Diversos setores tiveram de se reinventar para atender às novas exigências da realidade pandêmica. Na área da arquitetura, as modificações na interação do ser humano com o ambiente ao redor impulsionaram mudanças no modo de se pensar os espaços. Em face dos perigos presentes no mundo exterior, o lar se tornou o lugar mais seguro para viver.
“Antes da pandemia, as pessoas utilizavam a casa mais como dormitório, após um longo dia de trabalho e estudos. Mas, hoje, a casa é o local onde realizamos todas as nossas atividades. Então, isso coloca ainda mais em evidência a importância de se sentir bem no próprio lar”, analisa Andreia Rocha, neuroarquiteta da Emozi Arquitetura Humanizada.
Segundo a neuroarquiteta, aspectos que antigamente passavam despercebidos passaram a ser vistos por novos prismas. “As pessoas começaram a se incomodar mais com coisas que antes passavam despercebidos, como a falta de iluminação, ruídos e barulhos externos, falta de otimização do espaço, inclusive um ambiente adequado para trabalhar, o que se tornou uma dor de cabeça para muita gente. Por isso, muitos procuraram arquitetos e designers para solucionar o problema”, conta.
Como o lar se tornou o principal referencial de vida, o mercado imobiliário se aqueceu. De acordo com a pesquisa do Índice de Velocidade de Vendas (IVV), em conjunto com a Associação das Empresas do Mercado Imobiliário (Ademi-DF) e do Sindicato da Indústria da Construção Civil do DF (Sinduscon-DF), o volume de vendas de imóveis subiu de R$ 1,5 bilhão para R$ 2,2 bilhões no ano de 2020.
Bem-estar
Enquanto algumas pessoas se mudaram para espaços maiores, outras investiram em reformas para tornar o lar mais apropriado para a nova realidade. Em meio a tantas atividades para desempenhar entre quatro paredes, adequações nos espaços se tornaram necessárias para garantir mais qualidade de vida. Estudos comprovaram que o ambiente no qual se está inserido pode influenciar no humor e nas emoções.
A área da neuroarquitetura, definida por Andreia como “área multidisciplinar que une arquitetura, design, neurociência e psicologia”, possui a finalidade de compreender as respostas humanas ao ambiente, isto é, entender como o espaço físico influencia o comportamento.
Para ela, a principal vantagem de aplicar esses conhecimentos à profissão é criar espaços mais assertivos em seu propósito. “Espaços infantis, por exemplo, que favoreçam o desenvolvimento cognitivo das crianças, espaços corporativos que proporcionam maior produtividade dos colaboradores, áreas escolares que facilitem o aprendizado dos alunos, além de casas que tragam mais bem-estar aos moradores”, exemplifica.
Andreia acrescenta que fatores estressantes podem ser potencializados se o ambiente não for confortável, por isso, criar um local que promova bem-estar é essencial. “Se você está trabalhando em um espaço que está muito quente isso vai diminuindo a sua produtividade e causando mais estresse. Quando a gente sabe que o ambiente construído nos impacta, o lar também pode ser um ambiente de cura. Por isso, deve-se pensar em um lugar que promova bem-estar, inclusive para as crianças e animais de estimação, contemplando o que é essencial para cada um”.
Versátil e multifuncional
Segundo a arquiteta Karina Korn, o home office e a criação de ambientes mais versáteis e flexíveis que contemplem as necessidades dos moradores são tendências que vieram para ficar. “A arquitetura mudou muito no sentido de que a casa começara a ser adaptada para atender mais as necessidades dos moradores. Seja para trabalhar, descansar, se exercitar. Os ambientes serão mais versáteis”, acredita.
Nesse âmbito, os ambientes multifuncionais ganharam mais protagonismo pela possibilidade de funcionarem de diferentes formas ao mesmo tempo. “A ideia de cômodos voltados só para uma função já não atende à dinâmica de hoje. As pessoas fazem exercício dentro de casa, trabalham. Então, o nosso desafio é criar espaços que sirvam para vários propósitos”, destaca a arquiteta Andreia Rocha. Varandas gourmet, que também podem funcionar como home office, salas integradas com cozinha e quarto de hóspedes ou escritório são alguns exemplos.
