Uma candidatura coletiva a uma vaga de vereador na Câmara Municipal de campo Grande promete inovar nas eleições em Mato Grosso do Sul. Pela primeira vez no estado, uma pessoa com síndrome de Down se candidata a um cargo político no estado. Com ele, em uma chapa coletiva, um deficiente visual, ambos do Partido Social Democrático (PSD). A candidatura conjunta tem como objetivo unir forças nas urnas e ganhar visibilidade nas políticas públicas.
Juliano Varela, 32 anos, é um jovem com síndrome de Down e autista. A história dele com a política começou ainda criança, quando a mãe dele, Maria Lúcia Varela, precisou ir à luta para garantir acesso à escola para o filho. "Não existia a Lei Brasileira de Inclusão, era muito difícil. As escolas regulares não aceitavam pessoas com deficiência intelectual. Quando Juliano nasceu, fui para o Rio de Janeiro por dois anos para fazer a estimulação precoce dele. Quando terminou, o médico disse que ele precisava ir para a escola. Só que eu voltei para Campo Grande e não tinha escola", relembrou a mãe do candidato.
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Com ajuda de alguns políticos, em 1994, ela conseguiu fundos para criar a Associação Juliano Varela, que oferta educação e aulas de natação, futebol, música e arte, além de cursos profissionalizantes com viés da inclusão e da acessibilidade. Desde então, acolheu milhares de pessoas com deficiência intelectual, como síndrome de Down, transtorno do déficit de atenção e hiperatividade, microcefalia e autismo. Em 2023, cerca de 1,3 mil estudantes se matricularam no instituto.
"Sozinho, o meu filho com síndrome de Down não conseguiria, dadas as limitações de comunicação dele. Mas, com a proposta de candidatura coletiva, vemos uma grande oportunidade, porque são duas pessoas exercendo o mandato. Juliano carrega toda militância de dar nome à associação e, em função de ela ser filantrópica, a presença dos políticos se faz imprescindível, pois vivemos de emendas parlamentares e apoio. (A política) é um ambiente muito familiar para o Juliano, mas acho que nunca tinha passado na cabeça dele estar do outro lado, ser candidato, ele está se sentindo muito pleno, feliz, vaidoso, está fazendo muito bem a ele", apontou a mãe do candidato.
Márcio Ximenes Ramos, 43 anos, ex-presidente do Instituto Sul-Mato-Grossense para Cegos Florivaldo Vargas (Ismac), é deficiente visual e está ao lado de Juliano nessa candidatura. "Eu milito desde os 14 anos no Ismac, já tinha isso comigo. Fiz todo o meu processo de habilitação, trabalhei em outras áreas, fiz parte de vários conselhos da assistência e da pessoa com deficiente. Tinha muita vontade (de ser candidato) porque achava que era uma tentativa muito difícil", conta ele.
"Juliano vai ser os olhos e eu vou ser a mente do coletivo. Ele já tem 30 anos dentro da escola Juliano Varela, acredito que é uma força muito grande. E eu vou pensar sobre as políticas públicas, participar das comissões. Nós temos a total condição de efetivar políticas (de inclusão) e fiscalizá-las", afirmou Ramos.
Representatividade
A candidatura dos dois sul-mato-grossenses é uma entre as mais de 5 mil cadastradas por pessoas com algum tipo de deficiência no pleito deste ano, segundo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Em comparação com as últimas eleições municipais, em 2020, a quantidade caiu cerca de 25%.
Para Ramos, a candidatura coletiva foi "um projeto de Deus", já que o convite para integrar o pleito ocorreu nos últimos dias do período de registro de candidatos. Segundo ele, houve uma desistência no partido e a articulação da chapa dele e de Juliano foi liderada pelo senador Nelsinho Trad (PSD-MS), com o apoio do presidente nacional do PSD, Gilberto Kassab.
"Acredito que é um projeto grandioso, Campo Grande precisa dar visibilidade para as pessoas com deficiência e dar voz. Na Câmara Municipal, vamos ter voz e propriedade para falar da causa. Estou bastante confiante de que, se a sociedade entender a importância de ter dois representantes com deficiência na Câmara, vamos mudar o rumo da política em Campo Grande", defende Ramos.
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