Um marco na redemocratização do país, a eleição indireta de Tancredo Neves para a Presidência da República completa 40 anos nesta quarta-feira. Durante a ditadura, os presidentes eram escolhidos em eleições indiretas pelo Colégio Eleitoral, composto por membros do Congresso e delegados das assembleias legislativas de todo o país. Em 1985, concorreram Paulo Maluf (PDS) e Tancredo Neves (do então PMDB).
Nascido em 4 de março de 1910 em São João del Rei (MG), Tancredo construiu uma sólida carreira na política. Advogado, industrial e administrador, foi vereador, deputado estadual e o relator da Constituição mineira de 1947. Também foi deputado federal e ministro da Justiça do governo de Getúlio Vargas. Disputou o governo de Minas Gerais duas vezes. Perdeu na primeira (1960) e ganhou na segunda (1982). Em 1984, foi escolhido pelo PMDB para disputar a Presidência da República.
A vitória de Tancredo foi consequência do enfraquecimento da ditadura, que viu a campanha das Diretas ganhar força e exigir nas ruas o direito do voto direto para presidente da República. "A campanha das Diretas é o ápice de todo um processo de desconstrução da ditadura que ocorre desde o fim da década de 1970. Há uma crise econômica, uma incapacidade da ditadura de se manter", relembra Deusdedith Rocha Júnior, professor de história do UniCeub.
O movimento não conseguiu seu objetivo nas eleições de 1985, mas a derrota de Paulo Maluf (PDS), candidato apoiado (em parte) pelos militares, marcou o fim do período autoritário — Tancredo recebeu 480 votos, contra 180 de Maluf, e houve 26 abstenções. Depois do fim do AI-5, em 1978, e da Lei da Anistia, em 1979, pela primeira vez, desde 1964, um civil ocuparia o cargo político mais importante do país.
Além de abrir caminho para as eleições diretas, o principal desafio do novo governo era frear a inflação que cresceu durante o regime militar — em 1985, foi de 235% ao ano.
"Ao assumir essa enorme responsabilidade, o homem público se entrega a destino maior do que todas as suas aspirações, e ele não poderá cumprir senão como permanente submissão ao povo. (...) Não celebramos, hoje, uma vitória política. Esta solenidade não é a do júbilo de uma facção que tenha submetido a outra, mas festa da conciliação nacional, em torno de um programa político amplo, destinado a abrir novo e fecundo tempo ao nosso país", dizia o discurso preparado por Tancredo Neves para sua posse, em 15 de março de 1985.
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O presidente eleito, no entanto, jamais assumiu o cargo. Adoeceu depois da eleição e sofria de fortes dores abdominais. Só foi internado em 14 de março de 1985, véspera da posse, depois de passar mal. Tancredo temia que, se fosse internado, João Figueiredo, o último general presidente da República, impediria a posse de José Sarney, seu vice.
Então senador, Sarney era malvisto por Figueiredo porque, depois de ter apoiado a ditadura, mudou de lado e filiou-se ao PMDB, em 1984. "Naquele momento, a ideia de que tudo poderia se perder era muito presente. No entanto, também devemos lembrar de fatos que são importantes. O candidato do governo que concorreu com Tancredo foi o Paulo Maluf, que não tinha apoio do próprio Figueiredo. De uma certa maneira, a desarticulação do grupo no poder era muito grande", explica Deusdedith Rocha Júnior.
Apesar dos temores de Tancredo, Sarney foi empossado no dia seguinte, em 15 de março de 1985. Tancredo ainda ficou mais de um mês internado e foi submetido a diversas cirurgias antes de ser declarado morto em 21 de abril daquele ano, sob uma forte comoção nacional. Apesar de não ter assumido o cargo, uma lei de 1986 o colocou na "galeria dos que foram ungidos pela Nação brasileira para a Suprema Legislatura". Em 2022, foi declarado Patrono da Redemocratização brasileira, por lei aprovada pelo Congresso e sancionada pelo então presidente Jair Bolsonaro (PL).
José Sarney governou por cinco anos em um período marcado pela hiperinflação, que chegou a ultrapassar os 80% ao mês. Em 15 de março de 1990, passou a faixa presidencial a Fernando Collor de Mello (PRN) — escolhido presidente em eleições diretas um ano antes —, o que marcou o fim do período de transição democrática. Collor viria a sofrer impeachment dois anos depois.
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