O presidente da Argentina, Javier Milei, chega amanhã ao Brasil para participar do congresso da Conservative Political Action Conference (CPAC), em Balneário Camboriú (SC). A vinda foi confirmada formalmente, ontem, pela embaixada argentina em Brasília ao Ministério das Relações Exteriores (MRE). O evento, que reunirá boa parte dos expoentes da extrema direita brasileira, contará com a participação do ex-presidente Jair Bolsonaro e da ex-primeira-dama Michelle. No governo brasileiro, a vinda de Milei é tratada com discrição, até porque há pouco a fazer.
"O protocolo, nesses casos, não é rígido como nas visitas oficiais (de chefes de Estado e de governo)", disse um embaixador de primeira classe ouvido pelo Correio.
Do Itamaraty, o único apoio que ele terá ao desembarcar em Florianópolis será no desembaraço alfandegário e nos trâmites de conferência dos passaportes oficiais. A Força Aérea Brasileira foi informada da chegada do avião do governo argentino. Toda a logística que envolve a visita não oficial ficará sob a responsabilidade dos organizadores do evento, que têm o apoio do governador catarinense Jorginho Melo (PL).
Na embaixada da Argentina, a determinação é para que não haja declarações oficiais sobre a agenda de Milei a Balneário Camboriú. Mesmo assim, a presença do presidente argentino em solo brasileiro será monitorada pelo MRE e pelo Palácio do Planalto.
A estratégia de não dar importância à visita é compartilhada tanto pela diplomacia de carreira em Brasília e em Buenos Aires na linha da redução de danos, caso haja alguma declaração extremada do argentino, para não atrapalhar as relações bilaterais dos dois países. Mesmo sem a perspectiva de esgarçamento das relações entre os dois países, o embaixador aposentado Paulo Roberto de Almeida aponta que a postura de Milei é "antidiplomática".
"Milei repete o comportamento grosseiro de alguns de seus colegas, como (o ex-presidente dos Estados Unidos Donald) Trump e Bolsonaro, no desrespeito às normas mais elementares da vida política e, até, da mera cortesia, se permitindo ofender outros chefes de Estado ou de governo, rompendo com as mais comezinhas regras diplomáticas. Como presidente da Argentina, um Estado-membro do Mercosul, Milei despreza os interesses de seu próprio país, ao deixar de comparecer à próxima reunião de cúpula do bloco, para participar de um conclave de sua linha política", observa o embaixador.
A orientação é não alimentar nenhuma polêmica. Dois incidentes recentes envolvendo Milei em viagens não oficiais servem para balizar uma possível reação do governo brasileiro. Na Espanha, em maio, ele ofendeu a mulher do presidente Pedro Sánchez, chamando-a de "corrupta". O argentino participava de um encontro do Vox, organização de extrema direita espanhola. A reação da Chancelaria de Madri foi chamar de volta o embaixador em Buenos Aires, um gesto duro nas relações democráticas.
Três meses antes, em viagem aos Estados Unidos para participar de uma conferência da extrema direita, Milei encontrou-se com o pré-candidato republicano à Casa Branca, Donald Trump, e ignorou o presidente Joe Biden. Não houve nenhum comentário do governo norte-americano e a repercussão na mídia local foi quase zero. "Esse é o melhor cenário", comentou uma fonte do Itamaraty ouvida pelo Correio.
Mas enquanto Milei segue contrariando protocolos das relações internacionais, a diplomacia dos dois países continua trabalhando. Ontem, o MRE finalizou o acordo com os argentinos para renovar a concessão da empresa argentina Mercovía, que deve seguir responsável pela Ponte Internacional São Borja-Santo Tomé (RS), na fronteira entre os dois países. Pela ponte passa quase metade de todo o comércio bilateral entre o Brasil e a Argentina.
Diplomatas ouvidos pelo Correio reforçam que os laços comerciais entre os países são fortes. "Não há por que ficar alimentando a loucura de Milei. O Itamaraty não tem que ficar passando recibo", disse um integrante do MRE.
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