Segundo a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), o Brasil é o segundo país em proporção de jovens entre 18 e 24 anos que não estudam nem trabalham, atrás apenas da África do Sul, num total de 37 países analisados. Os motivos desses jovens estarem sem estudar e sem trabalhar variam conforme a renda familiar, porém, se encontram nessa condição principalmente os mais pobres. Jovens que não estudam, não trabalham e nem procuram emprego majoritariamente moram nas periferias das cidades brasileiras.
A Subsecretaria de Estatísticas e Estudos do Trabalho, do Ministério do Trabalho e Emprego, avalia que dos 207 milhões de habitantes do Brasil, 17% são jovens de 14 a 24 anos, dos quais 5,2 milhões estão desempregados. Ou seja, são 55% das pessoas que procuram emprego e não acham, num universo de 9,4 milhões, dos quais 52% são mulheres e 66% são pretos e pardos. Aqueles que nem trabalham nem estudam e nem procuram emprego — os chamados nem-nem — somam 7,1 milhões, sendo que 60% são mulheres, a maioria com filhos pequenos, e 68% são pretos e pardos.
Cristovam Buarque, ex-governador do Distrito Federal e ex-reitor da Universidade de Brasília, em sua pregação incansável pela educação de qualidade para todos, atribui boa parte da desocupação dos jovens às distorções do nosso sistema de ensino. Uma delas é o fato de que damos mais importância ao ensino universitário do que à educação básica — isto é, os ensinos infantil, fundamental e médio. Diz que o Brasil só vai resolver o problema da desigualdade social quando o filho do pobre tiver uma escola tão boa quanto a do filho do rico, de preferência estudando juntos.
É mais ou menos consensual a conclusão de que, em grande parte, o desinteresse dos jovens pela escola é resultado da má qualidade do ensino, um fenômeno que agora também chegou às universidades, com altos índices de evasão. As mudanças tecnológicas e seus impactos no mercado de trabalho, com a precarização de muitas profissões e o surgimento de novas atividades profissionais ou oportunidades de negócios, ligados às redes sociais e novas tecnologias digitais, fazem com que o desinteresse pela escola cresça entre os jovens, inclusive os de classe média.
Diante disso, chega a ser patético o que está acontecendo com as universidades federais, que deveriam ser a vanguarda da educação voltada para esses novos tempos, com as aulas paralisadas por mais de 60 dias em razão de uma greve de professores e funcionários. Reivindica-se vantagens corporativas sem se dispor a discutir o papel que deveriam ocupar diante da nova realidade, para aumentar a qualidade do ensino, a produtividade científica e a integração às atividades econômicas à realidade social do país.
Fracasso político
Ninguém deve se surpreender: a ultrapassagem da sociedade industrial e sua estrutura de classes faz com que um número crescente de jovens deseje mudanças numa direção radicalmente inversa àquela que pautou a segunda metade do século passado. As utopias de esquerda já não têm o mesmo apelo. Na França, 36% dos jovens de 18 a 24 anos apoiam o Rally Nacional (RN), de Marine Le Pen, enquanto 31% apoiam o Partido da Liberdade (PVV), de Geert Wilders, nos Países Baixos.
Crises econômicas, como a de 2008 e a pandemia, podem ter colaborado para isso, mas é preciso buscar causas mais profundas da apatia e do desengajamento da juventude. O fracasso da escola diante das mudanças que ocorrem nas estruturas produtivas e nas formas de relacionamento social é uma delas. Se a escola e a democracia não oferecem um caminho para o futuro desejado, surgem outras vias atraentes.
O reacionarismo, que se baseia num passado imaginário, oferece soluções simplificadas e a velha ordem. No nosso caso, nada mais ultrapassado do que a escola cívico-militar, que acaba de ser adotada também pelo governo de São Paulo. Quando jovens não querem estudar, parte dos eleitores sonha com a volta da régua e da palmatória, além de outras formas de castigo para que os jovens rebeldes, lentos ou dispersivos garantam o futuro.
Jovens universitários norte-americanos e de outros países que protestam contra as ações de Israel em Gaza são uma esperança de que nem tudo está perdido. Mas será que também não estão com a cabeça no passado e, por isso, não representam a maioria? Nos Estados Unidos, um país de oportunidades e liberdade de escolhas, é um espanto a emergência da xenofobia contra os imigrantes e o supremacismo racial, que dão resiliência a Donald Trump, agora condenado por um tribunal de Nova York.
O novo estilo de vida oferecido aos jovens nas redes sociais é pautado pelo sucesso individual, via empreendedorismo, e na lei do mais forte. Nesse darwinismo social, somente sobreviverá quem se adaptar à nova realidade por esforço próprio. Num país como o Brasil, isso significa aprofundar nossas desigualdades sociais.
A ordem democrática em que vivemos é resultado do encontro de duas gerações: a que viveu o golpe militar de 1964 e aquela que protagonizou a democratização do país, liderada por políticos que construíram essa ponte — como Ulysses Guimarães, Tancredo Neves, José Sarney, Leonel Brizola e Miguel Arraes. Entretanto, para os nossos jovens, a atual elite política fracassou.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que está no terceiro mandato, é sócio desse fracasso. Entretanto, ainda tem tempo para pensar fora da caixinha e apostar na educação. É a via de combate às desigualdades e ao obscurantismo.
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