O governo federal se eximiu de responsabilização por ações contra a concessionária de energia Enel, que atua em São Paulo. O ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, afirmou que não é possível fazer qualquer intervenção para romper o contrato da companhia sem a instalação de um inquérito pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).
Ele acusa a agência reguladora de omissão no caso e sustentou que o governo só poderá tomar providências em relação ao contrato se houver a abertura de um processo legal para tratar o caso. "Todo mundo perguntando se o governo não vai fazer caducidade. Alguém tem dúvida de que, se esse fosse o caminho, uma possibilidade real, se pudesse ser feito sem quebra de contrato, sem judicialização, sem aumentar o ônus para o consumidor, o ministro já não teria feito?", indagou em coletiva de imprensa nesta quarta-feira.
Silveira apresentou um documento enviado ao diretor-geral da agência reguladora, Sandoval Feitosa, em 1º de abril deste ano, determinando a abertura de um processo administrativo contra a empresa.
De acordo com o ministro, o ofício do MME foi enviado em decorrência do apagão que aconteceu na capital paulista em novembro do ano passado. "A Aneel é o órgão competente pela abertura de um devido processo legal para que se aplicassem todas as penalidades possíveis, inclusive, intervenção. E a Aneel se omitiu com relação à abertura desse processo", frisou.
As declarações ocorreram em meio a cobranças sobre a atuação federal no caso da concessionária de energia, que atende o estado de São Paulo. O temporal que atingiu a capital e a região metropolitana, na última sexta-feira, deixou mais de 2 milhões de endereços sem energia — até esta quarta-feira, o sistema ainda não havia sido totalmente restabelecido.
O prazo dado pelo MME à companhia termina nesta quinta-feira, mas a situação ainda pode se agravar. A Defesa Civil emitiu alerta com a previsão de fortes chuvas a partir desta sexta-feira.
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O incidente virou questão eleitoral e um cabo de guerra entre a prefeitura, a concessionária e a atuação do governo federal. Silveira criticou a "politização" do tema em meio às eleições municipais e acusou o prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), de propagar fake news. Ele ressaltou que a falta de planejamento municipal e as ações da Enel "beiraram a burrice".
Conforme o ministro, o contrato da Aneel com a concessionária é "frouxo" e "descolado da realidade", eximindo a empresa de responsabilidade sobre apagões em casos de eventos climáticos severos. "O contrato, que desde que eu assumi, chamo de obsoleto e frouxo com relação à qualidade de serviço dos consumidores brasileiros, não previa esses eventos climáticos", destacou.
Segundo ele, há três alternativas para a Enel: passagem de controle, intervenção e caducidade (cassação) do contrato de concessão, mas todas dependem da abertura de um processo por meio da Aneel.
Após as declarações de Silveira, a Controladoria-Geral da União (CGU) instaurou uma investigação preliminar sumária para apurar possíveis irregularidades envolvendo dirigentes da agência. O processo correrá em caráter sigiloso, "a fim de garantir a integridade das apurações e o devido processo legal", informou o órgão.
Em nota à imprensa, na segunda-feira, a Aneel afirmou que qualquer "tentativa de intervenção ou tutela indevida" por parte do governo não contribui para solucionar o apagão. O órgão defendeu sua autonomia e disse estar tomando "todas as medidas cabíveis" para a retomada do fornecimento de energia. "A Aneel informa que está conduzindo uma apuração rigorosa e técnica sobre a atuação da Enel SP durante este período crítico", afirmou.
Mudança de regras
Nesse caso da Aneel, Silveira tem trocado farpas com a agência desde o início do ano e já disse, em algumas oportunidades, que o órgão poderia estar "boicotando" o governo.
Após o apagão em São Paulo, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva sinalizou que quer mudar as regras atuais sobre o mandato dos diretores de agências. Nesta quarta-feira, Silveira declarou ser favorável à ideia. Destacou que o Executivo articula uma proposta de reestruturação, que precisa passar pelo Congresso. "Eu não acredito nesse papo de autonomia", disse.
Hoje, os mandatos nas agências têm duração de quatro anos, mas o período não é casado com o mandato presidencial. Todos os diretores da Aneel foram indicados pelo ex-presidente Jair Bolsonaro, com alguns mandatos se estendendo até 2028.
Pela lei, as agências reguladoras são independentes para desenvolver suas atividades de fiscalização, auditoria e regulação, pois possuem autonomia e não são subordinadas a outros órgãos.
Em julho e agosto, servidores das 11 agências reguladoras federais realizaram uma paralisação nacional. Os trabalhadores dizem que os órgãos estão sendo sucateados, com deficit de servidores e corte de orçamento.
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