“A boca é a porta de entrada dos alimentos no organismo. Como toda porta de entrada do nosso corpo, tal qual os olhos, faz parte da nossa flora bacteriana”, explica Dimas Dutra, cirurgião dentista da Clínica Dimas Dutra. Logo, o desequilíbrio da cavidade bucal leva à aparição de doenças, das mais comuns às mais sérias.
Assim, mais que um discurso clichê, a frase “a saúde começa pela boca” é um alerta. A Pesquisa Nacional de Saúde mais recente, feita pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 2019 e divulgada em 2020, mostrou que menos da metade dos brasileiros consultou um dentista nos 12 meses anteriores à entrevista. A recomendação geral é que a visita ocorra a cada seis meses. O checape é importante porque retira resíduos que não conseguem ser removidos com a escovação normal.
Placas e tártaro, que surgem do acúmulo de resíduos, fazem com que o meio bucal fique mais ácido. Daí, surgem aftas e lesões gerais. “Quando os dentes não estão bem posicionados, esse quadro pode provocar infecções e doenças que se dão em volta do dente, do osso e da gengiva, além da própria sensibilidade”, complementa. O avanço dos focos dentários pode comprometer até as válvulas cardíacas, renais e do cérebro.
Mas, por conta da pandemia, muitos têm adiado a ida ao dentista. “Temos visto as pessoas deixando de procurar os consultórios. E, quando o fazem, muitas já estão com fraturas dentárias e inchaço”, explica. Dimas afirma que as clínicas sérias têm reforçado os cuidados especiais com a higienização, com esterilização e introdução de luz ultravioleta para potencializar a limpeza de ambientes — medidas que garantem maior segurança.
Para Hugo Lewgoy, cirurgião-dentista e doutor pela Universidade de São Paulo (USP), as mudanças chegaram também à rotina de higiene oral das pessoas. Ele elenca, por exemplo, que o mau hálito causado pelo uso prolongado de máscaras e o perigo iminente do novo coronavírus fez a língua receber mais atenção. A saliva é outro ponto de foco: “É justamente pela secreção de saliva, combinada a sua localização em relação ao sistema respiratório, que a cavidade se tornou um ponto importante para a infecção pelo Sars-CoV-2”, explica Hugo. Por esse motivo, medidas de controle ganharam força, como o uso de enxaguatórios orais.
Alimentação
Antigamente, os alimentos eram consistentes, fibrosos e rígidos. Com a própria mastigação, era possível remover grande parte dos resíduos e fazer uma limpeza.
Com a industrialização, mastiga-se menos e há mudança na mistura de saliva, enzimas e bactérias, que daria início ao processo digestivo. O resultado é que os alimentos acabam retidos em toda arcada dentária e estruturas circunvizinhas.
Algo não vai bem quando há…
- Mau Hálito — pode ser causado por problemas estomacais. Em consultório, o dentista cuida do problema do refluxo nos dentes, que causa erosão do esmalte do dente, sensibilidade e cáries.
- Sangramento na gengiva, que se repete durante a escovação ou durante o uso de fio dental
- Aftas que demoram a cicatrizar ou que são recorrentes podem ser indicativos de outras doenças
- Aspecto amarelado — é comum em pacientes com doença hepática, como cirrose, ter uma “boca amarelada”
Mudanças na língua — a língua é áspera no estado comum. Em pacientes que apresentam anemia, é bem normal a língua ter aspecto de mais lisa.
Doenças comuns associadas à boca
Placas, que podem evoluir para tártaros
Aftas
Cáries
Gengivite
Periodontite
Complicações
Segundo o Instituto do Coração (InCor), 45% das doenças do coração e 36% das mortes por problemas cardíacos têm relação com infecções bucais não tratadas.
Prevenção
Com os dentes semicerrados, faça movimentos de vaivém com a escova dental, de oito a 10 vezes.
Para limpar a arcada superior, passe a escova perpendicularmente à parte que morde, até o último dente. Faça movimentos de oito a 10 vezes de cada lado.
Para limpar a arcada inferior, passe a escova com movimentos circulares. Faça movimentos de trás para frente, raspando a parte de trás dos dentes.
Uma técnica correta vai além da arcada dentária. É preciso passar a escova pelo céu da boca (de trás para frente), gengiva, bochechas e língua (também de trás para frente).
Exame importante
A radiografia panorâmica ajuda na avaliação da região bucal, porque vai mais a fundo do que o exame clínico.
Palavra do especialista
É verdade que existe relação entre saúde bucal e saúde mental?
Sim. Existem problemas de saúde mental que afetam a saúde bucal. Transtornos, depressão e outras situações, nesse sentido, acabam fazendo com que o paciente deixe de se cuidar e negligencie sua saúde bucal, o que traz problemas como cáries e perdas dentárias. Outro ponto importante é o estresse, que é um dos principais causadores da xerostomia, conhecida popularmente por “boca seca”. A pessoa estressada produz menos saliva e tende a sofrer com o ressecamento. Além de dificultar a mastigação e a fala, a falta de saliva contribui para o desenvolvimento de cáries, mau hálito e gengivite.
Da mesma forma, existem problemas bucais que afetam a saúde mental, como o aparecimento de doenças periodontais. Poucas pessoas têm essa consciência, mas bactérias que causam doenças na gengiva aumentam as placas ateromatosas. As placas ateromatosas, por sua vez, contribuem para o acúmulo de gordura e cálcio na parede de artérias e influenciam no fluxo sanguíneo e na oxigenação do cérebro.
Sabemos que, com a idade, a boca sofre transformações, ficando mais frágil e suscetível a problemas. Como cuidar, no dia a dia, para manter a saúde em dia e o bem-estar bucal?
Em todas as fases, devemos ter cuidados. Desde antes do nascimento dos primeiros dentes. Podemos destacar três cuidados básicos que ajudam nesse objetivo: escovar os dentes após as refeições, principalmente antes de dormir; usar fio dental; realizar limpeza no dentista regularmente. Por meio dessa profilaxia, conseguimos a limpeza correta de áreas onde a escovação comum e o fio dental não alcançam. Usamos jato de bicarbonato e flúor. Com esse acompanhamento, fica mais fácil cuidar de qualquer problema no início.
A pandemia da covid-19 significou reforço na rotina de higiene oral para alguns. Cuidar da boca é, de fato, prevenção para a doença?
Sem dúvidas, vejo que, cada vez mais, as pessoas tomam consciência da importância de cuidar da saúde como um todo. Os cuidados com a saúde bucal estão se tornando mais comuns entre os brasileiros. A prevenção tem sido amplamente conscientizada, e é sempre melhor e mais barata que o tratamento. Estudos comprovam que a boca é uma das primeiras entradas do novo coronavírus. Por isso, estar com a imunidade em dia inclui estar saudável de dentro para fora.
A boa higienização é fundamental para evitar complicações pulmonares no caso de contaminação com a covid-19. Vimos casos agravados por falta de higienização bucal no período em que a doença estava ativa. Inclusive, podem ocorrer pneumonias por aspiração, na falta de escovação e higienização correta da língua, dos dentes. Até por isso, é muito comum e necessário que os pacientes hospitalizados e com dificuldades de movimentos pessoais sejam acompanhados por dentistas.
Amanda Stela Lima de Paula é odontologista responsável pela Ortoestética Águas Claras
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