Nos atos para lembrar as violações dos 60 anos do golpe militar, a Comissão de Anistia e dois colegiados da Câmara dos Deputados realizarão uma sessão especial, no dia 3 de abril, que culminará com a aprovação da condição de anistiada política da publicitária Clarice Herzog, perseguida pelos militares pela atuação pedindo esclarecimentos sobre o assassinato de seu marido, o jornalista Vladimir Herzog, ocorrido em 25 de outubro de 1975, nas dependências do Centro de Operações de Defesa Interna (Doi-Codi), em São Paulo, depois de ter sido preso e torturado.
Sessão ocorrerá no auditório Nereu Ramos, o maior da Câmara, numa parceria também com as comissões de Legislação Participativa e de Direitos Humanos da casa. E se dará durante o seminário Lembrar para que nunca mais se repita, alusivo aos 60 anos do golpe. O autor do requerimento foi o deputado Leonardo Monteiro (PT-MG).
Clarice Herzog iniciou uma mobilização para esclarecer a morte de "VLado", como era conhecido o jornalista, e incomodou o regime na sua busca pela verdade e justiça.
Para o Estado, Herzog, que apareceu enforcado na cela, teria se suicidado. Em 2013, a família obteve na Justiça a alteração no seu atestado de óbito, onde deixou de constar como causa da morte "asfixia mecânica por enforcamento" e foi substituída por "lesões e maus tratos sofridos durante o interrogatório em dependência do 2º Exército (Doi-Codi)".
Clarice nunca acreditou na versão "oficial". Logo, denunciou: "mataram o Vlado". Sua história e luta virou filme, livro e uma citação de seu nome na canção "O bêbado e o equilibrista" ,música de João Bosco e letra de Aldir Blanc, que virou um hino da anistia, quando os exilados começaram a retornar ao Brasil, ainda no período militar.
"Choram Marias e Clarices, no solo do Brasil", são os versos que remetem à luta da publicitária. A Maria citada, é uma referência à filha do metalúrgico Manuel Fiel Filho, que apareceu também enforcado depois de ter sido preso no Doi-Codi, em janeiro de 1976.
Clarice ficou viúva aos 34 anos. Sua história é perfilada no livro Heroínas desta História (Autêntica Editora), em parceria com o Instituto Vladimir Herzog, uma organização da sociedade civil, criada em 2009 pela família, "para celebrar a vida e o legado de Herzog".
A presidente da Comissão de Anistia, Eneá de Stutz e Almeida comentou a relevância histórica desse julgamento.
"Nestes 60 anos do golpe, é muito importante a gente dar um destaque em especial, ainda que em abril, pensando também no mês de março, que tem o Dia Internacional da Mulher, a história de uma pessoa com uma relevância tão grande quanto a Clarice Herzog, que é uma heroína do povo brasileiro. E sua história merece ser conhecida pelas novas gerações para que nós não tenhamos essa história de Estado de exceção, de abusos contra os direitos humanos perpetrados pelo Estado brasileiro repetida no nosso país", disse Eneá de Stutz e Almeida, presidente da Comissão de Anistia, vinculada ao Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania.
"Então, a comissão está atendendo a uma solicitação feita pela Câmara dos Deputados para apreciar o requerimento da Clarice e assim contar sua história e trazer a memória do povo brasileiro a luta da vida inteira de uma mulher, uma guerreira que lutou e luta sempre pela democracia. E que pagou um alto preço pessoal por isso", completou.