ANOS DE CHUMBO

Acordo extrajudicial acelera reparação a anistiados políticos

AGU firma acordo para acelerar processos nos casos de anistiados políticos. A medida visa prevenir litígios e permite que os pedidos de indenização por danos morais sejam analisados sem passar pela Justiça

A Lei n° 10.559, de 2002, estabelece as regras para ser reconhecido como anistiado político -  (crédito: Tânia Rêgo/Agência Brasil)
x
A Lei n° 10.559, de 2002, estabelece as regras para ser reconhecido como anistiado político - (crédito: Tânia Rêgo/Agência Brasil)

A Advocacia-Geral da União (AGU) firmou acordo com um escritório de advocacia do Nordeste, Vinícius Franco Advocacia e Consultoria, para permitir que pedidos de reparação por danos morais a anistiados políticos sejam analisados pela via extrajudicial. De acordo com a AGU, "o objetivo é prevenir litígios e dar celeridade aos processos de apreciação de demandas de pessoas que tiveram a condição de anistiado político reconhecida pela União".

Siga o canal do Correio no WhatsApp e receba as principais notícias do dia no seu celular

O acordo foi realizado pela Coordenação Regional de Negociação da 5ª Região, que atua em seis estados da região, com um escritório que tem dezenas de anistiados residentes ali. O termo consensual define a forma como as ações devem ingressar nas unidades do braço jurídico do Estado, os documentos necessários e o relato sobre a situação que gerou o reconhecimento de anistia. 

Atualmente, pela Lei n° 10.559, de 13 de novembro de 2002, para ser reconhecido como anistiado político é preciso enquadrar em algumas condições como por exemplo, atingidos por atos institucionais ou complementares; punidos com transferência para localidade diversa daquela onde exerciam suas atividades profissionais; punidos com perda de comissões já incorporadas ao contrato de trabalho ou inerentes às suas carreiras administrativas; ou compelidos ao afastamento da atividade profissional remunerada, para acompanhar o cônjuge. A lei também estabelece como será feita a indenização, que pode ser em prestação única ou em mensal, permanente e continuada, asseguradas a readmissão ou a promoção na inatividade.

 

De acordo com a AGU, os acordos firmados têm potencial em eliminar etapas do processo e permitir que as demandas tramitem em menos tempo e com custos menores, se comparado ao processo normal. Isso se deve ao fato de que na tramitação extrajudicial, os casos são levados a juízo somente para homologar e expedir a requisição de pagamento. 

Como funciona 

O acordo para análise extrajudicial poderá ser replicado nas Coordenações Regionais de Negociação de todo o país, segundo a AGU. Em nota, a procuradora Nacional da União de Negociação da AGU, Clara Nitão, explica que esse modelo vai beneficiar a todos. "O ineditismo do acordo firmado na 5ª região está no fato de a AGU ter criado, em entendimento com magistrados e escritórios de advocacia, um fluxo para dar celeridade aos pedidos dos anistiados políticos", destacou.

Segundo a coordenadora-regional de Negociação da 5ª Região, Katarine de Faria, "o que se pretende é justamente traçar regras e procedimentos para a fluidez do fluxo das demandas de reparação de danos morais, tendo como causa o reconhecimento da condição de anistiado político, sem que seja necessária a judicialização".

Revisão da Lei de Anistia

Para perdoar os crimes políticos realizados entre setembro de 1961 e agosto de 1979, foi aprovada a Lei da Anistia em 1979. A lei concedeu anistia a todos que cometeram crimes políticos ou conexos durante esse período. O advogado constitucional e administrativo Alessandro Soares defende que "com o advento da Constituição de 1988, tornou-se evidente que o Supremo Tribunal Federal (STF) precisaria, em algum momento, analisar a constitucionalidade dessas normas". 

De acordo com o especialista, o principal ponto a ser visto é se a interpretação que estendia a anistia aos agentes estatais responsáveis por crimes comuns, como sequestro, lesão corporal, tortura, homicídio e ocultação de cadáver é compatível com o que é previsto na Constituição. "A solução proposta pelo relator visava encerrar rapidamente o debate sobre a punição penal de agentes da repressão, priorizando a "superação" do passado por outros meios, como o acesso a documentos históricos e a garantia do direito à memória. Nas palavras do ministro Eros Grau: "É necessário não esquecermos, para que nunca mais as coisas voltem a ser como foram no passado". Para ele, o retorno ao passado seria permitido apenas para lembrar, não para punir", afirma. 

Para o advogado, essa posição do STF precisa ser ratificada devido às ações recentes contra o Estado como planos de golpe de Estado, sequestro e assassinato de autoridades, incluindo de ministro da Suprema Corte. "(Essas ações) evidenciam que a omissão de punir agentes estatais que cometeram crimes atrozes reforça a necessidade de revisão dessa postura. Vivemos, atualmente, em um contexto histórico diferente, no qual não há mais espaço para ilusões sobre o processo de conflito político. Neste cenário, torna-se imprescindível que o STF reanalise a Lei da Anistia, atribuindo-lhe uma interpretação conforme à Constituição de 1988 e garantindo o cumprimento de tratados e convenções internacionais", defende Soares.

Eduarda Esposito
postado em 09/02/2025 05:06 / atualizado em 24/02/2025 17:42