Ataque à democracia

Ala mais "moderada" temia que Bolsonaro assinasse uma "doideira", diz Cid

Ex-ajudante de ordens contou aos investigadores na delação premiada que, após ser derrotado nas urnas, Bolsonaro foi orientado por três grupos distintos no Alvorada: um bem conservador, um moderado e outro que entendia que o ex-presidente deveria deixar o país

Além da quebra do sigilo, o STF abriu um prazo de 15 dias para que os 34 denunciados, incluindo o ex-presidente Bolsonaro, apresentem suas defesas por escrito
 -  (crédito: Evaristo Sa/AFP)
x
Além da quebra do sigilo, o STF abriu um prazo de 15 dias para que os 34 denunciados, incluindo o ex-presidente Bolsonaro, apresentem suas defesas por escrito - (crédito: Evaristo Sa/AFP)

O tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens do ex-presidente Jair Bolsonaro, afirmou que o ex-chefe do Executivo ouvia conselhos de diversos grupos sobre o plano golpista após o resultado das eleições de 2022. A informação consta documento de delação premiada, firmado com a Polícia Federal, que teve sigilo derrubado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), nesta quarta-feira (19/2). Segundo o militar, havia uma ala mais “moderada” que temia que Bolsonaro assinasse uma “doideira” — em referência a um golpe armado no país. 

Cid contou aos investigadores que, após ser derrotado nas urnas, Bolsonaro recebeu diversas pessoas, sempre no Palácio da Alvorada, de três grupos distintos. 

“Tinha um grupo bem conservador, de linha bem política; que aconselhavam o presidente a mandar o povo para casa, e colocar-se como um grande líder da oposição; que diziam que o povo só queria um direcionamento; que para onde o presidente mandasse, o povo iria; que o grupo era formado pelo Senador Flávio Bolsonaro, o AGU Bruno Bianco, Ciro Nogueira (então ministro da Casa Civil) e o brigadeiro Batista Junior (então comandante da Aeronáutica)”, diz o trecho da delação. 

Segundo Mauro Cid, o outro grupo era formado por pessoas moderadas, que apesar de não concordarem com o resultado das eleições presidenciais de 2022, entendiam que nada poderia ser feito e que, qualquer coisa em outro sentido, seria um golpe armado “que representaria um regime militar por mais 20, 30 anos. Esse grupo era totalmente contra isso e se subdividia em dois”. 

Nessa subdivisão, o primeiro grupo era composto por generais da ativa que tinham mais contato com Bolsonaro, como o general Freire Gomes; o general Arruda, chefe do Departamento de Engenharia e Construção; o general Paulo Sérgio e o general Theofilo. 

De acordo com a delação, “esse grupo temia que o grupo radical trouxesse um assessoramento e levasse o presidente Jair Bolsonaro a assinar uma ‘doideira’; que o general Freire Gomes estava muito preocupado com essa situação, com que poderia acontecer com esse pessoal que ia para o Palácio da Alvorada; que estavam preocupados com o grupo radical que estava tentando convencer o então presidente a fazer ‘alguma coisa’, um golpe”, indica. 

Cid afirmou que havia um outro grupo de moderados que entendia que o ex-presidente deveria sair do país e que ele próprio sugeriu a ida de Bolsonaro para os Estados Unidos no fim de 2022. 

Denúncia 

A Procuradoria-Geral da República (PGR) denunciou, na noite de ontem (18), o ex-presidente Jair Bolsonaro e outras 33 pessoas por estimular e realizar atos contra os Três Poderes e contra o Estado Democrático de Direito. As denúncias serão analisadas pelo relator do caso no STF, ministro Alexandre de Moraes. Os fatos foram divididos em cinco peças acusatórias. 

Eles são acusados de cometer os crimes de organização criminosa armada; tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito; golpe de Estado; dano qualificado pela violência e grave ameaça, contra o patrimônio da União, e com considerável prejuízo para a vítima; e deterioração de patrimônio tombado.

Segundo o órgão, o ex-chefe do Planalto tinha ciência e participação ativa em uma trama golpista para se manter no poder e impedir a posse do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva. A denúncia destaca um plano de assassinato contra autoridades e o apoio aos atos antidemocráticos de 8 de janeiro de 2023 como a última cartada do grupo criminoso. 

Siga o canal do Correio no WhatsApp e receba as principais notícias do dia no seu celular

Também foram denunciados o ex-ministro e ex-vice na chapa de Bolsonaro, o general Braga Netto; e o ex-ajudante de ordens tenente-coronel Mauro Cid. Ao todo, são 34 pessoas na mira da investigação. Os fatos foram divididos em cinco peças acusatórias. 

Luana Patriolino
postado em 19/02/2025 12:27 / atualizado em 19/02/2025 14:42