Bichos

Mantendo a boa convivência dos pets com a vizinhança

Normas para um bom convívio entre animais e humanos é essencial nos ambientes públicos e privados. Especialistas explicam os direitos e deveres dos pets

Amanda Silva*
postado em 18/04/2021 08:00
Bella foi proibida de circular com Lunna na área comum do condomínio -  (crédito: Arquivo pessoal)
Bella foi proibida de circular com Lunna na área comum do condomínio - (crédito: Arquivo pessoal)

As regras de boa convivência são essenciais para manter um bom relacionamento entre a vizinhança. São aplicadas nas áreas comuns de um condomínio e até dentro da casa ou apartamento. Mas, quando se trata de animais, as normas precisam ser vistas com cautela, pois podem ser exageradas e gerar conflitos.

A legislação brasileira não permite que um morador interfira no direito de propriedade do outro. Na prática, isso quer dizer que um vizinho não pode ditar regras sobre quem mora na unidade ao lado. “Sendo assim, caso uma pessoa queira ter animais domésticos no apartamento, ela pode. Isso porque o direito de propriedade, previsto na Constituição Federal, transcende possíveis convenções de condomínio com regras que proíbam o abrigo de pets”, afirma Jaqueline Schneid, advogada do escritório Ribeiro Araújo Advogados Associados.

Ela acrescenta que cabe ao síndico agir como mediador para minimizar possíveis impactos negativos. “É necessário que as regras de convivência sejam claras, bem definidas e amplamente divulgadas.”

Para o Supremo Tribunal de Justiça (STJ), o condomínio não pode proibir que um morador tenha um animal de estimação. Existe o argumento do direito à propriedade e à liberdade individual na área privativa. Porém, caso o convívio com o animal se torne inviável, deve ser analisado o caso individualmente.

Jaqueline conta que, apesar de a lei ser clara, ainda existem condomínios que possuem convenções, estatutos ou regimentos com cláusulas de absoluta proibição quanto à criação ou ao trânsito de animais nas unidades privativas e áreas comuns. Existem casos de que nem mesmo um visitante pode levar qualquer animal para o condomínio, sob pena de aplicação de multa ao morador. “O condomínio jamais poderá proibir, apenas regulamentar, dentro dos limites legais, como se dará a permanência, o trânsito e a convivência desses animais”, explica a advogada.

Ela recomenda que, quando a regra for muito restritiva, tenha-se uma conversa com os vizinhos e síndicos para que eles estejam cientes que o tutor tem o direito garantido pela Constituição. “Isso pode ser eficiente. Caso contrário, o condômino deve registrar queixa por constrangimento ilegal na delegacia mais próxima.”

“Em proibições de trânsito em elevador, deve-se entrar com uma ação criminal por maus-tratos. O mesmo deve ser feito com o uso obrigatório da focinheira quando desnecessário, em animais de pequeno porte e que não apresentam risco para os demais”, esclarece Jaqueline.

A obrigatoriedade de levar os animais no colo nas áreas comuns do condomínio também valida ação de indenização por danos morais por constrangimento. “O regimento interno e a convenção devem se adequar à lei”, alerta o veterinário Marcelo Tacconi, responsável pela área de educação corporativa da Cobasi. Ele ressalta que, caso o pet cause comprovadamente algum dano material ao condomínio, o morador deverá ser responsabilizado e arcar com os custos.

E o que pode ser exigido?

O condomínio pode exigir o uso obrigatório de coleiras e guias, carteira de vacinação em dia, restrição de animais em locais específicos do prédio e recolhimento das fezes. “A proibição de animais na academia, salão de festas, hall social e piscina é possível”, acrescenta o veterinário.

Jaqueline complementa que os cães de porte grande ou que apresentem comportamento agressivo devem utilizar focinheira sempre que estiverem nas áreas comuns do prédio. “Além disso, as crianças não devem ficar responsáveis pelos animais nas áreas comuns do prédio.”

