A proteína é um dos três macronutrientes que compõem a nossa alimentação, ao lado dos carboidratos e das gorduras. É formada por cadeias de aminoácidos e conta com duas formas principais: as de origem animal e vegetal. Há uma ideia equivocada, e muito popular, de que a proteína está presente somente na carne, mas ela pode ser encontrada em todos os alimentos, em menor ou maior proporção, como nas sementes — de abóbora, girassol e chia. Sabe o gergelim, aquela sementinha que, geralmente, fica em cima do pão? Ela carrega 17,73g de proteína — a versão em farinha e sem gordura pode ter até o dobro.
As oleaginosas — amêndoas, castanhas e nozes —, além de fonte proteica, fornecem gorduras boas e auxiliam a saúde do coração. Já as leguminosas, como lentilha, grão-de-bico, soja e feijão, são consideradas fontes mais acessíveis de proteína, além de auxiliarem o funcionamento do intestino e o controle dos níveis de colesterol. Também encontramos as proteínas necessárias para a nossa nutrição em grãos, como amaranto, quinoa, aveia e arroz integral, e em vegetais, principalmente, os de coloração esverdeada. Há, ainda, os produtos que são derivados da soja, como tofu, tempeh, seitan e missô.
A nutricionista Mariana Corgosinho explica que, para entendermos o que é a proteína, é necessário saber sua função no organismo. “Ouso dizer que não existe um único processo no nosso corpo que não seja dependente da participação de uma proteína. Além da ação estrutural nas células e na construção de tecidos, como o muscular, ela exerce funções hormonais e enzimáticas. Digamos que é o tijolo que constrói tudo no nosso corpo.” E também é a base para o crescimento de cabelos e unhas.
A profissional reforça que, no caso de uma dieta sem carne, pode haver necessidade de complementação, mas de outros nutrientes, não da proteína em si. Esse mito é reforçado pela falta de informação em relação ao veganismo e vegetarianismo, como explica o vegano Eduardo dos Santos. “Para termos ideia do grau de desinformação, cálcio, ferro, ácido fólico e vitamina B12 são os nutrientes que as pessoas deveriam mais se preocupar em ter alguma carência. A proteína jamais, uma vez que todos os alimentos contêm proteína, a não ser doces e óleos”, aponta Eduardo.
Diminuindo o consumo
O médico oriental Caio Elil, 28 anos, brasiliense, suspende o consumo de carne e produtos de origem animal em determinados períodos do ano. Para ele, isso é importante para o funcionamento do corpo e da mente. “As carnes aumentam os processos de inflamação no intestino, e, como o cérebro funciona de acordo com ele, é bom manter uma época sem carnes, como purificação.” Nesses períodos, Caio aumenta a ingestão de folhas verdes e grãos.
O excesso de carne vermelha está associado à maior ocorrência de doenças cardiovasculares, diabetes e até câncer. Mariana Cargosinho diz que os malefícios estão ligados, principalmente, à forma de preparo, à criação do animal e ao equilíbrio no consumo. Ela explica que é importante priorizar carnes cozidas, em vez de fritas e assadas, principalmente aquelas muito bem passadas. “Por outro lado, a carne é, sim, fonte riquíssima em proteínas, gorduras, vitaminas do complexo B, ferro e outros.”
A nutricionista, que não consome carne, conta que essa transição pode ser complicada no início. “Quando cortei a carne da alimentação, minha relação com a comida, fome e saciedade, mudou muito e foi meio caótico. E olha que eu era estudante de nutrição.”
A dica de Mariana é variar o cardápio e testar. “O primeiro passo é querer, e o segundo experimentar. Nós, brasileiros, somos muito apegados à carne e parece que não temos opções além dela. Mas isso não é verdade, existem infinitos sabores e preparos para descobrirmos. O que eu falo para os meus pacientes que dizem querer evitar a carne em alguns dias da semana é: diminua um pouco sua porção de carboidratos, dobre a de leguminosas e finalize com uma boa colher de sopa de mix de sementes.”
