Apesar de divergências entre os governadores e o Palácio do Planalto no combate às queimadas que vêm varrendo o território nacional, a reunião de ontem trouxe uma unanimidade: apoio a penas mais duras para quem inicia incêndios criminosos. Segundo o ministro da Casa Civil, Rui Costa, que conduziu o encontro, o Ministério da Justiça e Segurança Pública está finalizando uma minuta com mudanças na legislação, que deve ser enviada para a apreciação do governo federal ainda hoje.
A reunião no Palácio contou com nove governadores e dois vices das regiões do Pantanal, da Amazônia Legal e do Cerrado. Todos os representantes estaduais reclamaram que os presos por queimadas ilegais foram liberados pagando multas pequenas — como R$ 100 ou R$ 300 — e ficaram livres para dar início a outros incêndios. Também foi unânime a avaliação de que as chamas são fruto de ações coordenadas — o que está alinhado com as investigações do governo federal.
“O ministro Ricardo Lewandowski (Justiça) informou que está enviando para a Casa Civil, até amanhã (hoje), um conjunto de medidas para mudar a legislação, inclusive do aspecto das punições relativas aos incêndios federais, tornando mais severas as punições. Mas foi uma reclamação unânime e que é importante a gente destacar”, explicou Rui Costa depois do encontro, ao lado da ministra Marina Silva (Meio Ambiente e Mudança do Clima), do ministro Waldez Góes (Desenvolvimento Regional) e dos governadores Eduardo Riedel (MS) e Antônio Denarium (RO).
Colaboração
O governo federal também fez um apelo para que as polícias civis colaborem com a investigação da Polícia Federal (PF) sobre os incêndios criminosos. Segundo relatos dos governadores, as chamas atingem, inclusive, áreas produtivas, e podem estar ligadas a táticas para reduzir o valor das terras. O governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha, relatou no encontro que um dos presos por incêndios no DF confessou ter sido contratado por um grupo ligado à grilagem de terras.
Segundo Marina Silva, são muitas as indicações de que grupos criminosos aproveitaram a estiagem histórica que o país enfrenta para aumentar a proporção dos incêndios. “A crise é grave. É um enfrentamento muito difícil. As ações estão sendo constantemente ajustadas, e o que nós queremos é atuar de forma integrada. Está fazendo mal à saúde, à nossa economia, aos interesses estratégicos do Brasil no exterior e está destruindo o meio ambiente”, destacou.
Apesar de governadores e Palácio do Planalto estarem afinados sobre a questão, há dúvidas a respeito da disposição do Congresso para aprovar penas mais duras para quem começa focos ilegais de fogo. No encontro entre os Três Poderes, na terça-feira, os presidentes do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), pediram cautela em relação à proposta. Para o senador, o problema não é legislativo. Para deputado, as mudanças têm que ser “muito explicadas” para evitar conflitos ideológicos.
Os governadores também destacaram o caráter criminoso dos incêndios em seus estados. Ao chegar para o encontro, Denarium defendeu penas mais severas.
“É importante agravar a punição para aqueles que cometem esses incêndios criminosos, e os produtores rurais precisam pedir autorização para queima controlada com os órgãos competentes”, frisou.
Já Mauro Mendes defendeu que tem combatido as ações criminosas “violentamente” em seu estado. Afirmou, ainda, que as chamas estão trazendo prejuízos para os produtores rurais. “Nenhum incêndio começou naturalmente”, disse.
Caiado relatou que tentou aprovar uma lei estadual para manter presos, até outubro, os suspeitos de iniciar incêndios. A medida, porém, foi derrubada pela Justiça goiana por ser considerada inconstitucional. Para o governador goiano, incêndios criminosos devem ser inafiançáveis. Ele calculou que as queimadas deixaram prejuízo de R$ 1,5 bilhão apenas em Goiás.
Sem propostas concretas
O endurecimento da pena para quem deflagra um incêndio criminoso não foi apenas o único ponto de convergência entre os governos federal e estaduais, mas, também, a única proposta concreta contra a onda de queimadas. Foram debatidas a possível reformulação da Defesa Civil e dos Bombeiros, que teriam estruturas regionais, e não estaduais, para atuar, e o ministro da Casa Civil, Rui Costa, pediu que os governadores enviem planos de trabalho para que sejam avaliados.
Ele garantiu, ainda, que haverá novas liberações de recursos, como o da medida provisória (MP), que destinou R$ 544 milhões para os estados e que ficarão de fora do arcabouço fiscal. Na semana que vem, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) também vai liberar mais R$ 400 milhões para financiar os bombeiros de estados da Amazônia Legal.
Caiado criticou o governo federal depois do encontro. Afirmou que os R$ 13 milhões destinados ao seu estado, até agora, são insuficientes, e que sua gestão controlou sozinha as chamas. “O governo federal não estava preparado. Desde quando Brasília vai saber resolver um problema do Nordeste, de Goiás? Precisamos parar com essa bobagem. Brasília não sabe governar o país. Não deu conta de resolver no Rio Grande do Sul, não vai dar conta de resolver as queimadas”, atacou.
Ele ainda criticou a postura do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que estava no Maranhão para a assinatura de um termo de conciliação com as comunidades quilombolas do município de Alcântara — que encerra uma disputa de 40 anos pela área no entorno do Centro de Lançamento de Alcântara, da Força Aérea Brasileira. “Se a visão dele é que isso (a reunião sobre as queimadas) não tem essa relevância, não cabe a mim discutir. No nosso estado, estou fazendo, não me omito de nenhum problema”, fustigou.
Já Mauro Mendes considerou a reunião “bem-vinda”. Mas avalia que os resultados práticos da ação federal contra o fogo só virá em 2025, uma vez que o período das chuvas deve começar em poucos dias em seu estado.