Em meio a um período de incertezas, tensão e preocupações, técnicas de relaxamento são cada vez mais procuradas para aliviar o cansaço do cotidiano. Entre as alternativas, estão as chamadas terapias holísticas. Nelas, a vida e o ser humano são tratados de forma multidimensional, ou seja, o indivíduo é visto como um todo, tanto no âmbito físico quanto no mental, no emocional e, até mesmo, no espiritual. Por isso, os métodos holísticos costumam se diferenciar dos tradicionais, complementando a medicina, mas não a substituindo.
“As terapias holísticas são recursos muito importantes em relação à saúde mental e ao bem-estar. Elas são classificadas como terapias integrativas e complementares, então são formas de sair um pouco do eixo da medicina convencional, diminuindo a necessidade do uso de muitas medicações, por exemplo”, explica a psicóloga Carla Fragomeni.
Segundo a profissional, a presença de sintomas como estresse e ansiedade aumentou significativamente durante a pandemia da covid-19. Além do medo constante em relação a como a doença se comporta e evolui, há sobrecarga de trabalho, dificuldades financeiras e falta de contato social ou atividades prazerosas. “Um dos principais benefícios das práticas complementares é a melhora das condições gerais da saúde, uma vez que muitas doenças são ocasionadas em decorrência do estresse”, pontua Fragomeni.
A psicóloga, que é também membro da Sociedade Vipassana de Meditação, lembra que o ato de meditar, também considerado uma forma de terapia holística, é reconhecido mundialmente pelas sociedades de psiquiatria e de neurologia, além de ser uma ferramenta poderosa de autocuidado e percepção. Segundo ela, meditar promove um encontro genuíno com nós mesmos em meio ao turbilhão de informações que recebemos todos os dias, trazendo a possibilidade de gerenciar melhor a mente, a atenção e as emoções.
“É importante, ao longo do dia, criar pequenas pausas, pequenas ‘ilhas de consciência’. E, nessas pausas, notar como estamos e o que estamos sentindo. Para isso, basta parar por um minuto, pequenos momentos de autocuidado já fazem uma enorme diferença. A falta de tempo é uma das maiores formas de autoviolência da vida moderna”, aconselha.
Agulhas do bem-estar
Uma das terapias holísticas mais conhecidas, embora muitos não saibam que se trate de um método holístico, é a acupuntura. A técnica, que consiste na inserção de uma ou várias agulhas muito finas na pele e nos tecidos subjacentes em pontos definidos do corpo, teve início na China e depois se popularizou em todo o planeta.
“A acupuntura gera mudanças que levam ao equilíbrio do corpo, liberando diferentes substâncias e estimulando o sistema nervoso. As alterações bioquímicas resultantes influenciam os mecanismos homeostáticos do organismo, promovendo o bem-estar físico e emocional”, explica a acupunturista Camila Coelho. Segundo ela, foi comprovado que a estimulação de certos pontos afeta áreas do cérebro conhecidas por reduzir a sensibilidade à dor e ao estresse, gerando relaxamento e reduzindo a tensão.
A prática ainda pode diminuir os níveis de cortisol (hormônio do estresse), a pressão arterial, a frequência cardíaca e, consequentemente, relaxar o tecido muscular. A acupunturista pontua que uma das razões pelas quais a técnica é tão popular é porque, além de fornecer inúmeros benefícios à saúde, ela também é livre de efeitos colaterais.
“Ainda existe um tabu entre algumas pessoas, porque a acupuntura é uma prática muito relacionada à espiritualidade e ao misticismo, por demonstrar a ligação do homem a um padrão energético, realizando a associação de fatores da natureza aos problemas físicos, psíquicos e espirituais. Porém, é importante deixar claro a eficácia do tratamento, bem como o diagnóstico com viés científico”, ressalta.
O empresário Rafael Matias, 34 anos, conta que buscou a acupuntura para reduzir a ansiedade, uma vez que não queria recorrer a tratamento com remédios alopáticos. “São meus dias de maior relaxamento. Percebi também um aumento da concentração, melhora do sono e, com isso, consigo produzir mais em meu trabalho”, afirma.
Já Mikaelly Rodrigues, 30 anos, procurou a prática milenar por motivos variados: irritabilidade, estresse, dor nas articulações, dor lombar e letargia. Ela conta que a acupuntura, além de auxiliá-la a enxergar melhor os sinais do próprio corpo, também foi importante para minimizar os efeitos da quarentena: “Ajudou-me a passar por este momento difícil e a manter o equilíbrio”, diz.
Alívio imediato
Na mesma linha da acupuntura, de provocar estímulos em pontos específicos do corpo, existe outra técnica milenar oriental ainda muito praticada na Tailândia como método de cura: o tok sen. A prática utiliza um martelo e pinos personalizados que, por meio da vibração da batida em regiões corporais, induzem ao relaxamento e provocam atenuação instantânea de incômodos.
