Depois de um dia intenso de debates e articulações, a Câmara encerrou o expediente, nesta quarta-feira, sem votar os dois últimos textos do pacote de corte de gastos do governo. Até terça-feira, o combinado entre o governo e o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), era apreciar primeiro o PLP 210, que, entre outras coisas, previa o bloqueio de emendas parlamentares. O projeto foi aprovado. Em seguida, iria o PL 4.614, que tem os pontos de maior divergência, como as mudanças no Benefício de Prestação Continuada (BPC) e no Fundo Constitucional do Distrito Federal. Por último, votar a PEC 45 de 2024, que foi apensada à PEC 31 de 2007 para tramitar mais rápido.
Com a dificuldade de se chegar a um acordo sobre o BPC, o Fundo Constitucional e o Proagro, Lira colocou a PEC para votar antes do PL. Leu uma decisão no plenário justificando o apensamento do texto e rejeitou sistematicamente as questões de ordem (quando deputados apontam eventuais problemas ou descumprimentos ao rito de tramitação e de votação) levantadas por parlamentares da oposição para tentar barrar a votação do pacote de gastos.
Ficou claro, ao longo das votações "prévias" — houve uma apreciação de retirada de pauta, outra que pedia o fim da discussão e uma terceira, que votava a preferência pelo novo texto que foi apensado —, que o governo não tinha os 308 votos necessários para aprovar a PEC.
Lira, então, encerrou a sessão às 23h34 e convocou outra para esta quinta-feira, às 10h, que deve começar com a proposta de emenda constitucional, que tem como um dos principais pontos o fim dos supersalários.
Após dias de lobby intenso nos corredores da Câmara e de pressões públicas por parte de integrantes do Judiciário, o relator do texto, deputado Moses Rodrigues (União Brasil-CE), resolveu flexibilizar o trecho que trata do assunto. Ele incluiu que as limitações dos supersalários deverão ser regulamentadas via lei complementar.
Na prática, isso dá mais tempo aos setores interessados para fazer pressão e evitar que sejam atingidos pelas limitações. Também permitiria, por exemplo, que resoluções do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), no caso do Judiciário, se sobrepusessem à lei aprovada sobre o assunto. O texto da PEC 45 foi apensado por Lira ao da PEC 31 de 2007, para acelerar a tramitação e evitar que a matéria passasse por comissões.
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Além da oposição, o PSol se posicionou contra a proposta e contra o pacote de corte de gastos como um todo, especialmente no que diz respeito ao BPC. "É uma PEC que está sendo apensada a uma outra de 2007. Nem sequer houve uma comissão especial com tempo para que os parlamentares pudessem opinar sobre ela. E, mais importante, que a sociedade pudesse conhecer do que se trata", disse a deputada Sâmia Bomfim (PSol-SP), que também questionou o restante das medidas do corte de gastos.
O discurso foi similar ao adotado pela oposição. "Um projeto como esse, que mexe no BPC, no Fundeb, no abono salarial, e usa o Judiciário como boi de piranha, porque tem um projeto para regular salários lá no Senado... (...) O dólar está a R$ 6,30, e o ministro (da Fazenda) só quer taxar, só quer retirar benefícios da população. Uma insegurança no país, e investimento sai do Brasil, aumentando o dólar, causando prejuízo aos brasileiros", disse o líder do PL, Altineu Côrtes (PL-RJ).
O posicionamento do PSol irritou o líder do PT, José Guimarães (PT-CE), que foi ao microfone para reclamar do que chamou de "falta de solidariedade dos companheiros da esquerda" com o projeto de governo do presidente Lula. "Essa PEC é o resultado de um trabalho feito e de um diálogo com toda a Casa, com todos os líderes e com todos aqueles que têm responsabilidade no país. A oposição está no direito dela de querer derrotar o governo do presidente Lula, querer que as coisas não deem certo", frisou. "Mas aqui é preciso, e eu quero chamar a atenção dos companheiros do PSol, porque esse é o debate político que nós temos que fazer neste momento. Eu entendo a oposição, que quebrou o Brasil, entregou o Brasil falido, meteu a mão nos cofres públicos para ganhar a eleição. Mas a esquerda tem responsabilidade com o projeto liderado pelo presidente Lula."
Guimarães continuou: "Estou, me desculpe a franqueza, incomodado porque companheiros da esquerda ocupam os microfones para fazer o jogo da direita aqui dentro, que tem o objetivo principal de tentar derrotar o presidente. O país precisa desse ajuste. Nós não vamos retirar nenhum direito, nem dos aposentados, muito menos daqueles que dependem do BPC".
Resistência
Ao longo de toda a quarta-feira, representantes de diversos setores circularam pela Câmara abordando deputados para tentar sensibilizá-los sobre as mudanças no BPC, que foi o maior ponto de resistência ao texto durante as articulações, segundo deputados que participaram das conversas.
Representantes das forças de segurança do Distrito Federal e do governo do Distrito Federal também estiveram na Casa para fazer pressão contra a mudança no Fundo Constitucional. A vice-governadora do Distrito Federal, Celina Leão (PP), também foi à Câmara depois de participar do evento Entre os eixos do DF: O Fundo Constitucional do Distrito Federal, organizado pelo Correio.
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