Atividade não regulamentada e repleta de estigmas, o lobby tem assumido uma forma própria, independentemente da legislação. Especialistas nas relações entre determinados grupos e instituições e governos, esses profissionais têm sido cada vez mais procurados por empresas, segundo pesquisas recentes. A sexta edição do Anuário Origem América Latina, divulgada no mês passado, mostra que 56,1% das empresas que participaram da publicação têm cinco ou mais lobistas em sua equipe — expansão de 31,6% se comparado a 2019. Para o responsável pela publicação, Rodrigo Navarro, a maior atuação de profissionais de Relações Institucionais e Governamentais (RIG) é positiva. "É uma evolução consistente e crescente do número de pessoas dedicadas a essa área. Isso é um sinal muito positivo", comenta.
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A pesquisa recebeu dados e percepções de 434 líderes qualificados da área de RIG e apresenta o perfil do setor atualmente. Segundo o estudo, a participação das empresas com vendas acima de R$ 1 bilhão teve a média mais alta já registrada, de 79,4%. Os participantes que atuam em companhias com orçamento direcionado para RIG superior a R$ 10 milhões somaram 12,3% — indicador mais alto desde o início da pesquisa. Empresas que destinam entre R$ 5 milhões e R$ 9,9 milhões para essa atividade totalizam outros 12,3%. "Esses dados refletem a importância dada para essa atividade por essas empresas, que naturalmente percebem a importância de um ambiente regulatório favorável para as suas operações, para o país, e com isso, investem mais nessa área. Mas isso não é exclusivo do Brasil. Nos Estados Unidos, por exemplo, a atividade de relações governamentais foi demandada, só no lobby federal, em mais de US$ 4 bilhões apenas em 2023", ressalta Navarro.
O anuário revela, ainda, o crescimento da participação feminina. Em 2024, as mulheres representaram 43% desse contingente. Em 2019, eram 31,5%. Sobre a formação acadêmica dos lobistas, o Origem informa que grande parte tem formação na área jurídica (42%), seguida por administração (14,8%) e relações internacionais (12,8%).
Regulação pendente
Existem três projetos de lei sobre a regulação do lobby no Brasil: o PL nº 6.132/1990, o PL nº 1.202/2007 e o PL nº 4.391/2021, nenhum aprovado até hoje. A fim de preencher essa lacuna legislativa, a Associação Brasileira de Relações Institucionais e Governamentais (Abrig) atua em favor da regulamentação do setor, da capacitação dos lobistas e da orientação para boas práticas. A entidade criada em 2007 conta com 400 profissionais associados e 35 empresas de vários setores.
No exterior, diversos países, como Austrália, Canadá, Chile, Eslovênia, Estados Unidos da América (EUA), França, Hungria, Israel, Lituânia, Peru, Polônia, Taiwan, Ucrânia e também a União Europeia (Parlamento Europeu) aprovaram uma regulação para a atividade. Essa medida ocorre para tornar público o relacionamento entre os lobistas e os tomadores de decisões, especificar como essa interação deve ser feita e criar um órgão especializado para o registro dos profissionais.
Para a coordenadora do MBA em Relações Governamentais da Fundação Getulio Vargas (FGV), Andréa Cristina Oliveira Gozetto, um dos empecilhos na regulamentação do lobby no Brasil seria o desinteresse do atual governo. Ela vê problemas nas três propostas apresentadas, mas acredita que "alguma regulação é melhor do que nenhuma". "Há um estigma de marginalidade muito forte sobre a atividade. Então, se houver essa regulamentação, você, de certa forma, dá mais legitimidade", explica.
Tharlen Nascimento, 31 anos, é advogado e atua com lobby desde 2014. Ele considera que o mercado está em alta em diversos setores. "Somos intermediários com o poder público, com o objetivo de influenciar decisões políticas e regulatórias", destaca. Carol Lacerda, 37 anos, só descobriu que atuava na área de RIG quando foi fazer um MBA. Antes de adquirir consciência do que estava fazendo, passou seis anos defendendo o interesse de uma companhia energética estadual.
"Na entrevista para fazer o MBA, descobri que sempre fiz relações governamentais", relata Lacerda. Ela afirma que sua atividade profissional traz benefícios não apenas para o contratante, mas para a sociedade. "Um profissional que trabalha com lobby vai trabalhar com a representação e a defesa de interesses para formulação de políticas públicas, em que o privado possa cooperar para que ela funcione, e seja algo viável de ser cumprido", acrescenta.
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