O ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, afirmou que o governo Lula não apoiará o projeto que criminaliza e equipara a pena para quem fizer abortos após as 22 semanas de gestação ao homicídio.
A declaração foi feita nesta sexta-feira (14/6) durante entrevista coletiva e compartilhada por Padilha no Instagram. "Não contem com o governo pra qualquer mudança na legislação do aborto no país. Ainda mais um projeto que estabelece uma pena para meninas e mulheres estupradas que pode ser até duas vezes maior que para o estuprador", afirmou o ministro responsável pela articulação política do governo junto ao Congresso.
Padilha não é o único ministro de Lula a se posicionar contra a medida. Marina Silva, do Meio Ambiente, também criticou a proposta e disse que se trata de um retrocesso. Silvio Almeida, dos Direitos Humanos, classificou o projeto como "imoralidade" e "inversão dos valores civilizatórios. Cida Gonçalves, ministra das Mulheres, afirmou que a medida revitimiza a mulher estuprada. Na mesma linha, a primeira-dama Janja, afirmou que é necessário acolher as vítimas e não provocar mais sofrimento.
Após a manifestação da primeira-dama, o autor da proposta, Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), disse que é não novidade que Janja é 'abortista'. Agora, ele cobra uma posição do presidente Lula, que está na Itália, participando da cúpula do G7.
Conanda critica proposta
O Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda), órgão responsável pela formulação, deliberação e controle das políticas públicas para a infância e a adolescência na
esfera federal, divulgou nota em que faz uma severa crítica Projeto de Lei 1904/2024. "Representa um retrocesso aos direitos de crianças e adolescentes, aos direitos reprodutivos e à proteção das vítimas de violência sexual, violando a Constituição Federal, o Estatuto da Criança e do Adolescente e diversas normas internacionais das quais o Brasil é signatário", diz trecho do documento.
A nota do Conanda cita dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública para embasar a argumentação. Em 2022, oito em cada 10 vítimas de violência sexual eram crianças e adolescentes e 61,4% das vítimas de estupro tinham, no máximo, 13 anos. Com 56.820 registros, houve um incremento de 8,6% nos casos de estupro de vulnerável.
"Trata-se de um cenário que deveria atrair a atenção do Congresso no sentido de ampliação da proteção, e não de punir e restringir os direitos de mulheres e, especialmente, de crianças e adolescentes, detentoras da garantia de seus direitos com absoluta prioridade, conforme preconizado pelo artigo 227 da Constituição Federal, em evidente violação ao princípio da vedação ao retrocesso social", critica a nota do Conanda.
O texto prossegue destacando o maior sofrimento que será imposto especialmente às meninas negras. Ainda segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública, em 2022, 56,8% das vítimas de estupro e estupro de vulnerável eram pretas ou pardas, evidenciando também um aumento desse indicador com relação aos anos anteriores. "A gestação, como a concretização de uma situação de estupro e a obrigatoriedade do prosseguimento da gravidez é uma nova violência, um processo de revitimização agora imposto pelo Estado brasileiro, e que pode ser comparado com situações de tortura", comenta a nota do Conanda. "Projeto de Lei 1904/2024 impõe sofrimento, tortura e coloca em risco a saúde, a integridade física e mental e a dignidade de milhares de crianças e adolescentes, que são cotidianamente violentadas sexualmente em nosso país", conclui o texto.
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