As revelações do inquérito que investiga os assassinatos da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes, conhecidas na manhã do domingo de 24 de março, com as prisões de três acusados de serem os mandantes do crime, apontavam para um rápido desfecho sobre o destino do mandato do deputado Chiquinho Brazão (sem partido-RJ), o que não ocorreu.
Para a jornalista Fernanda Chaves, sobrevivente daquele atentado, e que estava sentada no banco de trás do carro ao lado de Marielle, a manutenção da prisão de Brazão na Câmara deveria ter sido aprovada por unanimidade, que, dada a dimensão do caso e da contundência da investigação, seria algo fácil.
Depois de um pedido de vista protelatório na Comissão de Constituição de Justiça, que paralisou o caso por duas semanas, o plenário da Câmara aprovou a decisão de mantê-lo encarcerado, com 277 votos a favor, 20 votos a mais do que os 257 necessários. E foram 129 contrários, 28 abstenções e 79 ausentes. Antes, a CCJ havia aprovado o mérito por 39 a 25.
"Num primeiro momento, era tido como óbvia a manutenção da prisão do deputado no plenário. Não tinha como se discutir uma acusação com uma implicação dessa monta, um caso que envolve um dos principais crimes políticos da história do Brasil, que ganhou o mundo. O mundo pergunta quem mandou matar Marielle e Anderson. Há uma cobrança internacional", disse Fernanda Chaves, em entrevista ao CB.Poder nesta segunda-feira (29/4). O programa é uma parceria do Correio com a TV Brasília.
"A minha avaliação é que a prisão ia passar fácil. Aí, foi adiado. E percebemos uma articulação, de que não seria tão fácil. Foi outro choque. Foram choques atrás de choques. A manutenção da prisão era para passar por unanimidade, fácil até. Por maioria ampla e absoluta. Mas, não. E foi suado", completou a jornalista, que contou que se tratar de um aprovação que nem era para ser comemorada.
"No plenário, eram preciso 257 votos, e passou por 20 votos a mais. A gente até comemorou, mas é absurdo até comemorar esse momento triste, deprimente, que é o envolvimento de uma autoridade num assassinato desse tamanho. E ainda foi preciso de voto a voto. Chamar daqui, chamar dali (deputados para votarem)".
Fernanda Chaves trabalha no Congresso Nacional e tem a expectativa de que o mandato de Chiquinho Brazão seja cassado. O caso nesse colegiado está vagoroso. Somente sexta passada (26), um mês após a abertura da ação, é que foi definida a relatora, a petista Jack Rocha (ES). Quatro parlamentares sorteados anteriormente desistiram de ter que lidar com o processo de um deputado acusado de mandante de crime de repercussão internacional.
A jornalista falou ainda da iminência de ter que voltar a conviver no mesmo espaço com Brazão, no Congresso, caso os deputados tivessem optado pela soltura do parlamentar fluminense. Ainda que preso, ele segue no mandato, com seu gabinete funcionando e ele com direito a receber receber recursos de emenda parlamentar.
"Seria inimaginável. Impensável. Imagine para mim ter que trabalhar no Congresso com ele. Cruzei com o deputado em alguns momentos. Era perturbador ter que respirar o mesmo oxigênio que o acusado de mandar matar a Marielle e fuzilar o carro que ela estava, e eu também. Não só para mim, mas também para os correligionários de Marielle."
A sobrevivente do atentado contra Marielle falou também da decepção com o surgimento de dois delegados da Polícia Civil que estavam na investigação à época e que apareceram envolvidos no crime.
"Foi um choque quando chegaram as notícias da prisão dos irmãos Brazão e do delegado (Rivaldo Barbosa), que na época era o chefe da Polícia Civil. Tinha acabado de ser nomeado. E foi muito próximo da investigação O Rivaldo sempre foi tido como alguém do campo progressista, sério, que idealizou a Delegacia de Homicídio do Rio, especializada em crimes de homicídio. Foi chocante. Tínhamos o Rivaldo como uma referência, uma pessoa de confiança. Foi muito chocante. Diferente dos irmãos Brazão, que já tinham aparecido no início da investigação, depois foi deixado de lado e voltaram para a linha de investigação", afirmou também a entrevistada.
Os advogados do delegado Rivaldo Barbosa pediram hoje ao Supremo Tribunal Federal (STF) para que o policial preste depoimento no caso. No pedido, encaminhado ao ministro Alexandre de Moraes, a defesa também solicita que Erika Araújo, esposa de Rivaldo, seja ouvida no processo.