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Moraes avisa a Zuckerberg que redes funcionarão sob as leis

Advertência do ministro vem no dia seguinte ao bilionário, que é dono da Meta, insinuar que o Supremo Tribunal Federal censura publicações nas plataformas. MPF dá 30 dias para empresa explicar nova orientação

Ministro advertiu que o Supremo não permitirá que as redes sejam instrumentalizadas por grupos extremistas interessados em disseminar o ódio -  (crédito: Marcelo Camargo/Agência Brasil)
Ministro advertiu que o Supremo não permitirá que as redes sejam instrumentalizadas por grupos extremistas interessados em disseminar o ódio - (crédito: Marcelo Camargo/Agência Brasil)

Depois de Mark Zuckerberg, dono da Meta — que controla o Instagram e o Facebook, além do aplicativo e mensagens WhatsApp —, ter insinuado que o Supremo Tribunal Federal censura publicações nas redes sociais, ontem foi a vez de o STF deixar claro que as plataformas só funcionarão no país se "respeitarem a legislação brasileira". O recado foi dado pelo ministro Alexandre de Moraes, que está à frente do inquiérito das fake news, que tramita na Corte.

"Nossa Justiça Eleitoral e o nosso STF já demonstraram que aqui é uma terra que tem lei. As redes sociais não são terra sem lei. No Brasil, (as redes sociais) só continuarão a operar se respeitarem a legislação brasileira, independentemente de bravatas de dirigentes irresponsáveis das big techs", avisou Moraes.

O ministro também criticou os dirigentes das plataformas, afirmando que "por terem dinheiro acham que podem mandar no mundo". "Pelo resto do mundo não podemos falar, mas, pelo Brasil, tenho absoluta certeza e convicção de que o STF não vai permitir que as big techs, as redes sociais, continuem sendo instrumentalizadas, dolosa ou culposamente. Ou ainda, somente visando o lucro, para ampliar discursos de ódio, nazismo, fascismo, misoginia, homofobia e discursos antidemocráticos", salientou.

A advertência de Moraes foi em uma roda de conversa, promovida pelo STF, para lembrar os dois anos dos ataques golpistas de 2023 — que culminaram na depredação dos prédios dos Três Poderes. Na avaliação do ministro, esse e outros gestos de cunho golpista foram impulsionados pela falta de regulamentação das redes.

Regulamentação

No mesmo evento, o ministro Gilmar Mendes defendeu a regulamentação das redes e afirmou que a criação de normas "não pode ser confundida com censura". "Essa trajetória normativa jamais poderá ser confundida com censura. Muito pelo contrário: representa não apenas uma evolução jurídica, mas constitui a pedra angular sobre a qual se erige uma esfera digital democrática e pluralista, capaz de harmonizar a liberdade de expressão com a responsabilidade social no ambiente virtual", observou.

Zuckerberg anunciou, na terça-feira, que a ferramenta de checagem do grupo Meta será substituída por "notas da comunidade", livre a todos os usuários. Disse, ainda, que existem tribunais secretos em países latino-americanos para censurar conteúdo — uma insinuação sobre a atuação do STF, que, em 2024, sustentou e ganhou uma queda de braço com o bilionário Elon Musk, cuja plataforma X (antigo Twitter) descumpriu uma série de determinações judiciais. A rede só voltou a operar depois de cumprir as normas impostas por Moraes e pagar uma multa milionária.

O Supremo recebeu, ontem, quatro obras de arte produzidas com material da destruição das instalações do prédio da Corte. Foram produzidos por Valério Pena-Costa, Carppio de Morais, Marilu Cerqueira e Mário Jardim, todos do Distrito Federal. As peças foram entregues ao ministro Edson Fachin, presidente em exercício do tribunal.

Messias: "Não vamos cruzar os braços"

Em reação à decisão da Meta, o advogado-geral da União, ministro Jorge Messias, disse, ontem, que o Brasil tem mecanismos legais para lidar com a desinformação. Segundo o AGU, o governo não permitirá que a internet se torne um espaço desregulado.

"Aqui não é terra sem lei, obviamente. Nosso ordenamento jurídico oferece anticorpos para combatermos desordem informacional. Portanto, não vamos ficar de braços cruzados", disse. Para ele, a nova posição da Meta "enfatiza a necessidade de uma conclusão no julgamento sobre a responsabilidade das redes sociais pelo Supremo Tribunal Federal" — que está 3 x 0 para punir a plataforma que não se incumbir do conteúdo que leva ao ar.

O futuro ministro da Secretaria de Comunicação Social (Secom), Sidônio Palmeira, também comentou a mudança de postura pela Meta. Ele afirmou que remover o serviço de checagem de conteúdo é "ruim para a democracia", pois reduz o controle da desinformação.

Sidônio também defendeu a regulamentação das redes sociais no Brasil. Destacou que o governo e a Justiça brasileira podem adotar outra posição para garantir a integridade da informação, caso isso seja descumprido por Instagram, Facebook, Threads ou WhatsApp — plataformas que fazem parte da Meta. Isso representaria que o Brasil, por ser "um país autônomo e independente", pode ter suas próprias regras sobre o tema.

"Isso é ruim para a democracia, porque você não faz o controle da proliferação de ódio, da desinformação, das fake news. Esse é o problema a gente precisa ter um controle. É preciso ter uma regulamentação das redes", comentou Sidônio, no evento em memória dos dois anos dos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023, no Palácio do Planalto.

Trinta dias para dar explicações

O Ministério Público Federal oficiou, ontem, a Meta a prestar explicações, em até 30 dias, sobre os impactos das novas regras de checagem de informações. O grupo afirmou que, a princípio, as mudanças ocorreriam somente nos Estados Unidos. No entanto, o MPF quer que a big tech responda a questionamentos sobre uma possível aplicação dessas mudanças no Brasil e suas consequências.

Caso a plataforma confirme que o abrandamento do serviço de checagem será aqui aplicado, o MPF buscará também duas respostas: 1) quando essas políticas serão implementadas; e 2) mais esclarecimentos a respeito das mudanças, a fim de avaliar quais ações podem "impactar direitos dos usuários" brasileiros.

Assinado pelo procurador Yuri Corrêa da Luz, o ofício à Meta salienta que "já existe um arcabouço normativo hoje vigente no Brasil, que impõe deveres, aos responsáveis por provedores de aplicação que operam em nosso país, de adotar providências a fim de que seus produtos e serviços não afetem, estruturalmente, direitos fundamentais de nossos cidadãos e nossas cidadãs".

No mesmo documento, ele quer que a Meta informe as mudanças que eventualmente possam ser feitas no país, especificando a partir de quando o rompimento com as agências de checagem acontecerão. Indaga, ainda, quantas agências deixarão de trabalhar na moderação de conteúdo. E quer saber mais dois fatores: que violações praticadas nas plataformas serão consideradas "graves" e que "restrições em temas como imigração e gênero que são objeto de frequentes discursos políticos e debates" serão excluídas.

Procurada pelo Correio, a Meta não quis se pronunciar.

 

 

 

 

 

Luana Patriolino
postado em 09/01/2025 03:55
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