O analista de sistema Rafael Magalhães, 32, contou com a aplicação desses conceitos na reforma da casa dele. A necessidade de ter um espaço que favorecesse o home office, além da descoberta de que teria uma filha, contribuíram para que ele investisse em um espaço multifuncional.
“Todos os nossos ambientes ficaram bastante multifuncionais, o que facilita muito o nosso dia a dia, principalmente agora que a nossa rotina está alterada, tanto pelas mudanças vindas com a pandemia, quanto pela chegada da nossa filha”, explica. Para ele, conforto e praticidade são os elementos que não podem faltar no lar.
Sem barulho
De acordo com Andreia, o isolamento termoacústico é outra tendência que está ganhando importância, devido à necessidade de se possuir um espaço privado, livre de interferências externas, para exercer as atividades diárias.
“Como as pessoas passaram a ficar mais dentro de casa, elas observam os ruídos externos e internos, além da variação de temperatura, o que impacta diretamente no humor. Então, isso aplicado em projetos seria um maior cuidado na escolha dos materiais de revestimento, que não absorvem o calor, assim como, colocar esquadrias nas janelas e portas, o que ameniza bastante o barulho”, lista.
Natureza e sustentabilidade
A inserção de plantas e de natureza nos espaços residenciais, chamada de urban jungle, é uma tendência que também está ganhando força durante a pandemia. Segundo Andreia, estudos têm mostrado que a urbanização excessiva está adoecendo as pessoas. “A necessidade do ser humano se conectar com a natureza reduz o estresse, ansiedade e aumenta o bem-estar, a produtividade e a criatividade”, diz.
A arquiteta Karina Korn notou que, por estarem confinadas em casa, as pessoas começaram a sentir mais necessidade de ver a rua e espaços ao ar livre. “Algumas adaptações como colocar mais janelas voltadas para a vegetação, trazer natureza para dentro de casa ou até quadros com paisagens que remetam a momentos positivos podem aliviar a sensação de aprisionamento”.
Para ela, colocar painéis luminosos com fotografias que tragam boas lembranças e sensações também são alternativas para afastar o olhar das paredes. Ademais, a preocupação com a sustentabilidade entrou em pauta durante o período de crise. Karina recebeu muitos pedidos de clientes relacionados à separação de lixo orgânico do reciclável. “As pessoas começaram a perceber o quanto elas traziam lixo para dentro de casa. Tive várias conversas com clientes que nunca se preocuparam com reciclagem e na pandemia começaram a querer espaços para lixo reciclável dentro de casa“, relata.
Além disso, Karina notou que as pessoas passaram a se preocupar mais com a higiene, “começaram a se preocupar em tirar o sapato na entrada, deixar um móvel com álcool em gel e utilizar mais o lavabo, que ganhou uma nova importância dentro dos imóveis”.
Saiba mais
Dicas da neuroarquiteta Andreia Rocha para tornar o ambiente mais agradável:
* Antes de qualquer intervenção dentro de casa, reconheça o que te faz bem, o que é essencial. Faça uma reflexão sobre o que te agrada, o estilo, as cores e os materiais;
* Tenha cuidado com a iluminação. Se você está com baixa produtividade, cansaço e fadiga, pode ser que a iluminação esteja insuficiente ou na tonalidade errada. Sempre priorize a iluminação natural;
* Invista em cores menos saturadas, mais claras, para deixar o espaço mais relaxante. A psicologia das cores nos mostra como as cores influenciam o comportamento, humor e emoções;
* Utilize plantas, pois além de sua beleza, possuem propriedades restaurativas, umidificam e purificam o ar. Isso é bem-vindo para quem quer diminuir o estresse e o cansaço do dia a dia;
* Para aguçar os sentidos além da visão, utilize músicas que tragam memórias tranquilas e aromas que sejam agradáveis e calmantes, como a lavanda.
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