
O Ministério Público do Trabalho (MPT) apura casos de assédio moral no Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania (MDH). Segundo a procuradora Geny Helena Marques, foram constatados pelo MPT situações de pressão no trabalho e cobranças com a estipulação de prazos “muito curtos” para a realização de tarefas.
"De forma genérica, percebemos (em áreas do MDH) uma pressão muito grande por trabalho com cobranças e estipulação de prazos para conclusão de projeto que seriam impossíveis de ser alcançados", relatou a procuradora.
A apuração do Ministério Público do Trabalho também registrou situações de "falas desrespeitosas, em tom mais alto (gritos), e de baixo calão" em setores do MDH. Para constatar essas situações, o MPT ouviu 18 pessoas que trabalham ou já trabalharam na pasta desde o início de investigação, no ano passado.
Saída do ex-ministro Sílvio Almeida
Apurações do MPT sobre possíveis casos de assédio moral na pasta dos Direitos Humanos começaram em setembro do ano passado, quando a ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, denunciou Sílvio Almeida, o então titular do MDH, de assédio sexual.
Diante disso, a procuradora Geny Helena Marques afirma que o MPT abriu investigação por ofício, que é quando o órgão apura determinado assunto sem necessariamente haver uma denúncia. “O objetivo era saber se a causa de assédio moral era o ex-ministro Sílvio Almeida ou se casos de assédio ocorriam, mesmo com a saída dele”, afirmou a procuradora.
Onde ocorria assédio moral
No decorrer das investigações do MPT, foi constatado que o assédio moral ocorria independentemente do ministro acusado por Anielle estar à frente da pasta. “Existem outros locais, outras secretarias dentro (do ministério), em que foram constatadas situações de assédio moral”, explicou a procuradora.

Questionada sobre quais setores específicos do ministério ocorriam situações de assédio, Geny Helena Marques afirmou que o caso ainda está em investigação.
Prevenção de assédio no trabalho
Além de buscar a responsabilidade de eventuais assediadores, a procuradora Geny Helena Marques afirmou que o objetivo das investigações do MPT na pasta de Direitos Humanos é promover ambiente saudável no trabalho e "livre de assédio para os servidores públicos". "Percebemos assédio institucional", diz
"O objetivo é cobrar que o órgão (MDH) produza ações necessárias para coibir e para prevenir situações de assédio. Quando falamos de prevenção de casos de assédio moral, dizemos que o ministério deve ter canal de denúncia dentro do órgão. Esse canal deve garantir sigilo", afirmou a procuradora.
Geny Helena acrescentou ser exigido que o órgão (MDH) apure as denúncias registradas no canal. "Essa apuração deve ser feita no tempo hábil, pois se demorarem três anos para fazer a investigação, esse ritmo não solucionará o problema do assédio no ambiente de trabalho."
Por último, a procuradora disse que o órgão (MDH) deve garantir que haja "solução" para cada caso específico de denúncia de assédio. "(Essa solução) seria uma questão repressiva. Mas eu (órgão público) tenho que fazer ações preventivas", enfatizou a procuradora do Ministério Público do Trabalho.
Um caminho para combater o assédio moral no trabalho
Especialista em diversidade, inclusão e governança corporativa Cris Kerr acredita que práticas de assédio moral em órgãos públicos devem ser combatidas com conscientização, treinamentos e capacitações. O primeiro passo, disse ela, é esclarecer à equipe — principalmente à liderança — o que são práticas de assédio moral.
"É importante trazer o que é assédio. O primeiro ponto é a conscientização. Então, se o setor de um órgão público apresenta frequentemente situações de gritos, humilhações, ou estipulação de cobranças e prazos absurdos, isso se configura assédio", afirmou Cris.
Após a conscientização de todos sobre o que são práticas de assédio moral no trabalho, a especialista em diversidade — que também é CEO da consultoria de empresas CKZ — sugere a criação de rotinas de treinamentos e de avaliações de grupo para um ecossistema saudável no trabalho.
"Uma dinâmica que fazemos nossos clientes é criar análises periódicas que avaliem desempenhos técnicos e comportamentais dos funcionários. Os dois critérios têm o mesmo peso, 50 e 50. Então, se a pessoa cumprir a parte técnica mas pecar no quesito comportamental, fazendo assédio por exemplo, ela não terá bom desempenho no teste e será chamada a atenção por isso. Nesta dinâmica, é preciso ter bons desempenhos nas duas categorias", enfatizou.
Na dinâmica apresentada por Cris Kerr, há também o papel de um funcionário/servidor responsável por fiscalizar se a equipe cumpre o que foi proposto. Ela chamou essa função de "agente transformador".

Painel mostra denúncias de assédio moral no MDH
A prática do assédio moral no MDH também é denunciada de forma anônima por meio do canal Resolveu, da Controladoria-Geral da União (CGU). O Correio apurou ter ocorrido 10 reclamações de assédio moral na pasta entre 1º de janeiro e 16 de março deste ano, de acordo com o painel.
Das 10 reclamações de assédio moral neste ano, ainda segundo o canal Resolveu, cinco foram consideradas habilitadas pela Controladoria-Geral da União. Recebem esta classificação, segundo a CGU, as reclamações que têm "elementos mínimos" para serem analisadas e encaminhadas às áreas de apuração.
O painel da CGU também mostra terem ocorrido 19 reclamações de assédio moral na pasta dos Direitos Humanos e Cidadania no ano passado. Deste total, 15 foram consideradas habilitadas e destinadas para áreas de apuração.
Das 15 reclamações de assédio moral no MDH, o painel mostra (foto abaixo) que sete foram feitas em setembro (mês que o ex-ministro Silvio Almeida saiu do cargo e a nova ministra Macaé Evaristo foi empossada).

Denúncias são investigadas, diz MDH
Em resposta ao Correio, o Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania afirmou que as denúncias de assédio moral na pasta foram encaminhadas a áreas como a corregedoria e a Comissão de Ética do Ministério para que sejam apuradas.
Além disso, diz a nota do MDH, a pasta disse ter implantado "medidas para melhorar o clima organizacional e o ambiente de trabalho". "Entre as ações em andamento, destaca-se a Política de Bem-Estar, Saúde e Qualidade de Vida no Trabalho, que inclui a oferta de atendimento psicológico aos funcionários do ministério", detalha.
Confira a nota na íntegra do Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania
"Desde o início da gestão da ministra Macaé Evaristo, todas as denúncias de assédio existentes foram devidamente encaminhadas e estão sendo analisadas pelas unidades competentes, como a Corregedoria e a Comissão de Ética do Ministério e contam com acompanhamento da Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos (ONDH) até a conclusão dos casos.
Para além do tratamento das denúncias, estamos implementando medidas para melhorar o clima organizacional e o ambiente de trabalho. Dentre as ações em andamento, destaca-se a Política de Bem-Estar, Saúde e Qualidade de Vida no Trabalho, que inclui a oferta de atendimento psicológico aos funcionários do ministério. Esse atendimento abrange acolhimento terapêutico e serviço emergencial em regime de plantão psicológico e orientação psicológica para todos os funcionários do Ministério, que demandarem o serviço.