Durante a pandemia, Sonia Lima Silva se descobriu uma exímia cozinheira. Não que ela não soubesse lidar com as panelas. Mas, por necessidade, ela precisou pôr, literalmente, a mão na massa, pesquisar receitas, adaptá-las e criar um cardápio variado para que o seu negócio sobrevivesse ao lockdown.
Sônia nunca teve medo de trabalho. Nascida em Caxias, no interior do Maranhão, ela chegou a Brasília, onde uma irmã morava, em busca de uma vida melhor. Logo conseguiu um emprego como empregada doméstica na casa de uma família mineira. "Com a minha patroa, aprendi a fazer muita comida gostosa", recorda-se.
Depois de um ano, a maranhense foi ser garçonete no Bedrock, na Asa Norte, e por lá ficou por 15 anos. Ganhou experiência na lida diária de um bar. Aprendeu do atendimento ao gerenciamento e cultivou uma clientela fiel. Foi justamente um desses clientes, que sonhava em abrir um bar, quem a convidou a trabalhar no estabelecimento que abriria, com um sócio, na mesma rua.
A maranhense decidiu embarcar na ideia para ajudar na abertura do Dikantu Bar, na mesma rua do antigo Bedrock, em 2016. Pouco tempo depois, a sociedade se desfez e Sonia assumiu a gerência da casa. Trabalhou pesado, até que, em 2017, o antigo cliente e agora patrão disse a ela que não daria conta de seguir sozinho e iria vender o bar. "Fiquei sem chão, tinha largado um emprego de 15 anos e, agora, ia ficar sem nada."
Ele, porém, disse que não achava certo que Sonia, que deu o sangue pelo lugar, ficasse sem nada. E fez a proposta: venderia o Dikantu para ela, que o pagaria com o valor do seu então salário por alguns anos. "Claro que aceitei na hora. Resolvemos toda a burocracia e eu assumi o negócio, que passou para o meu nome."
No ano seguinte, o Dikantu recebeu o convite para participar do Festival Comida di Buteko. Já na estreia, o petisco servido na casa ficou em quinto lugar. Com dias melhores e outros piores, Sonia ia tocando o bar até que a pandemia da covid-19 a obrigou a fechar as portas. Em um primeiro momento, ela ficou sem chão, mas a maranhense sabia que precisava agir rápido.
Mudando os rumos
"Estava tudo fechado, só a padaria funcionava. Era a primeira segunda-feira do lockdown, quando um trabalhador da construção civil passou e perguntou se eu não podia fazer três quentinhas. Olhei para o meu freezer cheio de comida e disse que em 15 minutos conseguiria entregar o um bife à parmeggiana", relembra. Com o cozinheiro e o garçom em casa, coube a Sonia ir para a cozinha preparar o prato.
Até então, o bar só abria à noite e o cardápio se restringia aos petiscos. Ela até colocou o seu cardápio em um aplicativo de venda de comida, mas não tinha saída. "As pessoas não queriam petiscar, queriam almoçar." Logo ela viu nas marmitas um filão que poderia salvar o seu negócio.
O filho criou uma rede de contato no WhatsApp com os clientes e, diariamente, Sonia anunciava o cardápio. Em dois dias, ela já tinha uma média de 40 pedidos, que só se multiplicavam. "Os moradores da quadra passaram a vir buscar as quentinhas, assim como os trabalhadores da região."
E a comida de Sonia ganhou ainda mais fama quando ela decidiu preparar, aos sábados, a sua famosa feijoada, que aprendeu com a primeira patroa, quando chegou a Brasília. "Passou a vir gente do DF todo para pegar a feijoada, que eu vendia em quentinhas individuais e para a família." Os 10 dias de lockdown viraram 15, um mês… E o que todos achavam que seria algo passageiro se perpetuou por mais de dois anos.
Quando pôde reabrir o Dikantu sem restrições, a primeira reivindicação dos clientes foi que ela mantivesse as marmitas. "Hoje, a atividade do bar virou um extra e as marmitas a minha renda principal." O Dikantu, que antes só abria à noite, passou a receber os clientes a partir do meio-dia.
A lista do WhatsApp continua e, hoje, são fornecidas uma média de 100 quentinhas por dia. "Diariamente, preparo três marmitas diferentes para o cliente não enjoar." O frango à parmeggiana, que deu início ao negócio, tem presença certa na segunda-feira, assim como a feijoada é servida às sextas, no sábado e no domingo.
O tempero de Sonia tem ganhado adeptos e ela procura sempre inovar, não só com as marmitas. Para o Comida di Buteco deste ano, que se encerra hoje, criou uma costelinha suína assada com cardamomo ao molho de gengibre. "Na hora do almoço, ela é servida com arroz para os que querem mais que petiscar", conta.
Sonia tem buscado se aperfeiçoar. Estuda, pesquisa e sempre cria pratos diferentes. "É uma comida simples, caseira, mas de qualidade e muito sabor", atesta.
Rainha do Dikantu
Ingredientes
4 ripas de costelinha suína
1 cebola roxa
Gengibre ralado
6 sementes de cardamomo
2 anis estrelados
1 canela em pau
1 xícara de açúcar mascavo
1 colher de sopa de vinagre de arroz
200ml de shoyu
200ml de água
Sal e azeite
Modo de fazer
Tempere a costelinha com sal e gengibre a gosto e as sementes de cardamomo amassadas. Ponha para assar em forno pré-aquecido a 180ºC com papel alumínio. Após duas horas, retire o papel e deixe dourar por aproximadamente 20 minutos.
Enquanto a costelinha estiver assando, prepare o molho. Em uma panela, coloque o açúcar mascavo, o vinagre, o shoyu, o anis estrelado, a água, a canela e 1 colher de sopa de gengibre. Misture, leve o fogo e vá mexendo até que todos os ingredientes peguem o sabor.
Em seguida, coe o molho e coloque por cima da costelinha assada.
Para acompanhar, tempere a cebola roxa com um pouco de sal e azeite, corte-a em flor e leve ao forno com os cortes para baixo. Deixe assar por 20 minutos e sirva com a costela.
Serviço
Instagram: @dikantubar