Testemunha arrolada para depor no Conselho de Ética no caso que envolve o deputado Chiquinho Brazão (sem partido-RJ), o parlamentar Tarcísio Motta (PSol-RJ), que foi vereador no Rio de Janeiro junto com Marielle Franco, do mesmo partido, afirmou em depoimento, nesta terça (9/7), que a família do acusado de ser um dos mandantes da morte da vereadora domina áreas de atuação de milícia na cidade e que o PSol se tornou um obstáculo para os interesses políticos e econômicos desses grupos.
O deputado Brazão, seu irmão Domingos Brazão e o delegado Rivaldo Barbosa são réus no Supremo Tribunal Federal (STF) acusados de encomendarem a morte de Marielle, crime que vitimou ainda o motorista Anderson Gomes. Motta foi arrolado como testemunha pela relatora do caso no conselho, a deputada Jack Rocha (PT-ES).
O deputado contou que o interesse de Brazão no Rio, quando vereador no mesmo período, envolvia flexibilização de regras da regularização fundiária e garantia de loteamentos em região de interesse da milícia. Mota contou ainda que, na Câmara Municipal, Brazão presidiu durante dez anos a Comissão de Assuntos Urbanos, que tratava dessas pautas, e que sempre impediu a presença de parlamentares do PSol no colegiado.
"Ao PSol era negada a presença nessa comissão enquanto ele foi o presidente. Estávamos vetados nesse espaço de poder e interesse das milícias. Perguntávamos a razão de não ser indicado ninguém do PSol e a resposta era: 'o Chiquinho Brazão não deixa'", contou Motta.
O deputado federal afirmou ainda que o PSol virou um "verdadeiro obstáculo" ao interesse políticos e econômicos das milícias no Rio. Ele disse também que a família Brazão sempre teve domínio em localidades de atuação desses grupos no Rio e que militantes e políticos do PSol não tinham acesso. Eram ameaçados se entrassem nesses lugares.
"Era notório que a família Brazão tinha fortíssima influência e eram os mais votados nesses bairros. Cerca de 60% dos votos do Chiquinho Brazão eram nessas áreas. Fui candidato a governador do Rio e não podíamos estar em muitos desses territórios dominados pelas milícias. Nem militante podiam usar adesivos nesses lugares. Não é de hoje isso", disse o deputado.
Um dos projetos de interesse da milícia, segundo Motta, de regularização fundiária que envolvia loteamentos, foi aprovado por um voto.
"Era um grande vale tudo urbanístico no Rio, com flexibilização dos critérios de regularização fundiária e permitia lotes não edificados Esse era o tesouro para a milícia. E foi de autoria do Chiquinho Brazão, que fez tudo para tramitar e teve a oposição do PSol", disse. Essa proposta, depois, foi considerada inconstitucional.
Sobre o assassinato de Marielle, Motta afirmou que foi uma tentativa de amedrontar e aterrorizar os políticos e parlamentares do PSol, que eram uma ameaça a atuação das milícias no Rio, disse.
"Era para causar terror a quem ousasse enfrentar esse poder político dos milicianos. Faz todo sentido cometer um crime político para nos amedrontar e aterrorizar. Precisavam de algo para parar o crescimento do resultado eleitoral alcançado pelos parlamentares do PSol no Rio. A Marielle, embora no primeiro ano do primeiro mandato, começava a despontar. Olhava para a periferia de maneira prioritária. Não temo como não falar da questão fundiária numa favela. A Marielle era obviamente quem representava a maior ameaça dos interesses da milícias naquele momento"
Brazão acompanhou a sessão e a ele foi dada a palavra, mas o parlamentar apenas reafirmou ser inocente e preferiu não fazer questionamentos à testemunha.
A defesa de Chiquinho Brazão, presente no Conselho de Ética, diante da negativa de várias testemunhas arroladas em se manifestar na ação, pediu a suspensão do processo contra o cliente. O advogado Cleber Lopes, que atua na defesa do acusado, argumentou que os depoimentos são imprescindíveis e que as testemunhas não poderiam declinar do convite.
"Eles deveriam ser intimados a depor. Se não, o Conselho de Ética não terá elementos suficientes para decidir sobre a existência dos fatos. Ou suspendemos o processo disciplinar até que o Poder Judiciário demonstre a existência ou não do fato, ou buscamos mecanismos para que as testemunhas sejam compelidas a comparecer", disse Lopes.
Uma testemunha de defesa de Brazão foi ouvida na segunda-feira. O servidor da Câmara dos Vereadores Marcos Martins, que assessorou o então vereador na comissão onde se votou o projeto polêmico, negou irregularidades na tramitação, disse desconhecer qualquer problema na relação do hoje acusado de ser um dos mandantes de Marielle com parlamentares do PSol e a própria vereadora.
"Não conseguia nenhuma animosidade nessa relação. Nunca tomei conhecimento. Foi um projeto de autoria do Executivo, alterado pelo vereador. normal",disse Martins, que afirmou até ser um "admirador" da vereadora do PSol.
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