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Economia promete ser "pedra no sapato" do governo Lula em 2025

A pressão do mercado por cortes de gastos, a alta da Selic e a perspectiva de aumento da inflação são os principais desafios da gestão petista

Lula e Haddad ensaiaram tom conciliador entre governo e mercado no fim do ano em vídeo com o presidente do BC, Gabriel Galípolo -  (crédito: YouTube/Reprodução)
Lula e Haddad ensaiaram tom conciliador entre governo e mercado no fim do ano em vídeo com o presidente do BC, Gabriel Galípolo - (crédito: YouTube/Reprodução)

Com o dólar em patamares altos e incertezas sobre a saúde das contas públicas, o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva terá novamente na economia uma de suas principais preocupações. As pressões do mercado financeiro por cortes de gastos, o alto patamar da taxa básica de juros (a Selic está em 12,25%, com alta programada para 14,25% até março) e a perspectiva de aumento da inflação são alguns dos principais desafios que o governo precisará vencer neste ano se quiser cumprir a promessa de fazer de 2025 o “ano da colheita”, como prometido por Lula.

O petista disse no fim do ano passado que as medidas já tomadas em sua administração atual começarão a dar resultados de forma mais impactante. “Lançamos todos os programas que tinham que ser lançados e tenho dito aos meus ministros: nós já plantamos. Agora, 2025 é o ano da colheita. Vamos começar a colher o que plantamos. É um compromisso de honra meu. As coisas vão acontecer nesse país”, declarou em entrevista ao programa Fantástico, da TV Globo.

Até o momento, Lula conquistou avanços importantes em indicadores que afetam diretamente a população — e, consequentemente, sua aprovação. O desemprego atingiu o menor valor da série história no trimestre terminado em novembro, de 6,1%. A projeção do Banco Central (BC) para o crescimento do PIB em 2024 é de 3,5%, e a renda média e a massa salarial apresentam crescimento. Porém, como admitiu o próprio BC, a inflação vai estourar a meta estabelecida de 3%, com tolerância de um ponto percentual e meio para baixo ou para cima. A expectativa é de que a taxa atinja 4,9% no Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) — o máximo permitido pela meta é 4,5%.

O governo enfrentou uma onda de pessimismo nos mercados no segundo semestre. Em parte pela vitória de Donald Trump (Republicanos) nos Estados Unidos, com promessa de adotar políticas mais protecionistas — que, por consequência, podem sair caras ao Brasil — e em parte pela demora na definição, por parte do Executivo, do pacote de corte de gastos, que levou semanas para ser apresentado. No fim, as medidas de ajuste, anunciadas em cadeia de rádio e TV pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, foram vistas como fracas por parte dos analistas do mercado.

Outra questão alimentou o pessimismo e a paranoia do mercado: junto com as medidas de cortes, Haddad também anunciou a intenção do governo de cumprir a promessa de campanha de isentar de Imposto de Renda quem ganha até R$ 5 mil por mês.

Embora o ministro tenha deixado claro no anúncio que essa renúncia de arrecadação seria bancada pela taxação de quem ganha mais, diversos operadores do mercado financeiro reclamaram da falta de explicação sobre como a medida seria financiada. Isso, somado à desidratação do pacote de corte de gastos no Congresso, ajudou a elevar o valor do dólar.

Segundo Davi Lelis, da Valor Investimentos, o anúncio “desceu quadrado” porque o mercado entendeu que o governo estava tentando dourar a pílula dos cortes de gastos anunciando uma medida popular. Com isso, perdeu a chance de se posicionar enfaticamente a favor da responsabilidade fiscal. “Pareceu que o governo estava fazendo palanque quando deveria estar endereçando de maneira mais séria o compromisso com a responsabilidade fiscal. O mercado enxergou isso como falta de compromisso”, pontua. Lelis também diz que taxar quem ganha mais para bancar a isenção pode resultar em saída de capitais do país. Na prática, quem será mais taxado vai preferir levar seus recursos para fora do Brasil, o que pode pressionar ainda mais o dólar.

Essa medida não deverá sair do papel nos primeiros meses do ano, já que o Congresso tem outras prioridades, mas o assunto vai interferir na percepção do mercado das contas públicas, uma vez que o plano do governo é colocar a isenção em prática a partir de 2026. O plano de compensar a renúncia de arrecadação com a taxação de quem ganha mais também causa preocupação no mercado.

