
A advogada e pesquisadora Lea Vidigal Medeiros, uma das autoras do livro O assassinato de JK pela ditadura: documentos oficiais, afirma que era de interesse dos militares que comandava o regime instaurado em 1964 que o ex-presidente Juscelino Kubitschek fosse morto. Lea destaca que em 1976, o líder político participava de planos para realizar a abertura democrática, o que incomodava os oficiais do regime ditatorial que governou o Brasil por 21 anos.
Informações levantadas pelas comissões da Verdade de São Paulo e de Minas Gerais vão levar o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a Comissão sobre Mortos e Desaparecidos Políticos a reabrir a investigação sobre a morte de JK, que ocorreu em 1976, quando um Opala em que ele estava supostamente se envolveu em um acidente na Rodovia Presidente Dutra, no Rio de Janeiro.
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De acordo com integrantes do governo ouvidos pelo Correio, a comissão deve se reunir nesta sexta-feira (14) e a expectativa é de que determine oficialmente a reabertura das investigações. Diligências realizadas durante o regime militar concluíram que a morte de JK foi uma fatalidade, um acidente de trânsito.
“Ele foi cassado, perseguido, foi vítima de tentativas de assassinato. O Juscelino saiu de São Paulo para o Rio em um momento em que ele estava agindo politicamente pela abertura democrática. Está também documentado que havia planos para assassinar Juscelino e havia uma preocupação da Operação Condor para eliminar oponentes. Isso tudo está no relatório”, afirma Lea.
A pesquisadora destaca que o veículo foi alvo de alterações feitas na delegacia que prejudicaram as investigações sobre as circunstâncias da morte. Mas ela destaca uma perícia realizada no automóvel que trouxe evidências de que o fato não tratou-se de um acidente. “O carro foi de encontro a uma carreta de maneira programada. O perito afirma que não tem como isso ter sido um acidente. Demoliu completamente a perícia feita pelo instituto Carlos Éboli, que era o instituto da ditadura. As evidências também mostram que a perícia da ditadura foi alterada e ocultada. Dentro do pátio da polícia eles quebraram uma lanterna do carro e depois usaram essa lanterna como causa do acidente”, ressaltou.
Rubens Paiva
Neste mês, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) determinou que a certidão de óbito dos desaparecidos no regime militar sejam alteradas para constar como morte violenta causada pelo Estado. Lea destaca que o mesmo deve ser feito com a certidão de JK, em razão de uma reparação histórica. Ela explica que nestes casos o ônus da prova se inverte e o Estado deve comprovar que não foi o autor da morte, tendo em vista que a vítima não está mais em vida para se defender.
“A vítima nunca vai conseguir provar que foi assassinada. E é o estado que tem que provar que não cometeu esse assassinato. Tem que ser alterada a causa da morte. É exatamente o mesmo caso do Rubens Paiva. A pessoa desapareceu, ela foi perseguida, torturada e desapareceu. Não tem como provar que eles mataram. É claro que no caso do Rubens Paiva tem elementos, como relatos de testemunhas. Mas o Estado tem que provar que não matou. No caso do Rubens Paiva, inverteu-se o ônus da prova. E se aplicou no caso e alterou a certidão de óbito. No caso de JK é no mesmo sentido. Agora, a Comissão de Mortos e Desaparecidos tem essa oportunidade, nesse momento, de fazer uma reparação histórica”, completa.