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40 anos de democracia

Especial 40 anos de democracia — Parte 3: saída está na Constituição, mas não há convicção

No Hospital de Base, ministros do futuro governo e políticos buscam a resposta definitiva sobre se é Sarney ou se é Ulysses que substitui Tancredo

Porém, não havia total convicção de que a resposta era essa. Formaram-se, então, três grupos no Hospital de Base. O de Leônidas e Ulysses seguiu para a Granja do Ipê, onde residia o ainda ministro da Casa Civil, João Leitão de Abreu, que chancelou Sarney como substituto de Tancredo. O jurista Affonso Arinos de Mello Franco reforçou que não pairava dúvida sobre quem era o segundo da República.

"O artigo 77 diz: 'Substituirá o presidente, no caso de impedimento, e suceder-lhe-á no de vaga, o vice-presidente'. Quer dizer, temos que partir primeiro da consideração factual, e evidente, de que o vice-presidente da República não é vice-presidente do presidente. (...) O vice-presidente toma posse não como presidente, mas como vice-presidente em substituição ao presidente", disse Arinos à Rede Globo, em entrevista articulada pelo deputado Israel Pinheiro Filho (PMDB-MG), depois de deixarem o jantar na casa da empresária Vera Brandt, no Lago Sul. Dois outros juristas, Paulo Brossard e Miguel Reale, endossaram publicamente essa interpretação.

No apartamento do ministro Moreira Alves, do Supremo Tribunal Federal, na Asa Sul, travava-se a mesma discussão. Relato do ministro Sydney Sanches, outro dos 11 do STF, a Bernardo Braga Pasqualette, e publicado em Me Esqueçam — Figueiredo, a biografia de uma Presidência, mostra que situação não era tão cristalina assim. Para ele e o ministro Luiz Octavio Gallotti, Ulysses assumiria a Presidência interinamente.

"Mas não chegamos a definir posição a respeito. E a decisão da maioria foi sábia, jurídica e politicamente", relembrou. Ou seja, deu Sarney.

A dúvida era, sumariamente, a seguinte: como Tancredo estava eleito, mas não empossado, Sarney estava na mesma situação. Exercendo mandato, apenas Ulysses. Em entrevista a Ronaldo Costa Couto, cujo trecho foi publicado no livro de Pasqualette, o presidente João Figueiredo explica por que não passou a faixa presidencial e, também, por que não deveria ser Sarney a assumir o Executivo interinamente.

"Os generais vinham me propor, no caso da impossibilidade, passar o governo ao dr. Sarney. Eu digo: 'O dr. Sarney não pode'. 'Mas por que?' Eu disse: 'Dr. Leitão (de Abreu), o senhor é um jurista, eu não sou. Mas, infelizmente, sei ler português. E estou com a Constituição aqui em frente. E ela diz que no caso de impedimento do presidente eleito, tomará posse o presidente da Câmara. Durante 30 dias. Se passados 10 dias depois da posse dele, o presidente eleito não tiver condições, 30 dias após a saída dele haverá uma eleição. (...) Para mim, quem deveria assumir era o Ulysses", disse Figueiredo. Essa argumentação era compartilhada por próceres da ditadura que caía, como o ministro da Justiça, Ibrahim Abi-Ackel, e o chefe da Casa Militar, general Rubem Ludwig.

Tancredo adiou o mais que pôde a internação e a consequente cirurgia. Não era para menos: estava convicto de que, se não assumisse, haveria uma crise política. De acordo com o livro O Paciente — O caso Tancredo Neves, do médico e historiador Luís Mir, em um diálogo com o médico Renault Mattos Ribeiro, que o atendia, na manhã de 14 de março o presidente eleito deixou clara a preocupação, mas sem ser explícito nas palavras, de que poderia haver um retrocesso institucional.

"Não faço de maneira alguma (a operação). Já lhe disse que só depois da posse", disse Tancredo a Renault.

O médico, então, responde: "É como se nós estivéssemos ganhando de 1 x 0 e o outro time vai empatar. E com o empate, nós vamos perder o campeonato, presidente".

Tancredo insiste: "Mas você não vai permitir que o outro time empate. Você vai usar todos os seus recursos e não vai permitir que haja empate coisa nenhuma. Nós vamos ganhar". (Leia mais na parte 4)

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