ANOS DE CHUMBO

Site conservador usa foto de passeata contra ditadura de forma indevida

Página do Instituto Conservador Liberal (ICL), entidade liderada por Eduardo Bolsonaro, insere imagem de protesto de atrizes contra a censura, de 1968, em artigo que minimiza participação das mulheres na conquista do voto feminino

Artigo do ICL com imagem de atrizes na Passeata dos Cem Mil -  (crédito: Reprodução)
Artigo do ICL com imagem de atrizes na Passeata dos Cem Mil - (crédito: Reprodução)

O site do Instituto Conservador Liberal (ICL), entidade idealizada pelo deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), veicula foto da passeata de atrizes contra a censura imposta pela ditadura e uma manifestação contra o próprio regime militar.

A imagem ilustra o artigo "Entre sufrágios e naufrágios: um olhar sobre o voto feminino", de autoria da hoje deputada estadual Ana Caroline Campagnolo (PL), de Santa Catarina, que critica as feministas e argumenta que o direito da mulher votar foi fruto dos homens que planejaram a República, a democracia e o liberalismo. "Foi a evolução cultural deles que permitiu às mulheres fazerem parte dessas conquistas". Não consta na página a data da publicação do texto.

Na foto, emblemática e das mais representativas sobre aquele período, aparecem de mãos dadas, na passeata, cinco consagradas atrizes brasileiras: Tônia Carrero, Eva Wilma, Leila Diniz, Odete Lara e Norma Bengell. Não é a primeira vez que essa imagem das artistas é explorada pela direita brasileira e por partidos políticos desse espectro, como o PL.

Imagem ilustra o artigo "Entre sufrágios e naufrágios: um olhar sobre o voto feminino", de autoria da hoje deputada estadual Ana Caroline Campagnolo (PL), de Santa Catarina
Na foto, aparecem de mãos dadas, na passeata, cinco consagradas atrizes brasileiras: Tônia Carrero, Eva Wilma, Leila Diniz, Odete Lara e Norma Bengell (foto: Reprodução)

A fotografia já foi usada pela atriz Regina Duarte, pelo Partido Liberal e também pela ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro, que preside o PL Mulher. No caso de Regina Duarte, gerou até um processo judicial. Janaína Diniz, filha de Leila Diniz, a acionou pelo uso indevido da imagem de sua mãe, exposta num vídeo, na qual a foto surge durante um discurso do então presidente Jair Bolsonaro em defesa do golpe militar. A imagem das atrizes surge quando Bolsonaro afirma que "64 foi uma exigência da sociedade" e que "as mulheres nas ruas pediam o restabelecimento da ordem". As cinco atrizes não pregavam nada disso. Ao contrário. Michelle Bolsonaro já associou a foto à conquista do voto feminino, o que também não corresponde à verdade.

Regina Duarte, por decisão judicial, se retratou na última segunda-feira (15), nas suas redes. Ela afirmou que Leila Diniz era sua amiga e que, ao publicar a imagem, em dezembro de 2022, acreditava que estava "ressaltando o valor da força da mulher através daquele grupo de atrizes que eu amava, respeitava e era para mim um exemplo: lutavam por seus direitos de liberdade de expressão".

Mas segundo a advogada Maria Isabel Tancredo, que representa a diretora Janaína Diniz na ação, a execução contra Regina Duarte seguirá enquanto não houver cumprimento efetivo da obrigação determinada em sentença transitada em julgado."

Regina Duarte não fez a retratação determinada pela Justiça, mas uma tentativa de justificar o injustificável. É evidente que não cumpre com a obrigação de explicitar aos seguidores da atriz que Leila Diniz nunca apoiou a Ditadura Militar e que a fotografia utilizada no conteúdo infringente foi, na verdade, feita em um contexto de oposição ao regime e à censura".

O ICL organiza no Brasil a Cpac (Conferência de Ação Política Conservadora), que, na edição deste ano, recebeu o presidente argentino Javier Milei. No fim de semana de discursos, no início deste mês, lideranças bolsonaristas pregaram a anistia de Jair Bolsonaro, atacaram o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), e defenderam a anistia dos presos pelos ataques do 8 de janeiro.

O Correio entrou em contato com o gabinete e com a assessoria da deputada Ana Campagnolo, mas não obteve retorno. E não conseguiu contato com o gabinete de Eduardo Bolsonaro nem com o próprio. O espaço está aberto para manifestações de Campagnolo e do deputado.

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postado em 18/07/2024 18:04
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