Alberto Álvares de Sousa começou a cozinhar por necessidade. Quando os pais do hoje administrador de empresas se divorciaram, ele tinha 16 anos e passou a morar com o pai. O patriarca, porém, só sabia preparar um único prato: sardinhas, em camadas de cebola e tomate. “Por uma questão de sobrevivência comecei a aprender outras receitas”, diverte-se. E tomou tanto gosto pela coisa que se tornou quase um profissional das panelas.
Encontrou na mulher, Maria Antônia Reis de Sousa, a maior incentivadora e cobaia, claro. Juntos há 30 anos, os dois viram na gastronomia mais uma afinidade, um prazer que se estendeu às filhas, Geórgia, 13 anos, e Paola, 6. “Somos uma família que gosta de comer. Ele cozinha e nós aproveitamos”, brinca Maria Antônia.
Nascido em Porto Alegre, Alberto chegou ainda na adolescência a Brasília, onde ganhou o apelido de Gaúcho. E, além, claro, de churrascos e costelas de chão deliciosos, especializou-se em um prato que ama: paella. “Nós costumávamos frequentar o Salamanca (antigo restaurante da cidade) e adorávamos a paella”, recorda-se Gaúcho.
Com o paladar extremamente apurado, ele é capaz de decifrar só pelo sabor os ingredientes que vão no prato. Foi assim, tentando adivinhar o que trazia sabor para a receita, que o administrador preparou as primeiras paellas. “Estava mais para um mexilhão e tinha bastantes erros. Eu, por exemplo, fritava o camarão junto com a lula e ficava tudo borrachudo.”
Quando completaram cinco anos de casados, Maria Antônia presenteou o marido com uma paellera, com direito a tripé e fogareiro. Um investimento, na verdade. “A origem do nome paella é, literalmente, para ela. Os homens, no fim de semana, pegavam todos os restos de carne e faziam uma espécie de mexidão para as esposas no dia de descanso delas”, conta Maria Antônia.
Gaúcho foi se aprimorando no modo de preparar a iguaria típica da Espanha, estudou, pegou dicas daqui e dali, até que a sua paella ficou famosa entre parentes e amigos. Durante a quarentena, em conversa com um amigo, veio um questionamento que deixou o cozinheiro pensativo: “Não acredita que você não ganha dinheiro com sua comida, principalmente neste momento em que todos estão em casa.”
Pegada espanhola
A princípio, ele ficou temeroso, mas com o incentivo da mulher, decidiu comercializar a famosa paella. “Eu falei que ajudaria em tudo. Quando o ‘artista’ chega à cozinha, todos os ingredientes estão limpos, cortados e porcionados. Sou a sous-chef”, diverte-se Maria Antônia. Como ambos estão em teletrabalho, o projeto só poderia ser executado nos fins de semana e, eventualmente, à noite, durante a semana.
Logo no primeiro fim de semana, chegaram mais de 20 pedidos; no seguinte, 30. Agora, mal estão dando conta das encomendas. Um diferencial é que a paella, geralmente um prato feito para ser compartilhado com várias pessoas, é vendida, também, em porção individual. Se o cliente pedir acima de quatro porções, há a opção de ela ir na paellera, quentinha, para ser degustada na hora.
“Compramos algumas paelleras especialmente para isso. Antes de sair para fazer a entrega, eu envio uma mensagem dizendo que estou chegando e uma playlist para a pessoa já entrar no clima”, explica Maria Antônia. As encomendas podem ser feitas com 24 horas de antecedência. Se for para um jantar durante a semana, eles aceitam apenas pedidos acima de quatro porções, que é a quantidade mínima para preparar uma paella.
O administrador garante que todos os ingredientes são de primeira qualidade. “Cozinhamos como se fosse para nós. É da nossa casa para a casa do cliente”, atesta. E dá algumas dicas para a paella perfeita: “Uso um pouco da sobrecoxa do frango, nunca o peito, para dar sabor além de um tempero importado da Espanha, o paellero”.
O projeto tem dado tão certo que o casal está com outro plano à vista: uma cervejaria artesanal. Nos últimos anos, fazer cervejas tem sido, ao lado das panelas, outra paixão de Gaúcho. Hoje, metade do que preparam é consumida pela própria família, mas a ideia é ampliar um pouco a produção. Mas sem nunca perder o artesanal. Esse é o lema do casal em tudo o que prepara. “Nós acreditamos que a comida aproxima as pessoas, cria novas amizades e memórias.”
Com os leitores da coluna, Gaúcho compartilha a receita de outro prato tipicamente espanhol, tapas, mas com um toque de brasilidade, o baru, castanha nativa do cerrado, facilmente encontrada e Brasília. “A vantagem das tapas é que você pode usar tudo o que a sua criatividade, e paladar, permitirem. Use creme de ricota temperado, peperoni, pastas de ervas e queijos”, sugere o cozinheiro. Uma ótima pedida para celebrar este Dia dos Pais!