Diante do cenário de crise mundial, atividades que aliam a saúde física à emocional são essenciais para garantir uma melhor qualidade de vida. O tai chi chuan é uma arte marcial que, para além da defesa pessoal, tem função terapêutica. Considerada uma meditação em movimento, a prática, realizada lentamente e em silêncio, proporciona “a movimentação da energia interna e, como consequência, estimula uma consciência corporal e uma série de outros benefícios para o corpo e a mente”, destaca o professor de tai chi chuan Edivaldo Ximenes.
De acordo com a professora Mônica Han, o objetivo da prática é cultivar e promover a circulação do ‘chi’, isto é, “a energia vital que fortalece o nosso corpo”. Criado no século 17, na China, a prática se popularizou ao redor do mundo. “Os exercícios permitem um alongamento, uma flexibilidade, a fim de abrir os meridianos e deixar que a energia flua de forma mais harmônica e, com isso, traga resultados terapêuticos essenciais para o corpo”, detalha a professora.
Ao todo, o tai chi chuan tem cinco estilos com características próprias de movimento. Os mais praticados são o chen e o yang, que recebem esse nome em homenagem aos criadores. Mônica aponta que a atividade é indicada para pessoas mais velhas ou que tenham restrições físicas, pois os movimentos são suaves e lentos, evitando quedas e promovendo mais segurança. Mas, nos dias atuais, está sendo procurado por gente de idade diversa. “Jovens, pessoas mais maduras, com problemas físicos ou sem, estão buscando mais equilíbrio emocional e espiritual”, diz.
Quem também percebeu a maior necessidade das pessoas de fortalecerem a saúde física e emocional foi o professor Edivaldo Ximenes. No ano passado, ele se mudou para perto do Jardim Botânico de Brasília (JBB) e, durante uma visita ao local, imaginou-se praticando tai chi chuan. Entrou em contato com a diretoria do JBB e conseguiu que o espaço fosse disponibilizado para a realização das aulas, que ocorrem todos os sábados, das 10h às 11h. “As pessoas gostaram muito, principalmente quem vivia dentro de casa e sentia depressão, ansiedade, angústia. Muitos relataram que, depois da prática, voltam renovados para casa. É um trabalho bem importante, especialmente nestes tempos que envolvem muita preocupação”, conta.
Se o tai chi chuan já faz bem por si só, ao ser executado ao ar livre é ainda mais benéfico. “Potencializa os efeitos positivos, porque tem a energia do sol, a natureza, que ajuda a relaxar e dá uma atmosfera mais propícia para a atividade”, diz Edivaldo.
A médica veterinária homeopata Luciana Pedrosa, 32, é uma amante de esportes ao ar livre. Como tem um padrão de ansiedade exacerbado, costumava nadar ou cavalgar para diminuir os sintomas. Porém, na pandemia, parou de praticar essas atividades. Ao notar a piora da ansiedade, Luciana decidiu voltar ao tai chi chuan. “Eu já conhecia, mas, como na época era muito nova e não tinha maturidade para perceber os benefícios dessa prática, parei. Com a pandemia, decidi voltar a fazer, ou melhor, recomeçar do zero, pois não lembrava quase nada da técnica.”
À primeira vista, Luciana afirma que o tai chi chuan parece não ser adequado para quem tem problemas com ansiedade, porque é necessário controlar o movimento para que seja executado de forma lenta. Contudo, ela ressalta que essa percepção vai mudando aos poucos: “A partir do momento em que você consegue coordenar o movimento com a respiração e vai progredindo, você vai reorganizando esses sentimentos, esse mal-estar, e vai dando lugar a sentimentos positivos. Aos poucos, você sente a mente se acalmando e o corpo organizando toda a parte de circulação de energia. Sente uma melhora na concentração e na tranquilidade”.
Chi kung
O tai chi chuan tem como filosofia base o chi kung. “Trata-se de uma técnica que busca harmonizar o corpo e a mente por meio da movimentação do fluido vital que corre nos meridianos e passa pelos vasos energéticos. Isto é, o chin”, conceitua o mestre de chi kung Marcus Evandro. Ele ressalta que, para ter saúde integral, é necessário equilibrar o yin (energia estática e reclusa) com o yang (energia dinâmica, quente). “O objetivo é deixar a mente no presente. Por meio da postura ereta, é feita a ligação da cabeça, que capta a energia yang do céu, com os pés enraizados no chão, que buscam a energia yin da terra. Com isso, a energia vai fluindo de um ponto a outro”, detalha.
Para alcançar a harmonia, o professor elenca a adoção de três posturas em conjunto: física, emocional e mental. De acordo com Marcus, os movimentos do chi kung são utilizados como uma espécie de aquecimento para a prática do tai chi chuan. Mas é importante que, tanto em um quanto em outro, os braços e as pernas fiquem um pouco flexionados para não impedir que a energia flua.
Segundo o professor Edivaldo, a arte marcial é caracterizada por uma combinação de movimentos corporais com a respiração e a concentração da mente. “A arte marcial pode ser praticada por qualquer pessoa e é importante que ela se sinta confortável. Por isso, recomendo que use calçados macios e roupas confortáveis para não atrapalhar a realização dos movimentos”, aconselha o professor.
Benefícios diversos
Como a prática do tai chi chuan tem um olhar mais ampliado sobre a saúde, ela promove inúmeros benefícios para o bem-estar. “A prática dá mais disposição para o dia a dia, promove uma melhora na flexibilidade das articulações. O estresse e a depressão são aliviados, as emoções são equilibradas e há estímulo do convívio social, pois as pessoas trocam experiências”, lista Edivaldo.
A melhora da imunidade, da circulação sanguínea, assim como da concentração e da memória é outra consequência positiva. Para Mônica Han, a prática promove uma consciência sobre nós mesmos. “O tai chi chuan nos ajuda a voltar para dentro e ter a oportunidade de nos transformar. Ela também integra o nosso espírito. É uma prática que nos leva a um caminho de equilíbrio total do ser, nos leva a ser pessoas mais flexíveis. O caminho da não rigidez é também importante não só para a nossa flexibilidade física, mas também interna, emocional e mental”, constata.
Apaixonada por artes marciais desde pequena, a professora de educação física e fisioterapeuta Marise Severo, 60, encontrou no tai chi chuan uma alternativa para não abandonar a prática, pois, além das lesões que ganhou com o passar dos anos, a terceira idade se aproximava, exigindo uma atividade de menos impacto para o corpo.
“Há aproximadamente 10 anos, sem abandonar as demais atividades, comecei a praticar tai chi chuan. Além de viver minha paixão pelas artes marciais de alguma forma, apesar das lesões e da idade, o estresse do dia a dia me motivou a procurar a atividade, pois comecei a sofrer de síndrome do pânico. O tai chi chuan me auxiliou nessa jornada de tratamento desses problemas que atingem muitas pessoas nos dias de hoje”, acrescenta.
Marise recomenda a prática para todas as pessoas que são ansiosas, tensas e buscam uma atividade para aprender a estar presente no aqui e agora. “No começo, é muito difícil executar devagar os movimentos, mas, com o tempo, a gente acaba conseguindo. As aulas em grupo são muito legais porque promovem esse estar junto a outras pessoas com os mesmos objetivos. Nós nos ajudamos bastante e formamos um grupo bem gostoso. É uma atividade muito saudável”, conclui.
*Estagiária sob a supervisão de Sibele Negromonte