O dono do animal deve garantir que seu pet não atrapalhe o sossego do condomínio. Isso inclui se certificar de que ele não suje os espaços comuns, não fique latindo de madrugada ou sempre que esteja sozinho em casa e não incomode outras pessoas. O barulho excessivo e fora de hora é, justamente, uma das maiores causas de desavenças. “Quem se dispõe a ter um pet precisa garantir que o animal seja domesticado”, alerta a advogada.

É importante estar ciente dos possíveis problemas que o pet pode causar e deixar claro para os vizinhos que você está trabalhando para que a situação não se repita. No caso das reclamações partirem de pessoas intolerantes, o auxílio de um advogado pode ser necessário. “Conhecer os direitos e deveres seus e de seus cães é fundamental, não só para essa situação, mas para a vida. O ideal é sempre buscar um meio termo e uma convivência amigável, com vizinhos, síndicos e administração de condomínio”, conclui Jaqueline.

Os pets nos condomínios

O gato de Júlia, James, era obrigado a entrar e sair do prédio pela garagem e dentro de uma caixa
O gato de Júlia, James, era obrigado a entrar e sair do prédio pela garagem e dentro de uma caixa (foto: Arquivo pessoal)

A universitária Bella Monteiro, 20 anos, passou por algumas situações constrangedoras com o seu pet no condomínio em que morava. Em um caso, exigiram o uso da coleira na cadela Lunna em áreas comuns. “Em outra ocasião, falaram que, mesmo com coleira e com saquinho para coletar as fezes, eu não poderia andar com a minha cachorra em áreas comuns do prédio. Disseram que, se eu quisesse passear com ele, deveria ir para fora do condomínio.”

Por fim, ela e a família mudaram-se para outro condomínio sem entrar com ação judicial ou fazer reclamações formais. Bella diz que ficou com medo, pois, na época, era menor de idade e não queria causar problemas para a mãe. “Eu só parei de andar com a Lunna lá”, conta.

Em 2017, quando se mudou para um condomínio, a estudante Júlia Mano, 22, teve de ir à administração pedir para criar o seu gato, James, dentro do próprio apartamento. “Ainda tinha que entrar e sair pela garagem com o meu gato, e isso ele dentro da caixa de transporte, pois não podia transitar com pets pela entrada principal”, relata a estudante.

Após essa situação, ela conta que outras moradoras se mobilizaram e entraram na Justiça para efetivar o direito de criar animais no apartamento e, por isso, quando Júlia saiu do prédio, essa não era mais uma regra presente no condomínio.

Para evitar problemas

Animais são espontâneos e agem de acordo com os instintos. Então, é comum que eles façam barulhos. Por isso, as principais queixas envolvem sons emitidos pelos cachorros, cheiro dos excrementos e também o trânsito dos animais nas áreas coletivas. Apesar de os animais não entenderem as regras, é possível que os donos façam algo a respeito. “Passeie com o cão diariamente para ele, assim, gastar energia. Evite fazer brincadeiras e atividades dentro do apartamento depois do horário permitido”, enumera o veterinário Marcelo Tacconi.

Já para os cachorros que latem muito, o ideal é procurar especialistas em comportamento animal. O médico veterinário recomenda ensinar o animal desde pequeno, explicar o que pode e o que não pode, impondo limites.

Além disso, na hora de adotar um pet, opte por uma raça que se adéque ao tamanho do apartamento e ao estilo de vida da família. Tacconi aconselha, ainda, que sempre se deve pensar de forma empática, ou seja, se colocar no lugar do outro.

É lei

Passou a valer em todo o DF, desde 3 de fevereiro de 2021, a Lei nº 6.810/2021, que dispõe sobre a obrigação de os condomínios residenciais e comerciais comunicarem aos órgãos de segurança pública a ocorrência de casos de maus-tratos a animais no Distrito Federal. A lei determina que os condomínios, residenciais e comerciais ficam obrigados a comunicar às autoridades policiais, em até 24 horas da ciência, quaisquer violações de direitos de animais em suas unidades condominiais ou nas áreas comuns.

*Estagiária sob a supervisão de Sibele Negromonte 

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