A Polícia Federal reconstitui os passos de Francisco Wanderley Luiz, 59 anos, até o dia do atentado na Praça dos Três Poderes a fim de determinar se ele tem conexões com grupos extremistas, que se conectam e trocam informações na deepweb. Para a PF, está claro que o bolsonarista há tempos se preparava para realizar um ataque ao Supremo Tribunal Federal (STF), porém resta saber se estava agindo sozinho ou contava com o auxílio de outras pessoas. Uma das pistas virá da quebra dos sigilos telefônico, fiscal e telemático que a PF pedirá à Justiça nos próximos dias — os investigadores acessaram o celular de Francisco.
Pela perícia no aparelho, pretende-se identificar quem eram os interlocutores do extremista e se estavam cientes do ataque. Um dos objetivos é verificar se o bolsonarista mantinha relações políticas, tanto em Brasília quanto em Santa Catarina, seu estado natal.
Os peritos analisam os históricos de buscas e mensagens. A extração das informações foi feita por meio de um software de última geração. Outros bens apreendidos, incluindo um trailer carregado com explosivos, também estão sendo periciados.
O homem, porém, deixou um rastro que leva à preparação do atentado. Além das mensagens ameaçadoras registradas num aplicativo, duas imagens que vieram à tona, ontem, o mostram em situações suspeitas: uma, ao comprar fogos de artifício em uma loja em Ceilândia, onde estava morando e em cuja casa os policiais detonaram bombas prontas a saerem detonadas; outra, mostra que horas antes das explosões próximas ao STF, ele esteve na Câmara dos Deputados — é possível vê-lo vestindo chapéu e sandálias de tira.
R$ 1,5 mil em fogos
Francisco gastou pouco mais de R$ 1,5 mil em fogos de artifício, em 5 e em 6 de novembro. Imagens do circuito de segurança mostram-no fazendo uma primeira compra de R$ 295. No dia seguinte, ele retornou ao local e desembolsou mais R$ 1.250. Segundo o dono da loja, Fernando Barramansa, o extremista argumentou que precisava de algo mais poderoso para um evento que estava promovendo.
De acordo com Barramansa, o bolsonarista não estacionou em frente a loja, como é habitual da clientela. Além disso, percebeu que ele parecia nervoso. As duas compras foram pagas com cartão de débito e Francisco rejeitou a emissão de nota fiscal — pela qual o comprador é identificado pelo CPF. As imagens das câmeras de segurança que registram o bolsonarista foram repassadas à PF e Barramansa afirmou colaborar com a investigação.
Outra imagem que chamou a atenção dos investigadores foi registrada pelas câmeras de vigilância do anexo IV da Câmara dos Deputados. As gravações mostram Francisco passando pelo guichê de identificação, pelo detector de metais e pelos policiais legislativos. Ele chegou ao local às 8h15 e, segundo informações repassadas pela segurança, foi apenas ao banheiro, saindo logo em seguida.
A PF, porém, levanta se o bolsonarista ia à Câmara com frequência. Isso porque, além de ter sido flagrado no local no mesmo dia em que detonou os petardos, em 2023 ele esteve no gabinete do deputado Jorge Goetten (Republicanos-SC). Os dois se conhecem da política de Rio do Sul (SC), onde Francisco tentou eleger-se vereador. Nesse encontro, o parlamentar disse tê-lo percebido emocionalmente desequilibrado por causa da separação da ex-mulher.
Segundo as investigações, além do Supremo, o bolsonarista também teria planejado atacar a Câmara, pois alugou um trailer no estacionamento do anexo IV há três meses. No veículo, a polícia encontrou vários explosivos. "Esse trailer estava em um ponto estratégico, nas proximidades do STF, o que aponta para um planejamento de médio e talvez de longo prazo. E sinalizam a gravidade de tudo que foi feito", reconheceu o diretor-geral da PF, Andrei Rodrigues.
Além disso, uma selfie de Francisco no plenário do STF, em 24 de agosto, indica a elaboração meticulosa do atentado. Na legenda da foto, que postou nas redes sociais que mantinha, ele acrescentou uma legenda na qual dava mais indicações de que poderia perpetrar algum ato contra a Corte. "Deixaram a raposa entrar no galinheiro", escreveu.
Conexões
Tais registros reforçam a hipótese da premeditação do crime, até porque Francisco vinha morando em uma quitinete em Ceilândia há pelo menos três meses antes das explosões. O bolsonarista também estivera em Brasília à época em que extremistas acamparam em frente ao Quartel-General do Exército, no Setor Militar Urbano, exortando a um golpe militar que mantivesse Jair Bolsonaro na Presidência da República e impedisse a posse de Luiz Inácio Lula da Silva.
"Há indícios de um planejamento a longo prazo. Ele já esteve em outra oportunidade em Brasília. Estava em Brasília no começo de 2023. Ainda é cedo para saber se houve ligação com os atos de 8 de janeiro, mas há investigação sobre isso", afirmou Andre Rodrigues.
O relator da investigação é o ministro Alexandre de Moraes, do STF, que, segundo a ex-mulher de Francisco, era seu principal alvo. O filho do bolsonarista está em Brasília a fim de liberar o corpo para que seja sepultado em Rio do Sul.