Para Elis Gonçalves, comida é sinônimo de festa e, consequentemente, de alegria. Entre as lembranças mais remotas e prazerosas, guarda as reuniões de parentes, amigos e vizinhos em torno da mesa. Criada em uma comunidade simples no Gama, ela recorda-se que as mulheres da igreja se juntavam para cozinhar e a mãe, extremamente agregadora, sempre abria as portas para receber todos. "Nossa casa ficava de esquina, sem muros. Tínhamos um pé de limão e minha mãe costumava preparar suco para distribuir com os garis que roçavam o mato da rua", lembra.
No quintal, a família tinha uma horta com grande variedade de hortaliças, ervas e frutas. "Apesar de sermos pobres, nossa alimentação era muito rica", ressalta. E assim Elis cresceu encantada com os alimentos. "Minha mãe conta que, ainda muito pequena, eu sentava na mesa, cruzava as pernas, colocava a mão no queixo e ficava a observando preparar as refeições. Ela brinca que era o único momento em que eu ficava quieta", diverte-se.
Apesar de todo o fascínio, Elis não cozinhava. E nunca se interessou em aprender. Mais que isso: usava a aversão ao fogão como uma espécie de bandeira feminista. "Cresci em uma família em que só quem cozinhava eram as mulheres; os homens só desfrutavam. Achava aquilo um absurdo. Queria estudar, trabalhar, ser independente."
E ela fez tudo isso. Estudou, passou em um concurso público, conseguiu a sonhada estabilidade e, no trabalho, conheceu o marido, Oséias. Foi aí que tudo mudou. Como o companheiro — e os homens da família dele — tinha o hábito de cozinhar, Elis passou a curtir ir para a cozinha experimentar receitas. "Era uma coisa que nós dois fazíamos juntos. Isso fazia toda a diferença", justifica.
Quando visitou a família do marido no Paraná, há 23 anos, a sogra recebeu o casal com uma deliciosa torta de morango. "Eu nunca tinha comido algo tão gostoso. Ela era feita com nata fresca, que eu não conhecia. Fiquei impressionada com o sabor leve e equilibrado", recorda-se. Logo Elis tratou de pedir a receita da torta, que era a preferida de Oséias. Queria reproduzir em casa. Mas a sogra não deu. Restava à servidora tentar reproduzi-la a partir das suas memórias gustativas e afetivas.
E assim foi fazendo testes. A receita do pão de ló, por exemplo, ela foi buscar das lembranças de infância. "Tínhamos uma vizinha que fazia um pão de ló delicioso. Como ela gostava muito de mim, sempre me chamava quando ia preparar e eu ficava observando." Aliás, essa é a receita que Elis compartilha com os leitores da coluna.
Foram quatro anos de teste, acertos e desacertos, até chegar ao que Elis classifica como a torta de morango perfeita. "Prefiro não perguntar ao meu marido para não colocá-lo em saia justa, mas acho que a minha torta é mais gostosa que a da minha sogra", brinca. E o doce se tornou a marca-registrada da servidora. Se havia festa em casa, tinha lugar de destaque; quando convidada a ir à casa de alguém, era a sobremesa levada; se precisava presentear um amigo ou parente, era o mimo certo. "As pessoas me pediam para vender, mas eu dizia que não, era só para presentear mesmo."
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Iniciando um negócio
Para quem não tinha habilidade alguma com as panelas, Elis se tornou uma confeiteira de mão cheia, principalmente após se tornar mãe. As festinhas de aniversário de Yara Flor eram todas preparadas pela servidora. "Certa vez, fiz um curso de fim de semana para aprender a preparar cupcakes para uma dessas festinhas. Modelei 400 cupcakes de bichinhos", conta, aos risos.
Em outra ocasião, quando soube que uma amiga ia se casar, decidiu presenteá-la com os doces da cerimônia, mesmo sem saber fazê-los. "Meu marido falou que eu era louca." Mas, mais uma vez, Elis foi lá, fez um curso de uma semana e confeccionou 2 mil docinhos finos. "Sempre fui muito curiosa."
Há três anos, quando o companheiro teve um problema de saúde e precisou se aposentar, a família viu a renda cair. Mais ainda: o marido ficou triste por, de repente, sair de uma vida ativa para ficar em casa. Daí veio a ideia da mulher: ganhar um dinheiro extra e se ocupar com o que sabia fazer de melhor, as tortas de morango. "Oséias falou que a gente precisava se planejar, que precisava de um capital inicial... E eu só respondi: 'Toca o carro para o Taguacenter, que a gente vai começar o negócio agora'."
Elis comprou cinco formas de tamanhos variados, preparou suas famosas tortas e convidou um sobrinho para fazer as fotos. "Uma torta eu cortei e outra dei como pagamento para o fotógrafo. Sobraram três, que eu anunciei no WhatsApp do condomínio que moro. Postei as fotos e logo vendi as três." Começava, assim, um negócio de sucesso.
A servidora nunca mais parou de produzir tortas. "No Natal de 2019, recebi 70 pedidos. E fazia apenas quatro meses que tinha começado a vender. Tenho encomenda todos os dias da semana. Minha irmã até brinca questionando quem come torta numa segunda-feira", diverte-se. A maioria da produção é vendida no próprio condomínio onde mora, no Jardim Botânico, mas, com a parceria de três entregadores, Elis manda seus doces para todo o Distrito Federal. "Tenho clientes em Águas Claras, Lago Sul, Sudoeste, Noroeste...", contabiliza. O principal canal de divulgação é a página do Instagram que criou: @torta_de_morango_da_elis.
Durante o isolamento social por causa da pandemia, viu não só a demanda aumentar como a necessidade de confeccionar tortas menores. Hoje conta com tamanhos variados — da baby, que serve de oito a 10 fatias à gingante, de 35 pedaços. Elis sempre pede que as encomendas sejam feitas com pelo menos 24 horas de antecedência, mas, quase sempre, tem uma ou outra unidade para pronta-entrega.
O segredo da perfeição, acredita a confeiteira, está, no suspiro crocante, a nata fresca batida no ponto certo, o pão de ló fofinho e, claro, muito morango. "Eu amo morango. E, para mim, se a sobremesa é feita de morango, ele precisa estar presente em abundância." A torta é propositalmente alta e deve ser consumida imediatamente. "Isso não é um problema, já que desafio as pessoas a comerem apenas um pedaço. É impossível", brinca.
Elis não pretende expandir os negócios nem confeccionar outros sabores. "As pessoas até me pedem para pôr chocolate, coco... ou criar outros sabores. Mas quero manter o foco", garante. Para ela, o mais importante é levar às pessoas que provam sua torta todo o carinho e amor colocados em cada fatia. "A minha maior alegria é receber o feedback dos clientes, ouvir deles que a minha torta despertou lembranças afetivas. Quero ajudar a criar essas memórias."Ingredientes
Pão de ló
Ingredientes
6 ovos médios
1 xícara de farinha de trigo
1 xícara de açúcar refinado
1 colher de chá de essência de baunilha
1 pitada de sal
Modo de fazer
Bata os ovos com o açúcar até formar um creme fofo. Acrescente, aos poucos, a farinha junto com o
fermento e, por último, o sal.
Dicas para uma massa perfeita
Ovos sempre em temperatura ambiente.
Peneirar a farinha sempre para que o ar deixe a massa fofa.
Usar açúcar sempre refinado.
Forno em 180 graus do início ao fim.
Para untar a forma de maneira perfeita, junte manteiga e óleo. Assim, não precisará da farinha
Serviço
Instagram: @torta_de_morango_da_elis
WhatsApp: (61) 99605-9472