Atentado nos EUA

Bolsonaro relembra a facada que sofreu em 2018

Ex-presidente compara ataque a Donald Trump à agressão que sofreu na campanha eleitoral que o levou ao Palácio do Planalto e mantém aposta na polarização política

Em evento do PL em São Paulo, Bolsonaro diz que ele e Trump foram
Em evento do PL em São Paulo, Bolsonaro diz que ele e Trump foram "salvos por milagre" e lança dúvidas sobre a motivação do ataque nos EUA - (crédito: ESTADÃO CONTEÚDO/MARCO SILVA/WPP)

O atentado contra Donaldo Trump — ex-presidente dos Estados Unidos e candidato do Partido Republicano à sucessão de Joe Biden (presidente democrata que tenta a reeleição) nas eleições de outubro —, sábado (13/7), em um comício na Pensilvânia, jogou mais gasolina na fogueira da polarização política brasileira. Os principais representantes da extrema-direita do país, personificada pelo bolsonarismo, usaram as redes sociais para apoiar o candidato republicano e fazer vinculações com a disputa política doméstica.

O ex-presidente Jair Bolsonaro disse, neste domingo (14/7), ao participar de uma passeata em São Paulo, que "esses atentados" só atingem "pessoas de bem" e "conservadoras", com uma autorreferência ao atentado à faca que sofreu na campanha eleitoral de 2018, em Juiz de Fora (MG).

 

 

"Somente pessoas conservadoras sofrem atentados. Os atentados são contra pessoas de bem. Ele (Trump) foi salvo ali — no meu entender, como eu fui — por um milagre. Porque foi um milagre eu ter sobrevivido em 2018, tendo em vista a gravidade dos ferimentos (da facada). E ele (Trump) foi salvo por questão de poucos centímetros. Isso, ao meu entender, é algo que vem de cima", disse o ex-presidente, lançando dúvidas sobre as motivações do ataque.

Filho 01 do ex-presidente, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) reforçou a ligação entre os dois casos com uma suposta conspiração. "Tentaram matar Trump, tentaram matar Bolsonaro, mas a direita é que é acusada de ser violenta. Você pode não gostar de Trump ou do Bolsonaro, mas se pergunte: por que quiseram matá-los?", indagou nas redes sociais.

Para o cientista político Leonardo Barreto, "um atentado, ao vivo, de um conservador, durante a campanha nos Estados Unidos" é "nitroglicerina pura". Segundo ele, é "natural" que a extrema-direita brasileira faça a vinculação com a facada que Jair Bolsonaro levou em Minas Gerais. "Esse é outro elemento nesse papel de vitimismo que (a extrema-direita) adota." O terceiro elemento é o fato de que os alvos têm sido políticos da direita radical. "Temos elementos para a construção de uma narrativa que vai surgir de maneira muito automática", avalia. Para ele, o próprio Bolsonaro precisa desviar a atenção do público em relação aos processos que responde no Supremo Tribunal Federal (STF). "Ele vai cair com tudo em cima desse atentado", previu.

Outros políticos do campo da direita adotaram um discurso mais moderado, como o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos).

Na análise de Leonardo Barreto, a forma como políticos ultraconservadores vão usar o atentado em suas narrativas pode se voltar contra a própria direita. "Cria uma armadilha no sentido de que dá palanque, exatamente, às figuras que são as mais rejeitadas (pelo eleitor), que têm seus tetos eleitorais mais baixos, como o próprio Bolsonaro."

Para ele, essa apropriação ideológica do atentado atrapalha, inclusive, o processo de moderação que lideranças de direita buscam construir para ampliar seu raio de influência no eleitorado.

O cientista político Leandro Gabiati, por sua vez, chama atenção para outro aspecto, o da "transnacionalização" dos movimentos da direita mais populista e ideológica. Ele cita Trump, Bolsonaro e o presidente da Argentina, Javier Milei, como exemplos dessa "transnacionalização".

"O que a gente vê é uma exploração muito evidente de um caso que não tem nada a ver com a política brasileira, mas que se traslada aqui para criar engajamento, algum tipo comum de narrativa que tem muito a ver com as novas formas de comunicação, muito mais imediatas, em que todo mundo quer se posicionar sem ter qualquer informação factual, sem saber o que realmente aconteceu", explica Gabiati.

Bate-boca nas redes

Nas redes sociais, o fogo no "parquinho" ao qual Leonardo Barreto se refere atingiu novos patamares, ontem, com a profusão de "teses" disseminadas sobre o atentado a Trump — quase todas sem comprovação. O deputado federal André Janones (Avante-MG), aliado do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e um dos principais críticos da extrema-direita bolsonarista, disparou diversos posts nas redes sociais sugerindo que o atentado foi "fake" (falso). "Se ficar comprovado que o incidente contra o republicano foi real, o presidente Lula continuará no cargo e Bolsonaro continuará inelegível", provocou o parlamentar e influenciador digital.

A publicação de Janones foi respondida quase que imediatamente pela deputada bolsonarista Bia Kicis (PL-DF). "Ainda dá tempo da Câmara dos Deputados fazer justiça e, por meio do seu Conselho de Ética, cassar o mandato desse deputado que envergonha o Parlamento. Recorremos da decisão de arquivamento da denúncia (contra Janones) de rachadinha, cheia de provas. Com isso, esse ser sente-se livre para destilar seu ódio e sua ignorância como na publicação abaixo", postou Kicis.

O senador e líder do governo Lula no Congresso, Randolfe Rodrigues (AP-sem partido), também foi às redes sociais, para denunciar que tem sido vítima de notícias falsas que o colocam como solidário ao autor dos tiros contra Trump, Thomas Matthew Crooks. "Mentira! Fake! Crime! O gabinete do ódio não tem limites e não para. Não me solidarizei com atirador, quem defende armas e crimes não sou eu! Na dúvida, meu perfil é aberto e qualquer um pode conferir o que saiu de verdade ou não. Não espalhem inverdades, desconfiem e denunciem. Aqui não tem espaço para fake news! Isso é crime e os responsáveis terão que responder na Justiça", escreveu Randolfe.

Com André Phelipe, especial para o Correio

 

 

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postado em 15/07/2024 03:55
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