Um dia após Nicolás Maduro tomar posse para o terceiro mandato à frente do Palácio de Miraflores, o Ministério das Relações Exteriores (MRE) condenou as atitudes do governo da Venezuela contra membros de outros partidos. "O governo brasileiro acompanha com grande preocupação as denúncias de violações de direitos humanos a opositores do governo na Venezuela, em especial após o processo eleitoral realizado em julho passado", diz nota divulgada pelo Itamaraty.
Siga o canal do Correio no WhatsApp e receba as principais notícias do dia no seu celular
Apesar de ter assumido o governo venezuelano para um novo mandato de seis anos, Maduro inicia a nova gestão pressionado por uma série de outros países, tanto na América Latina quanto no resto do mundo. O governo do sucessor de Hugo Chávez vem recebendo acusações sobre ter fraudado o processo eleitoral contra o opositor Edmundo González no Conselho Nacional Eleitoral (CNE) — órgão que coordena as eleições no país. Após a posse, o governo dos EUA prometeu pagar US$ 25 milhões (cerca de R$ 152 milhões) pela captura do líder venezuelano.
No dia em que tomou posse para um novo mandato, o presidente decidiu fechar as fronteiras do país com a Colômbia e o Brasil. O Itamaraty confirmou o fechamento das fronteiras e aconselhou que "em caso de emergência, cidadãos brasileiros poderão acionar os plantões consulares da Embaixada do Brasil em Caracas". Ao Correio, o Itamaraty reforçou que o atendimento para casos emergenciais envolvendo brasileiros está sendo realizado pelos telefones da Embaixada.
Saiba Mais
Na nota desta sábado, o MRE subiu o tom contra o regime de Maduro e escreveu que "deplora os recentes episódios de prisões, de ameaças e de perseguição a opositores políticos", apesar de ter reconhecido que houve "gestos de distensão" do governo venezuelano, como a liberação de 1,5 mil presos nos últimos meses e a reabertura do Escritório do Alto Comissário de Direitos Humanos das Nações Unidas na capital do país.
O Itamaraty indica ainda que, para manter a vigência de um regime democrático, é fundamental garantir direitos elementares a líderes da oposição a "manifestar-se pacificamente com liberdade e com garantias à sua integridade física". "O Brasil exorta, ainda, as forças políticas venezuelanas ao diálogo e à busca de entendimento mútuo, com base no respeito pleno aos direitos humanos com vistas a dirimir as controvérsias internas", completa.
Relação tensa
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva é um aliado histórico de Nicolás Maduro e do regime chavista na Venezuela. No entanto, desde o processo eleitoral do ano passado, a relação entre os dois foi marcada por diversos atritos, como uma postagem em novembro do ano passado feita pela polícia nacional do país, em tom de ameaça a Lula: "Quem se mete com a Venezuela, se dá mal".
Para o cientista político e sócio da Hold Assessoria, André César, Lula entendeu que Maduro não é um amigo confiável e que o alinhamento histórico pode também estar sendo rompido, devido a essa falta de confiança nas ações do líder venezuelano. "Eu vejo que há um custo político para você manter relações plenamente normais com a Venezuela. O Maduro está ficando isolado na comunidade internacional, então, o Brasil também vai ter muita cautela a partir de agora, neste novo mandato do Maduro", considera.
Repercussão
Na avaliação do cientista político Carlo Eduardo Novato, o governo Lula deve manter um tom de pragmatismo com relação ao caso da Venezuela. "Com o último gesto, Lula dá mais um passo em direção a um isolamento político da Venezuela, mas ainda não chegou o momento, tanto que o governo brasileiro mandou representante para o evento de posse. Vale destacar que a experiência do governo brasileiro de reconhecer Juan Guaidó como presidente interino no passado mostrou-se um passo maior que a perna, que não alcançou respaldo em outras iniciativas por parte do Brasil", analisa.
Lula permitiu o comparecimento da embaixadora brasileira em Caracas, Gilvânia Maria de Oliveira, ao evento de posse de Maduro, representando o governo federal. O PT enviou quatro representantes à cerimônia, enquanto que o Movimento dos Trabalhadores Sem-Terra (MST) foi representado por cinco integrantes.
Apesar de ainda haver um alinhamento nítido entre o PT e o regime chavista, Lula prefere manter um tom pragmático, em conformidade aos conselhos do próprio Itamaraty. "A postura do Lula, como Presidente, foi de seguir a orientação dos órgãos de assessoramento do governo. Nesse sentido, é simplista achar que houve "mudança de postura". Por outro lado, antes de o Itamaraty orientar certo distanciamento, o Lula mantinha o que o PT entende sobre o regime Maduro", avalia o sócio da Fatto Inteligência Política Rafael Favetti.