Lisboa — O Judiciário está praticamente fechado com a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre porte de maconha para uso pessoal, tema que norteou parte dos debates no segundo dia do XII Fórum de Lisboa. Ao longo desses dois primeiros dias de diálogos, pelo menos dois momentos deixaram clara a posição dos magistrados a favor do entendimento da Corte.
Logo pela manhã, a ministra Daniela Teixeira, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), foi aplaudida de pé ao defender que crimes de menor potencial ofensivo sejam tratados com equilíbrio e que não tomem uma quantidade desproporcional de tempo de magistrados nas mais altas Cortes do país. "A proposta acadêmica que eu trago é de fazermos uma revisão de quem queremos prender no Brasil de 2024 daqui para a frente", disse.
Enquanto isso, em outro painel, sobre criminalidade transnacional e virtual, o desembargador do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), Ney Bello, foi incisivo: "Em vez de nos preocuparmos com o menino com dois cigarros de maconha, por que não nos ocupamos do tráfico de armas? Há um desvio de foco e é preciso que se ocupe com criminalidade de grande porte", defendeu, ao participar do debate sobre Criminalidade transnacional e virtual, ao lado de dois ministros do STJ, Sebastião Reis e Rogério Schietti.
Em seu painel, Daniela informou que tramitam atualmente 925 mil habeas corpus no STJ. A média diária por ministro é de 90 novos processos. A maioria, mostrou a juíza, não precisaria chegar à Corte, observado o princípio da insignificância. São furtos de itens como xampu, refrigerante e chinelo, além de prisões por porte de drogas que, se a decisão do STF já estivesse em vigor, não resultariam em detenção.
"Nós estamos julgando, punindo e prendendo as pessoas erradas no Brasil", atestou a magistrada, referindo-se a crimes de menor potencial de maneira geral. Ela mostrou dados para corroborar a conclusão: dos cerca de 860 mil presos no país, 319 mil cometeram crimes violentos. "Existem medidas restritivas de direito diversas da prisão. Eu tenho o caso do furto de um chinelo usado. É inadmissível que esse caso chegue ao Superior Tribunal de Justiça", criticou.
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Em relação à investigação dos crimes de maneira geral, Schietti defendeu que não se coloque a confissão como o principal meio de prova. "Destronamos a confissão como meio de prova", afirmou, defendendo a inteligência policial como uma forma mais segura de obtenção de provas.
Sobre crimes de menor potencial ofensivo, o ministro Sebastião Reis, que acompanha de perto a situação dos presídios, considera que a decisão do STF sobre drogas "foi um passo importante para mudança de rumo em nossa política criminal". "Prisão e punição severa não são soluções para a criminalidade. Temos feito isso há anos, e hoje temos cerca de 800 mil presos, com 60% dos presídios com superlotação. O caminho é educação, saúde e emprego", frisou.
O presidente do STF, Luís Roberto Barroso, afirmou que a Corte julga as ações que chegam lá, inclusive os habeas corpus e os recursos extraordinários de pessoas que são presas, às vezes, com pequenas quantidades de drogas. "Somos obrigados a ser capazes de distinguir entre o que seja porte para consumo pessoal, que não gera pena de prisão, e o que seja tráfico, que gera pena de prisão. Quem prende ou não prende alguém é o Judiciário. Portanto, o Judiciário precisa saber qual critério utilizar", sustentou.
A declaração de Barroso foi resposta a uma pergunta sobre novas críticas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva à postura do STF de julgar casos relativos a drogas.
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