Estima-se que uma em cada duas pessoas apresentará pelo menos um episódio de perda de consciência ao longo da vida. Um colapso da circulação sanguínea do cérebro é o que explica a perda de consciência em grande parte dos casos e essa condição clínica é chamada de síncope. Quatro ou cinco segundos de fluxo sanguíneo cerebral de menor pressão são suficientes para levar à perda de consciência.
São várias as causas de síncope, mas a mais comum é chamada de síncope vasovagal e, mais recentemente, de síncope neurocardiogênica. Ela acontece por um controle ineficiente do ritmo cardíaco e/ou do calibre dos vasos sanguíneos por parte do sistema nervoso em situações específicas, como a posição em pé por tempo prolongado. Um quarto da população apresentará pelo menos um episódio deste tipo de síncope durante a vida e o componente genético dessa condição já é bem demonstrado.
Desmaiar ao ver sangue não é frescura
O fato de desmaiar ao ver sangue revela, na verdade, uma estratégia de sobrevivência, um mecanismo de adaptação da espécie ao longo da evolução. Essa estratégia é orquestrada pelo nosso sistema nervoso automático, também conhecido por autônomo, que é formado pelos componentes simpático e parassimpático.
Na síncope neurocardiogênica, o sistema parassimpático é ativado de forma intensa, estimulando sua principal “ferramenta de trabalho”: o nervo vago. Isso provoca dilatação dos vasos e redução do batimento cardíaco, o que diminui o fluxo de sangue para os órgãos, incluindo o cérebro.
Estudos experimentais indicam que uma região do tronco cerebral é a responsável pela estimulação do nervo vago durante um episódio de síncope neurocardiogênica. Quando um animal perde de 30% a 40% do volume de sangue e a pressão do sangue na região do tórax cai rapidamente, sensores de pressão localizados nas artérias informam essa queda ao tronco cerebral, que estimula o nervo vago que provocará o colapso circulatório. Esse colapso é útil numa situação de hemorragia, pois em condições de baixas pressões, o processo de coagulação torna-se mais eficaz para estancar o sangramento. Esse sistema não é tão bem afinado, já que algumas pessoas têm esse mecanismo deflagrado até numa situação de olhar para o sangue dos outros, mesmo que seja ao assistir a um filme.
Desmaiar frente a uma emoção forte também não é frescura
Darwin já apontava um comportamento de defesa entre os animais que era o de “se fazer de morto” quando eram ameaçados por um predador. Isso acontece especialmente se o comportamento clássico de sobrevivência de luta ou fuga não tem a mínima chance de sucesso. Há descrições dessa resposta em diversas formas de vertebrados que vão desde peixes, aves e até mamíferos. Os animais adotam uma imobilidade tônica, têm redução da frequência e amplitude das incursões respiratórias e o mais importante na nossa discussão: reduzem drasticamente a frequência cardíaca em até 85%. Em gatos, já foi demonstrado que, além da redução na frequência cardíaca, há redução súbita da pressão arterial.
Os predadores ao verem suas presas com aspecto de morto perdem o interesse, pois são atraídos por animais em movimento. Existem até experimentos mostrando que a imobilidade tônica confere vantagem de sobrevivência aos patos quando em meio a raposas.
*Dr. Ricardo Teixeira é neurologista e diretor clínico do Instituto do Cérebro de Brasília
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