Lideranças e movimentos indígenas rejeitaram a iniciativa do Ministério dos Povos Indígenas (MPI) de indicar nomes para compor a mesa da comissão de conciliação do Supremo Tribunal Federal (STF). A iniciativa foi criada para discutir a tese jurídica do Marco Temporal na Corte. O ministro Gilmar Mendes solicitou as indicações ao governo federal no início do mês.
Em agosto deste ano, uma das principais entidades dos povos indígenas, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), se retirou da comissão por não acreditar que foram garantidos condições mínimas e justas para a participação. Em nota, divulgada na segunda-feira (15/10), a Apib afirmou temer que, “sem a definição de objeto sob conciliação, corre-se o risco desse espaço, que reúne os Três Poderes do Estado, desemboque num cenário de ‘desconstitucionalização’” para os povos indígenas.
Ao anunciar a lista com os nomes escolhidos, o ministério explicou que a decisão se deu após a saída da Apib da comissão, mas reiterou que "os nomes não substituem a representação da Apib, cuja vaga segue à disposição da organização". A Apib rebateu que, como os nomes escolhidos pelo MPI fazem parte do quadro de servidores governamentais, estes não estão na comissão em nome do movimento indígena.
“A Apib lamenta profundamente que as instâncias autônomas dos povos indígenas ou entes públicos em que há participação indígenas sejam pressionados a ocuparem colegiados contra a sua vontade, sobretudo em espaços nos quais não está garantido o respeito à lei e às decisões já tomadas pelo plenário da Suprema Corte, que declarou inconstitucional a tese do marco temporal, em setembro de 2023”, argumentou a entidade em nota.
O Conselho Indígena de Roraima (CIR), organização indígena representativa dos povos Macuxi, Wapichana, Ingaricó, Taurepang, Patamona, Sapará, Wai Wai, Yanomami e Ye’kwana, prestou apoio à Apib e repudiou a decisão do MPI.
“Ao fazer essa indicação, o MPI alinha-se com fazendeiros, garimpeiros, agronegócio, revivendo práticas coloniais de tutela e contra os direitos dos povos indígenas. Esse ato constitui uma violação clara ao princípio da boa-fé e ao direito internacionalmente reconhecido de consulta e consentimento prévio, conforme previsto em mecanismos de direitos humanos, como a Convenção 169 da OIT. A criação do MPI foi uma demanda coletiva, mas não tem legitimidade para nos representar dentro da estrutura do Estado brasileiro”, escreveu o CIR em nota divulgada na segunda-feira.
O Ministério dos Povos Indígenas reiterou a confiança no STF para tomar decisões que beneficiem os povos originários, sem que ocorra retrocessos no processo. “Temos a confiança de que, como guardiã máxima da Constituição, a Corte não permitirá retrocessos em relação aos direitos indígenas e este será um espaço de diálogo para avançarmos no debate em torno de soluções que assegurem os direitos originários dos povos em relação aos seus territórios”, escreveu o MPI em nota.
Ao Correio, a pasta respondeu que trabalha para atender as demandas dos povos indígenas e do STF por meio de diálogo com a atribuição de defesa dos direitos coletivos. "Atendendo à determinação do Supremo Tribunal Federal e após diálogo com a APIB, o MPI indicou cinco especialistas indígenas para compor a comissão especial, que não substituem a representatividade do movimento. Todos os indicados são especialistas e conhecem amplamente suas regiões."
*Estagiária sob a supervisão de Andreia Castro
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