O terapeuta Christiano Leão garante que o tok sen pode trazer mais qualidade de vida, uma vez que auxilia no tratamento e na prevenção de patologias de forma natural, sem medicamentos ou cirurgias. “Hoje, encontramos farmácias a cada esquina e, cada vez mais, as pessoas estão ansiosas e sob estresse constante. O corpo é moldado e reflete esses sentimentos. No tok sen, entendemos que a dor é como um professor tentando ensinar, ela volta até que você aprenda ou alguém lhe guie para a melhora.”
Depois de passar sete meses sem conseguir dormir devido a uma inflamação na musculatura da coluna que a impedia de achar posições confortáveis para se acomodar, a administradora Patricia Ferreira da Silva, 31 anos, não sabia mais o que fazer. “Meu médico já estava tratando o meu quadro como se fosse fibromialgia”, lembra.
Por acaso, ela encontrou as redes sociais do terapeuta de tok sen e decidiu fazer uma sessão para experimentar. Ela conta que o alívio foi imediato. “Tirou a dor da minha lombar e todos os outros pontos que estavam me incomodando, além de alinhar meu corpo”, afirma Patrícia, que também percebeu relaxamento mental com a terapia. “Foi fundamental neste período de pandemia — e ainda está sendo. Eu me sinto muito bem depois da sessão, tanto física quanto mentalmente”, acrescenta.
Segundo o terapeuta, os benefícios da técnica podem abranger desde melhora do desempenho e mobilidade no esporte até recuperação de dores na coluna, nas costas e nas articulações, e prevenção de doenças e lesões. Além disso, pode auxiliar no tratamento de outros problemas, como hérnia de disco, insônia, bursite e tendinite. “Essa é só uma das diversas formas de tratamentos holísticos que existem para ajudar as pessoas. A importância está em oferecer uma nova visão, um novo caminho ou um complemento de terapia sobre o que é imposto”, completa Christiano Leão.
A cura pelas mãos
Outra forma de terapia holística bastante utilizada é o reiki, um método de cura natural que ocorre por meio da imposição das mãos. De acordo com o mestre de reiki Renato Menezes Santana, 48 anos, a prática consiste em canalizar a energia cósmica universal (REI) para harmonizar as quatro dimensões do ser (física, emocional, mental e espiritual), equilibrando a energia corporal vital (KI), que mantém nossas células, órgãos e sistemas vitais funcionando perfeitamente.
Segundo o especialista, o reiki tem duas características principais: simplicidade e praticidade, podendo ser praticado por qualquer pessoa, sem precisar de instrumentos, horários ou locais específicos. Além disso, não há vinculação com religiões, dogmas ou sistemas filosóficos. “É uma forma de alinhar e desbloquear os campos energéticos — mental, físico, psicológico, emocional — que, com o tempo, vão bloqueando por motivos diversos, como dores emocionais, traumas, doenças, medos, culpas, mágoas e histórias pessoais mal resolvidas”, explica.
A planejadora financeira Lucineide Martins, 45 anos, conta a experiência difícil que viveu e de que forma pôde lidar melhor com ela, com a ajuda do reiki. “Em 2017, sofri um acidente grave de bicicleta e tive traumatismo craniano e AVC hemorrágico. Perdi toda a minha capacidade cognitiva e motora”, lembra. “Quatro dias depois de voltar do hospital, uma amiga me levou para uma sessão de reiki. Na hora, senti como se tivesse fazendo uma cirurgia na minha cabeça, mas sem dor alguma”, relata.
Lucineide lembra ainda que, antes, sentia muitas dores de cabeça, tonturas e enjoo em consequência do acidente. Depois que realizou a terapia reikiana, ela diz nunca mais ter tido quaisquer desses sintomas. “Foi uma vivência muito valiosa e fez todo o sentido para mim naquele momento.”
Tem no SUS
Sabia que muitas terapias holísticas são oferecidas pelo Sistema Único de Saúde (SUS)? Elas são chamadas de Práticas Integrativas e Complementares em Saúde (PICS), consideradas “recursos terapêuticos que buscam a prevenção de doenças e a recuperação da saúde, com ênfase na escuta acolhedora, no desenvolvimento do vínculo terapêutico e na integração do ser humano com o meio ambiente e a sociedade”, segundo define o Ministério da Saúde.
São elas: medicina tradicional chinesa/acupuntura, medicina antroposófica, homeopatia, plantas medicinais e fitoterapia, termalismo social/crenoterapia, arteterapia, ayurveda, biodança, dança circular, meditação, musicoterapia, naturopatia, osteopatia, quiropraxia, reflexoterapia, reiki, shantala, terapia comunitária integrativa, ioga, apiterapia, aromaterapia, bioenergética, constelação familiar, cromoterapia, geoterapia, hipnoterapia, imposição de mãos, ozonioterapia e terapia de florais.
De acordo com o órgão, essas práticas são transversais em suas ações no SUS e podem estar presentes em todos os pontos da Rede de Atenção à Saúde, principalmente na Atenção Primária. O Brasil é considerado uma referência mundial na área de práticas integrativas e complementares na atenção básica.
