O cabelo afro é uma identidade, um marco, uma cultura e se tornou até uma tendência de moda. Por muitos anos, os fios crespos e cacheados foram taxados, pejorativamente, como “cabelo ruim”. A nova era é marcada pelos enfrentamentos étnico-raciais e pela resistência, para resgatar a origem, o estilo e, principalmente, aumentar a autoestima das pessoas negras, que passaram a aderir cada vez mais aos penteados afros, como as tranças.
“Elas são de origem africana. A mais antiga é a nagô, que consiste numa trança rasteira, rente ao couro cabeludo. As nagôs são muito utilizadas por quem está passando pelo período de transição capilar, ou seja, saindo de algum tipo de alisamento ou tratamento químico para voltar a usar as formas naturais dos fios”, explica a cabeleireira Thayza Cardoso.
Com a evolução dos tempos, as tranças também sofreram mudanças em seus tipos, nomes e significados. Segundo o cabeleireiro Wagner Lucenã, há indícios simbólicos das tranças na Namíbia e em outros locais da África. “Há vários grupos, religioso e sociais, que usam e abusam das tranças”, diz.
De acordo com Thayza, durante o período da escravidão no Brasil, as tranças eram utilizadas para identificar as tribos a que pertenciam os escravos. Por meio dos seus desenhos, elas também serviam como mapas e rotas para as fugas planejadas. “O desenho do ato de trançar transmite valores culturais e históricos, além de servirem para identificar a posição social, a idade, o estado civil e a religião”, afirma a especialista em cacheados e crespos e proprietária do Studio Afro, em Brasília.
A estudante de pedagogia Natália Figueirêdo Souto, 20 anos, ama usar as variações de penteados, como box braids, trança nagô, twist, trança raiz, etc. “Geralmente, eu uso a box braids e as outras nagôs. Sempre procuro na internet saber mais sobre as origens delas”, conta.
A jovem diz se sentir maravilhosa com esses penteados, porque ama inovar o cabelo — e aproveita para simbolizar resistência ao preconceito. “Eu já ouvi muitas coisas ruins sobre o meu cabelo, que seria melhor liso e deveria ser menos alto e volumoso. Em relação às tranças, infelizmente, já vi uma pessoa branca dizer que fica mais bonito nela do que em mulheres pretas”, lamenta
Origem e cuidados
O coque é prático, simples e, dependendo de como seja feito, pode ser despojado ou clássico! É um dos penteados mais antigos, pois há indícios da origem na Suméria, onde as mulheres usavam coque (chignon pesado). Esse penteado é usado até hoje em todos os tipos de cabelos e de várias formas. Também há uma simbologia por trás dos coques afros e dos afros puffs após a escravidão. “Algumas mulheres tentavam se encaixar na sociedade e os usavam para conter o volume dos cabelos”, lembra a trancista Renata Neriz.
Saber sobre a origem e a estrutura do cabelo pode ajudar nos cuidados, seja na hora de fazer um penteado, seja deixando as madeixas soltas. Uma dica essencial é o uso da touca ou xuxa de cetim — o último acessório não marca os fios ao prendê-los e é uma boa opção para fazer coques. “O objetivo é não causar atrito entre fios e evitar o embaraço deles”, explica Renata, que trabalha no Studio Re Neris hair, no Riacho Fundo II.
Há alguns hábitos que podem ajudar a não quebrar o cabelo afro (cacheado/crespo) ou danificá-lo ao fazer um penteado. “Antes, lave normalmente e passe um creme de hidratar. Depois, é a hora da hidratação. Em seguida, use um creme de pentear para finalizar com fitagem ou secagem. Deixe na forma que você desejar”, ensina Wagner Lucenã, proprietário do Estúdio Wagner Lucenã. A outra dica dele é usar bandanas para não quebrar os fios.
