Atos antidemocráticos

A ação de Mauro Cid na manipulação dos acampamentos golpistas

Diálogos recuperados pela PF entre ajudante de ordens do ex-presidente e bolsonaristas mostram atuação que teve para manter radicais mobilizados nas ruas. Tenente-coronel era o elo entre os extremistas e o Palácio do Planalto

Ex-ajudante de ordens de Bolsonaro era o elo entre os golpistas nos acampamentos e o Palácio do Planalto -  (crédito:  Ed Alves/CB/DA.Press)
Ex-ajudante de ordens de Bolsonaro era o elo entre os golpistas nos acampamentos e o Palácio do Planalto - (crédito: Ed Alves/CB/DA.Press)

Mensagens interceptadas pela Polícia Federal (PF) apontam que o tenente-coronel Mauro Cid, ajudante de ordem do ex-presidente Jair Bolsonaro, atuou para manter manifestantes que defendiam o golpe militar em frente a quartéis do Exército. Os diálogos foram anexados ao inquérito, em curso no Supremo Tribunal Federal (STF), que apura tentativa de golpe de Estado.

Em 15 de dezembro de 2022, de acordo com os documentos, Cid recebeu uma mensagem de um tenente do Exército afirmando que a Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF) poderia realizar uma operação para retirar manifestantes da frente do Quartel General do Exército, no Setor Militar Urbano, em Brasília. O ajudante de ordens de Bolsonaro questiona se a ação seria realmente da PMDF ou da PF, e recebe a resposta de que seria uma ação da Polícia Militar.

Em 19 de novembro, um tenente-coronel de Caxias do Sul (RS) pergunta a Cid sobre o que deveria fazer em relação a uma recomendação do Ministério Público Federal (MPF) que pedia a desmontagem do acampamento em frente ao quartel da região. O tenente-coronel afirmou que a solicitação deveria ser ignorada.

"Tá recomendado... manda se foder! Recomenda... está recomendado. Obrigado pela recomendação... Eles não podem multar. Eles não podem prender. Eles não podem fazer porra nenhuma. Só vão encher o saco, mas não vão fazer nada, não", disse Cid, em mensagem de áudio.

As mensagens foram recuperadas do celular de Cid, apreendido pela PF por ordem do ministro Alexandre de Moraes.

Outros diálogos entre o ex-ajudante de ordens e um amigo de Bolsonaro mostram que, até o final de dezembro de 2022 — quando o ex-presidente decidira fugir para os Estados Unidos —, ainda ocorria a articulação golpista. Em uma das conversas, Cid dialoga com Aparecido Portela, militar apontado como um amigo próximo de Bolsonaro. A PF aponta que ele frequentou o Palácio da Alvorada diversas vezes, no último mês de 2022. A última visita, de acordo com informações enviadas pelos investigadores ao STF, ocorreu à véspera de Natal daquele ano.

"O pessoal que colaborou com a carne está perguntando se ainda vai ter churrasco", indaga Portela, referindo-se à tentativa de golpe de Estado. "Pois estão colocando em dúvida minha atuação", diz a Cid.

O tenente-coronel responde: "Vai, sim! Ponto de honra. Nada está acabado ainda de nossa parte", garante.

Em 31 de dezembro de 2022, de acordo com a PF, Portela liga para Cid, mas ele já estava no voo com Jair Bolsonaro rumo aos EUA. O ex-ajudante de ordens responde por mensagem. "O PR (presidente) estava com a decisão mais importante da nossa história. A guerra ainda não acabou".

Para a PF, as conversas deixam clara a participação de Cid no golpe e que Bolsonaro sabia da construção da estratégia para a ruptura institucional.

Clamor pela anistia

Em entrevista na noite de quinta-feira à revista Oeste, o ex-presidente fez um clamor para que haja uma anistia aos golpistas do 8 de janeiro de 2023. "Para nós pacificarmos o Brasil, alguém tem de ceder. Quem tem de ceder? E o senhor Alexandre de Moraes. Anistia. Em 1979, eu não era deputado, foi anistiada gente que matou, que soltou bomba, que sequestrou, que roubou, que sequestrou avião. Vamos pacificar, zera o jogo daqui para frente. Se tivesse uma palavra do Lula ou do Alexandre de Moraes no tocante à anistia, estava tudo resolvido", exortou. Mas, em entrevista ao Wall Street Journal, o tom foi outro. "(Donald) Trump está de volta, e é um sinal de que nós também voltaremos", acredita Bolsonaro, apesar da inelegibilidade até 20230. O ex-presidente crê até que o futuro presidente norte-americano poderia impor sanções ao Brasil "para apoiá-lo".

 

postado em 30/11/2024 03:55
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