O Ministério Público Federal (MPF) pediu ao Supremo Tribunal Federal (STF) a revisão da decisão monocrática do ministro Dias Toffoli, que anulou todos os atos da 13ª Vara Federal de Curitiba contra o empresário Marcelo Odebrecht, no contexto da Operação Lava-Jato. Por meio de agravo interno, o procurador-geral da República, Paulo Gonet, solicitou a reconsideração da decisão pelo próprio ministro ou que o caso seja levado ao plenário do Supremo.
A decisão de Toffoli foi provocada por um pedido da defesa de Marcelo, na qual pleiteava a extensão de duas decisões anteriores do próprio ministro, que anularam todos os atos praticados pela 13ª Vara sob o argumento de "conluio processual" entre o então juiz federal Sergio Moro e os procuradores da força-tarefa da Lava-Jato, que investigava o escândalo da Petrobras e outros delitos. No mês passado, o pedido foi aceito pelo ministro do STF, que anulou todas as provas.
Gonet ponderou que os casos são diferentes e a anulação dos atos não deveria ser estendida ao acordo de leniência de Marcelo, que fez um acerto de delação premiada com a Justiça, assinado por Moro — à época responsável pelos processos da Lava-Jato em primeira instância. Segundo argumenta o MPF, o pedido de extensão deve ter estreita simetria com o pedido originário e com o que o tribunal nele decidiu: "Há aqui a falta de correlação estrita entre o pedido e a decisão tomada no decisório que poderia servir de paradigma", avalia.
O acordo de leniência anulado por Toffoli foi assinado em dezembro de 2016 com o MPF do Paraná, que conduzia a Lava-Jato, coordenada pelo ex-procurador Deltan Dallagnol. O Ministério Público Federal alega ter a prerrogativa de firmar esse tipo de acordo. Entretanto, a Lei Anticorrupção, de 2013 — na qual o acordo de leniência é previsto — diz que somente a Controladoria-Geral da União (CGU) pode fazer acordos nos casos relacionados ao Poder Executivo federal e contra a administração pública estrangeira.
A Odebrecht foi investigada na Lava-Jato por um esquema de propina revelado com detalhes no acordo de leniência de Marcelo Odebrecht. O livro A Organização (Companhia das Letras), da jornalista Malu Gaspar, conta o caso em detalhes. Gonet lembra que Marcelo confessou a prática de crimes contra a administração pública, bem como diversos executivos da empresa, sob a supervisão final do STF.
"Não há, desse modo, como anular as investigações e processos, que decorreram desse acordo, e que agora seguem curso nas instâncias ordinárias", argumenta.
Moro e os procuradores da Força-Tarefa de Curitiba adotaram métodos heterodoxos de investigação. O ex-juiz foi considerado suspeito para julgar os casos e as provas estão sendo anuladas uma a uma, por terem sido obtidas sem respeitar o chamado devido processo legal. O caso de Marcelo praticamente fecha a tampa do caixão da Lava-Jato, embora o procurador-geral da República ainda tenha a esperança de mitigar a decisão para salvar o acordo de leniência.
Empreiteiras
Dificilmente Toffoli fará a revisão de sua decisão monocrática e, provavelmente, submeterá o pedido da PGR aos demais membros da Segunda Turma do STF: os ministros Gilmar Mendes, Edson Fachin, Nunes Marques e André Mendonça. Com exceção de Fachin, todos são considerados "garantistas" — isto é, advogam o estrito respeito aos ritos do processo penal.
Deflagrada em 2014 pela Justiça Federal, a Lava-Jato investigou um grande esquema de lavagem e desvio de dinheiro no país. Começou com a descoberta de um esquema de lavagem de dinheiro em um posto de gasolina de Brasília, envolvendo o ex-deputado federal José Janene e os doleiros Alberto Youssef e Carlos Habib Chater.
Uma rede de doleiros que atuava em várias regiões do Brasil, por meio de empresas de fachada, contas em paraísos fiscais e contratos de importação fictícios, "lavava" o dinheiro desviado da administração pública. Nas duas primeiras fases da operação, foram executados 119 mandatos de busca e apreensão, 30 mandados de prisão e 25 mandados de condução coercitiva. Entre os presos, estavam Paulo Roberto Costa (ex-diretor da Petrobras) e Youssef, que realizaram um acordo de delação premiada — ou seja, passaram a contribuir com as investigações em troca de benefícios.
Executivos da Petrobras, vários políticos do PP, do PT e do MDB, as empreiteiras Odebrecht, Andrade Gutierrez, OAS, Camargo Correia, Queiroz Galvão, Galvão Engenharia, Mendes Júnior, Engevix e UTC, e diversas empresas de outros ramos estavam envolvidos. O esquema também incluía grandes obras públicas de infraestrutura, como a construção da Usina Nuclear Angra 3, a Ferrovia Norte-sul e as obras realizadas para a Copa do Mundo, como a reforma do Maracanã.
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