O poder dos aromas
Diferentemente de outras técnicas que exigem o uso do corpo, a aromaterapia está conectada com os sentidos, mais especificamente, o olfato. É a ciência ligada à química molecular encontrada nos óleos essenciais — substâncias voláteis presentes nas plantas aromáticas, que são extraídas para fins terapêuticos. Nesta prática, são utilizadas somente substâncias naturais, ou seja, os óleos essenciais são extraídos por destilação, a vapor, sem qualquer uso de compostos sintéticos.
A bióloga Vishwa Schoppan explica que, ao longo de anos de estudo, ficou estabelecida a forma como os óleos essenciais interagem com nosso sistema nervoso, epitelial, imunológico e endócrino, bem como suas formas de absorção, via inalação e fixação cutânea, ou diluídos em óleos vegetais e cremes. Os benefícios comprovados incluem efeitos antimicrobianos, antivirais, antibacterianos e antifúngicos, analgésicos, anti-inflamatórios, relaxantes e calmantes do sistema nervoso, ansiolíticos, entre vários outros.
“A situação a qual estamos vivendo requer a todos nós recolhimento. Podemos usar nosso olfato como aliado para criar sensações de bem-estar, de ninho acolhedor, que nos tragam memórias boas e positivas. Todo lugar que nos cheira bem, nos é aconchegante e relaxa imediatamente nosso sistema nervoso, acalmando a ansiedade e a angústia”, afirma Vishwa, que é cofundadora e responsável técnica da Terra Flor Aromaterapia, uma empresa especializada na prática terapêutica, localizada em Alto Paraíso (GO).
Segundo ela, uma pesquisa realizada em voluntários pelo Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (SP) demonstrou que em momentos muito angustiantes, como um pré-operatório, por exemplo, a inalação de óleos essenciais como lavanda, bergamota, gerânio, may chang, ylang ylang, cedro tlas, verbena e lemongrass, trouxe uma significativa redução da ansiedade e do medo.
“Óleos essenciais são substâncias altamente concentradas, que possuem aromas característicos de cada parte da planta e, quando inalados, são captados pelos receptores olfativos e estimulam a região do cérebro denominada sistema límbico. Essa área é responsável por gerenciar nossas emoções, comportamentos e memórias. Desta forma, os óleos essenciais atuam promovendo melhora em quadros de ansiedade, depressão e distúrbios do sono”, pontua a fisio e aromaterapeuta Raquel Galiazzi.
A estudante Ana de Andrade Carvalho, 21 anos, conta que a aromaterapia a ajudou a dividir o tempo e os ambientes. É que, durante a pandemia, ela passou a fazer todas as suas atividades no quarto, desde dormir até trabalhar. Com o uso de aromas diferentes em momentos diferentes, ficou mais fácil distinguir a hora de descanso da hora de concentração. “O óleo essencial de lavanda é um dos meus favoritos para relaxar. Já o de alecrim eu gosto de usar em momentos que preciso de mais foco ou de estar mais ativa, para fazer exercícios e treinar, por exemplo, já que sou dançarina”, relata a jovem.
Para ter os benefícios dos aromas, Ana utiliza um difusor de óleos essenciais e um colar aromático. O primeiro funciona como um umidificador no ambiente, no qual se coloca água com algumas gotas do óleo essencial, liberado com o vapor. Já o colar pode ser levado para qualquer lugar, bastando colocar algumas gotas do óleo em um pedaço pequeno de algodão e encaixá-lo no pingente do cordão.
Os óleos essenciais e seus benefícios
» Bergamota – Analgésico, digestivo, imunoestimulante, espasmódico, carminativo, laxativo, regulador de apetite, emocionalmente indicado para ansiedade, controle emocional e otimismo.
» Camomila romana – Analgésico, antiespasmódico, antialérgico, febrífugo, fungicida, ansiolítico e calmante.
» Laranja doce — Antisséptico, antidepressivo, adstringente, digestivo, relaxante muscular e analgésico.
» Lavanda francesa – Calmante, hipotensor, analgésico, antisséptico, cicatrizante e antiespasmódico. No emocional, promove paz e serenidade.
» Lemongrass – Antimicrobiano, anti-inflamatório, sedativo, analgésico, vasodilatador, fungicida, bactericida. No emocional, promove calma e diminui a hiperatividade infantil.
» Limão – Antisséptico, antiviral, diurético, imunoestimulante, promove foco e centramento.
» Tea tree – Anti-inflamatório, antiviral, antimicrobiano e antibacteriano.
Fonte: Raquel Galiazzi, graduada em fisioterapia pela Universidade Estácio de Sá, formada em aromaterapia integrativa pela Harmonie Aromaterapia e especialista em aromaterapia pediátrica, com ênfase em autismo e TDAH
*Estagiária sob a supervisão de Sibele Negromonte
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