Um costume nos primeiros meses de vida dos cachorros é morder sapatos, móveis e o que mais encontrar pela frente. Isso acontece porque os cães precisam aliviar os incômodos na gengiva, é uma necessidade fisiológica natural do animal, despertada por volta da nona ou décima semana de vida, inicialmente, como uma curiosidade.
Isso, porém, pode se tornar um problema, principalmente se o pet tiver distúrbios psicológicos, como ansiedade. “Se ele entende que morder coisas traz um prazer muito grande, esse comportamento pode ser aplicado em outros momentos de frustração da vida, inclusive como uma forma de aliviar o estresse”, explica o adestrador Rafael Mota, da Bom Dog BSB.
Ele detalha que uma das soluções, durante o treinamento de cães, é o direcionamento da mordida para objetos feitos de materiais específicos, borracha e plástico. Assim é possível controlar o que ele está mordendo e evitar problemas como a ingestão de algo indevido. Frutas ou até carne congeladas são uma alternativa. “É preciso atender às especificidades de segurança dos animais.”
Na maior parte dos casos, os pets mordem chinelos, objetos que, em regra, não prejudicam tanto, mas, em casos específicos, pode haver risco de morte. Rafael conta que já acompanhou algumas dessas situações. “Um cliente me contratou após o animal ter engolido uma meia e ter passado por procedimento cirúrgico para retirá-la do estômago”, exemplifica.
O melhor tratamento é lidar com o cão na fase específica, ou seja, nos primeiros meses de vida, Rafael explica que, se o animal for mais velho, é preciso fazer uma dessensibilização do ambiente, ou seja, evitar deixar alguns objetos disponíveis, para que ele se esqueça do comportamento. “O cuidado que temos de ter com o cachorro é o mesmo que temos com criança: não deixar nada perigoso disponível para ser mordido ou engolido”, pontua.
Ajuda especializada
A advogada Adriana Cardoso tem um cane corso italiano que começou a morder chinelos, pés e mãos, nos primeiros meses de vida. “Paçoka chegou a mastigar a placa do meu carro. Eu vivia machucada e com hematomas nos braços e pernas”, relembra.
Adriana conta que tentou resolver o problema antes de buscar ajuda especializada. “Tentei ignorar, dar palmadas, brigar, mas ele continuava e até aumentavam as mordidas. Era extremamente insistente”. Ela explica que percebeu que reforçava o comportamento de mordidas do cachorro e que, se não tivesse tido ajuda, teria desistido. “Seria muito difícil. Hoje, Paçoka tem 6 meses e está com 33 quilinhos, eu não conseguiria dar conta”.
Ela conta que seguiu a orientação do adestrador, disponibilizou brinquedos pela casa e, nas superfícies e partes do corpo que Paçoka mordia, usou produtos que geraram repúdio, como álcool em gel.
Fatores e tratamento
O médico veterinário Julio Cesar Galvão, do Centro Veterinário Guará (CVG), explica que, ao roer e morder móveis e outros objetos duros, o risco de possíveis fraturas dentárias aumentam. E pioram se esse animal for filhote, já que os dentes ainda não são os permanentes, ou seja, são mais frágeis. “Os dentes podem quebrar, provocando dores e dificuldade de se alimentar.”
Se parte do objeto for engolido pelo pet, ele pode ficar alojado em qualquer porção do trato gastrointestinal, causando dor intensa, vômitos, falta de apetite, dor abdominal e febre. “Em algumas situações, o objeto pode ficar preso nas vias aéreas, causando uma grande dificuldade respiratória. Ambas podem causar complicações sérias, inclusive, levando o animal ao óbito. São frequentes as situações em que o animal ingere acidentalmente fios, panos, meias e caroços de frutas”, detalha o veterinário.
Segundo Galvão, algumas raças de cães são sabidamente mais ativas e brincalhonas. “Labrador e jack russell são exemplares de cães hiperativos, que têm esse comportamento de pegar tudo no chão ou morder objetos.” Em outras, esse comportamento pode estar relacionado ao fator estresse. Animais que passam muito tempo dentro de casa e não possuem um brinquedo, ou um passatempo, acabam ficando entediados e mordem objetos.
“Outro fator gerador do comportamento é a fase de troca dentária. Eles sentem um incômodo no local e passam a morder para aliviar. “Esse desconforto pode ser facilmente resolvido com brinquedos, que devem ser compatíveis com o animal em questão de consistência e tamanho, para não ser ingerido acidentalmente”, detalha Galvão.
O veterinário explica que os tratamentos variam de acordo com a causa. Se o fator é estresse, as opções são passear mais, e por mais tempo, com o animal, deixá-lo gastar bastante energia. “Drogas homeopáticas, fitoterápicas e alopáticas podem ser usadas dependendo da severidade e necessidade de cada caso.”
*Estagiária sob a supervisão de Sibele Negromonte