O atentado à bomba nas proximidades do Supremo Tribunal Federal (STF), na noite de quarta-feira (13/11), e a descoberta do vínculo do autor — um chaveiro de Santa Catarina filiado ao PL que disseminava discursos de ódio em suas redes sociais — com o bolsonarismo provocaram uma onda de repúdio ao extremismo de direita e reavivaram, na memória das pessoas, os ataques de 8 de janeiro de 2023 aos Três Poderes.
Como efeito imediato, a proposta de uma emenda à Constituição (PEC) para anistiar os presos dos atos antidemocráticos, defendida, principalmente, por políticos ligados ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL-RJ), perdeu boa parte de seu apelo: o de que os acusados não teriam praticado os crimes pelos quais estão sendo condenados pelo ministro Alexandre de Moraes, do STF — condenações que estão sendo ratificadas pelos demais magistrados.
As vozes contra a anistia dos golpistas ganharam força nas últimas horas, principalmente depois de a Polícia Federal confirmar que o autor do ataque de quarta-feira, Francisco Wanderley Luiz, participou de acampamentos bolsonaristas (a maioria, em frente a instalações militares) após a vitória de Luiz Inácio Lula da Silva sobre Bolsonaro nas eleições de 2022.
A chamada PEC da Anistia foi proposta pelo deputado Rodrigo Valadares (União-SE) — que se declara "cristão, conservador e bolsonarista" —, com o objetivo livrar de condenações penais os participantes do quebra-quebra na Praça dos Três Poderes. Nesta quinta-feira, o parlamentar tentou desvincular o autor do atentado de quarta-feira de grupos políticos de direita, na linha de que Francisco Wanderley Luiz sofria de transtornos mentais e que agiu sozinho.
"O triste e lamentável episódio", escreveu Valadares em sua conta no X, "deixa muito evidente que é um fato isolado de uma pessoa que claramente sofria transtornos de ordem mental", e que "nada tem correlação com a direita ou com as vítimas do 08/01".
Na mesma linha seguiu o secretário-geral do PL, senador Rogério Marinho (RN), ao tratar do atentado. Ele reconhece que o clima político no país continua tenso por causa da polarização, mas, ao contrário do que pregam os ministros do STF, acredita que o Parlamento pode contribuir para pacificar o país ao aprovar a anistia. "Mais do que nunca, está na hora de pacificar o país, de distensionar o processo. E a solução política está dentro do Congresso Nacional, com a anistia", postou.
A PEC estava pronta para ser apreciada pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados, mas o presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), mesmo pressionado pelos aliados bolsonaristas, decidiu botar um freio na tramitação, pressionado pela base governista.
Lira resolveu que a proposta deveria passar, antes, por uma comissão especial, como prevê o Regimento Interno da Casa. Assim, tirou o tema do debate sobre sua própria sucessão, já que a anistia vinha sendo tratada como moeda de troca pela oposição para apoiar o nome escolhido por Lira para ocupar a Presidência da Câmara a partir do ano que vem.
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Cobranças
O problema, para os defensores da PEC, é que o clima pró-anistia, que nunca foi unanimidade mesmo entre os partidos do Centrão, arrefeceu com a explosão das bombas a poucos metros da sede do Congresso Nacional. O sentimento, um dia após o atentado, era de cobrança por respostas que ajudem a explicar a motivação do crime e se Francisco Luiz atuou sozinho ou se teve ajuda de alguém para preparar o ataque.
"Os atentados em Brasília são muito graves e devem ser apurados com rigor. É uma ação terrorista e política de um fanático. A Constituição é clara: crimes de terrorismo, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático são imprescritíveis e insuscetíveis de perdão", postou o líder da Maioria no Senado, Renan Calheiros (MDB-AL).
Para o cientista político Leonardo Barreto, o atentado desta semana "resgata a memória" do 8 de janeiro e mina o argumento de que a depredação da Praça dos Três Poderes foi um mero ato de vandalismo. "Neste momento, os partidos políticos entendem que terão mais custos do que ganhos ao assumirem essa pauta (da anistia)", avalia Barreto. "O 8 de janeiro é relembrado, agora, na sua dimensão mais trágica, a da ruptura democrática, da possibilidade de agressão aos Poderes constituídos", disse o analista ao Correio.
No Palácio do Planalto, o entendimento é de que o ataque ao STF "reforça o ambiente contrário à aprovação da PEC da Anistia", de acordo com o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, em entrevista à GloboNews. "É mais um episódio fruto da cultura do ódio, de atacar o STF e nossas instituições democráticas, o que reforça ainda mais um ambiente no Congresso para que não se pense em anistiar quem pratica crimes contra a democracia, em especial, todos os atos preparatórios até o dia 8 de janeiro", concluiu o ministro.