“Não seria tão ruim se ele conseguisse compensar essa isenção fiscal com essa taxação dos mais ricos. Mas no mundo a gente já viu o que acontece quando a gente tenta aumentar a taxação dos mais ricos, é muito difícil fazer isso sem ter uma fuga de capitais”, afirma Davi Lelis. Para o especialista, o governo deveria tentar se aproximar dos agentes do mercado financeiro e evitar reverberar o discurso de aliados que acusam os investidores de “especular em cima da população”. “Quando o governo e o mercado andam juntos, a prosperidade se torna coletiva”, afirma.

Turbulências à frente

Com a sensação de dúvida sobre a responsabilidade fiscal e a perspectiva de taxas maiores para quem ganha mais, a tendência é de que o dólar continue em patamares elevados em 2025. No fim de 2024, o cenário externo e a incerteza sobre o pacote de corte de gastos levou a moeda norte-americana ao seu maior patamar nominal na história. Fechou o ano cotada a R$ 6,18.

O dólar só ensaiou uma queda quando, em 11 de dezembro, piscou nos monitores de analistas de investimentos a notícia de que o já hospitalizado presidente Lula precisaria fazer uma nova cirurgia. Nesta data, a moeda norte-americana fechou abaixo dos R$ 6 pela primeira vez desde 28 de novembro.

A economista e professora da Fundação Getulio Vargas (FGV) Carla Beni avalia que a sinalização geral não é boa para 2025, e que o governo terá dificuldade para avançar em sua agenda política — por exemplo, a expansão de programas sociais voltados à população de menor renda. Além disso, o mercado financeiro deve manter a pressão por mais cortes de gastos.

“A gente vai atingir um patamar que nunca foi atingido, pelo menos na história recente, de 9% ao ano de taxa real de juros. Isso dá uma contração muito grande na economia, aumento na contração de renda e traz grande dificuldade para o pequeno, médio empresário, e para quem quer pegar dinheiro e investir no mercado financeiro. Ou seja, pode haver contração do PIB via taxa Selic”, avalia a economista.

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A redução no ritmo do crescimento real do salário mínimo, que ficou limitado a até 2,5% por ano, é outro fator apontado pela professora que irá frear a recuperação do poder de compra nos próximos anos. Para Lula, o cenário que se desenha deve prejudicar sua plataforma de governo em um ano crucial. Historicamente, há um aumento no gasto público em anos pré-eleitorais, como 2025, e chegar ao ano da eleição com resultados robustos pode ser a diferença entre se reeleger ou deixar o cargo.

“O grande dilema é político, que já se viu forte neste ano que passou, mas deve se acirrar. Usando as palavras do presidente, é ‘colocar o pobre no orçamento’. Quando se faz isso, você melhora a qualidade de vida dessa população. Mas a sinalização para o ano que vem, com inflação de custo, retração da economia, com a Selic, e a diminuição na correção do salário mínimo vai de encontro com a plataforma com a qual o presidente foi eleito”, diz a economista. “A sinalização é de retirada do pobre do orçamento”, acrescenta ainda.

Os juros altos podem prejudicar, ainda, a rolagem da dívida pública do país, assim como dificultar a vida de empresas e pessoas físicas com dívidas altas. “Teremos um período de juros mais altos em 2025. Ou seja, quem está alavancado, aquelas pessoas e empresas que têm dívidas maiores vão sofrer mais. Ninguém esperava que a gente fechasse 2024 com 12,25% de juros. As perspectivas mais pessimistas eram de 9 ou 9,5%. E a gente entra em 2024 com perspectiva de 14%, que é basicamente o nível da Dilma (Rousseff)”, avalia Davi Lelis, da Valor Investimentos.

Nos dois primeiros anos do governo, Lula conseguiu entregar resultados acima das expectativas do mercado, especialmente no crescimento do PIB. No início de 2024, investidores previam alta de 1,5%, contra os 3,5% que devem ser alcançados. Em 2023, as previsões iniciais eram de 0,8%, em comparação com os 3,2% atingidos ao final do ano. Há espaço, portanto, para que o petista reverta o cenário. Porém, o presidente começa 2025 com mais desafios do que nunca.

Victor Correia
Israel Medeiros
postado em 05/01/2025 03:55
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