A endocrinologista e nutróloga Juliana Lara conta que não é preciso fazer nenhum tipo de mudança radical para incluir proteínas vegetais na alimentação. “Comece diminuindo o consumo em um dia completo. Depois, vá aumentando o número de dias, e sinta o efeito que isso tem em seu corpo e no seu estilo de vida. A partir do momento que decidir que se sente melhor sem a ingestão de carne, busque a ajuda de um nutrólogo focado no segmento vegetariano.”
Veganismo acessível
Luciene Santos, 25 anos, auxiliar administrativa, tem mais de 100 mil seguidores em sua página no Instagram (@sapavegana). Ela adaptou a vida ao veganismo após assistir a um vídeo sobre exploração animal. “No mesmo dia, procurei alguns documentários com a mesma temática, fiquei ainda mais indignada e sentindo muita culpa, então, naquele momento, decidi me tornar vegana.” Ela explica que a busca por informação é contínua e dá preferência ao conteúdo de pessoas pobres e veganas.
O debate que muitas vezes não chega a determinados lugares pessoalmente tem um facilitador nas redes sociais, além de criar uma teia de afeto e motivação, já que a jornada do veganismo e do vegetarianismo pode ser solitária para alguns.
O dia a dia da alimentação de Luciene é amplo e acessível. “De manhã, como pão, cuscuz, frutas, mingau, tapioca etc. No almoço e jantar, gosto de arroz e feijão, macarrão, cuscuz, de refogar folhas, como couve-manteiga e rúcula, ou saladas. Faço receitas com leguminosas, como almôndegas de lentilha, ervilhas com molho de tomate. Tento elaborar pratos simples e coloridos.” As principais fontes de proteína são as leguminosas.
Luciene explica que o veganismo é, sim, acessível a todos, afinal, cada bairro costuma ter uma feira. “Procure informação. Nas redes, há muitas pessoas falando sobre. Quando for procurar, prefira aquelas que tenham realidade parecida com a sua. Uma pessoa que não passou dificuldades, que nunca precisou se preocupar com dinheiro, não vai ensinar a viver o veganismo/vegetarianismo com um salário mínimo ou menos”, completa.
Diálogo com a periferia
Os gêmeos Eduardo e Leonardo dos Santos, 24 anos, criaram a página @veganoperiférico para informar a população da possibilidade de um veganismo acessível a todos, que foque no consumo de produtos naturais — mais baratos — e não nos chamados industrializados veganos. “Quando falamos de saúde no veganismo, temos que falar de forma política e contextualizada, porque temos uma população que está morrendo, temos o nutricídio na periferia, de pessoas que estão se alimentando muito mal, consumindo muitos processados e industrializados”, diz Leonardo.
Ele chama a atenção para a necessidade da criação de políticas públicas voltadas para a alimentação da população periférica. Os irmãos contam que um dos benefícios físicos que o veganismo trouxe foi a melhora da saúde. “Eu tive muita gastrite por muitos anos. Quando trabalhava em uma rede de fast food, comia muito hambúrguer, muito pão e industrializados, e tinha muita enxaqueca, tontura e outros problemas. Eu não tenho dor de estômago desde 2015, quando me tornei vegano”, conta Eduardo. As fontes proteicas dos irmãos são os grãos, como lentilha, grão-de-bico e feijão.
Leonardo, vegano há quatro anos, assim como o irmão, trabalhou em uma rede de fast food e acabou desenvolvendo gastrite. Com a alimentação saudável, as dores cessaram. “Eu me forcei a comer mais e melhor. Fui dormir onívoro e acordei vegano, não tive transição. A primeira semana foi um pouco difícil porque o corpo estava em adaptação, mas depois foi supertranquilo.”
*Estagiária sob a supervisão de Sibele Negromonte