas, já que o biotipo de lá é diferente do encontrado no Brasil. O segredo está, portanto, em fazer uma crítica pessoal sobre o próprio estilo, compreendendo o que pode ou não ser interessante para sua composição. Experimente e descubra o que melhor se adequa à sua personalidade.
Dos doramas para você
Quando a consultora de imagem e estilo Keli Freire percebeu que faltava mais conteúdos sobre moda coreana, em especial a dos doramas (séries asiáticas) na internet, lá em 2018, decidiu criar o próprio perfil no Instagram para compartilhar essas dicas, o @modadosdoramas. "Eu me surpreendi com a aceitação. As 'dorameiras' me enviam mensagens diariamente, pedindo pra encontrar looks de personagens em sites de compras e amam os vídeos que faço falando sobre o estilo dos ídolos do k-pop", conta.
Os garimpos, em busca de peças semelhantes, são rotina para ela, que considera a moda coreana inspiradora e diversificada. Seu estilo é uma mistura de modelagens mais amplas, vestimentas overzised; combinação de roupas românticas com aquelas mais street. Ademais, o fato de as meninas coreanas, em sua maioria, usarem peças que não mostram muito o corpo, mas, ainda assim, conseguirem passa certa sensualidade lhe encanta. "É uma aula de como ser sexy sem ser vulgar", brinca. "Fico muito feliz em ver o quanto esse estilo está se propagando no Brasil."
*Estagiária sob a supervisão de Sibele Negromonte