Tipos de tranças
Nos modelos atuais, há ramificações das tranças nagôs. Abaixo exploramos algumas tendências modernas
Box braids: são tranças com extensões com fios sintéticos. Um dos penteados afros mais clássicos utilizados desde os anos 1970 devido à praticidade e à longa duração — tem durabilidade média de três meses, podendo ser adotado por mulheres, homens e crianças de todas a idades.
Tiara de tranças: é um penteado usado em ocasiões especiais, como casamentos. Muito prático, pois traz sutileza e elegância em qualquer tipo de cabelo.
Faux locs: mais sofisticado, traz a modernidade dos dreads, podendo ser feito na técnica crochet braids. É um dos mais utilizados nos dias atuais.
Trança boxeadora: penteado que envolve duas ou mais tranças, compondo um visual simples e sofisticado. Pode ser modelado da preferência de cada um. Muito utilizado em crianças e noivas.
Trança jumbo: são tranças mais grossas com extensões em fios sintéticos, podendo utilizar fios coloridos.
Trança rabo-de-peixe: é um penteado moderno que consiste num tipo de trança embutida. Porém, seu entrelaçamento é feito em camadas mais finas, assemelhando-se a uma escama de peixe. É utilizada em todos os tipos de cabelo.
Trança embutida: é estilo nagô, mas com movimento na parte de trás.
Fontes: cabeleireira Thayza Cardoso e Grandha Professional Hair Care, empresa que oferece produtos e serviços cosméticos profissionais
Estilos famosos
Afro puff
É um penteado muito versátil, pode ser usando no dia a dia ou em festas. E, melhor de tudo: é superfácil de fazer. Comece amassando o cabelo e desgrudando a raiz com os dedos. Depois, use o pente garfo para deixar os fios ainda mais volumosos. Para prender, pode usar uma meia, mas também dá supercerto com um cadarço ou um elástico. Em seguida, passe a meia atrás do cabelo e amarre. Aperte e empurre para trás, deixando bem firme.
Baby hair
Essa tendência veio do exterior, principalmente de celebridades e influenciadores. Por aqui, muitas também passaram a adotá-la. Baby hair são aqueles fios novos que vão nascendo na parte frontal da cabeça — daí o nome cabelo de bebê, em tradução livre para o português. Os fios costumam ter uma textura mais fina em relação ao restante e, como ainda não têm força suficiente para crescer, acabam adquirindo uma aparência bagunçada na testa. Era uma febre nos anos 1990 e voltou tudo.
Fonte: Salon Line, empresa que atua no ramo de cosméticos e produtos de beleza
Use acessórios!
Para complementar os penteados, use acessórios como flores ou presilhas. Também pode adotar o turbante, que carrega muita história de lutas africanas. Essa peça tem simbologia especial em diversas culturas do mundo, como no Egito e no Oriente Médio. Na Martinica, por exemplo, era comum para as mulheres mostrarem o estado civil de acordo com a forma de amarrar o turbante. Se deixava apenas uma ponta para fora, era solteira; se deixava duas pontas para fora, tinha namorado; se deixava três pontas para fora, era casada; e se deixava quatro pontas, era viúva ou separada e estava pronta para outro relacionamento.
Os registros mais antigos vêm de Kemet, no Egito Antigo. A peça era um elemento fundamental do vestuário faraônico, denominado nemés. Em países africanos, o adereço é usado com finalidades funcionais, como proteger a cabeça ao carregar bacias, madeira e outros utensílios.
Fonte: pesquisadora e designer Thaís Muniz
*Estagiária sob a supervisão de Sibele Negromonte
Notícias pelo celular
Receba direto no celular as notícias mais recentes publicadas pelo Correio Braziliense. É de graça. Clique aqui e participe da comunidade do Correio, uma das inovações lançadas pelo WhatsApp.
Dê a sua opinião
O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores. As mensagens devem ter, no máximo, 10 linhas e incluir nome, endereço e telefone para o e-mail sredat.df@dabr.com.br.