Um dia depois da escolha conturbada de alguns presidentes de comissões temáticas da Câmara dos Deputados, as indicações feitas pelos bolsonaristas prenunciam sérias dores de cabeça para o governo. A derrota foi sentida entre os apoiadores do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, tanto que, ontem, os governistas tentavam superar a ressaca reorganizando a tropa e revendo estratégias que impeçam os colegiados de se tornarem palcos para ataques ao Palácio do Planalto.
O golpe mais difícil de digerir foi a eleição de Nikolas Ferreira (PL-MG) para presidir a Comissão de Educação. A presidente do PT, a deputada Gleisi Hoffmann (PR), foi às redes para condenar, enfaticamente, a escolha do parlamentar mineiro para o comando da comissão. Também criticou a escolha de Caroline de Toni (PL-SC) para presidir a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ).
"O PL indicou gente radical demais, desrespeitosa para a CCJ e mal-educada, como o deputado que vai presidir a Comissão da Educação. Isso depõe contra a própria Câmara, infelizmente. É lamentável", criticou Gleisi.
A escolha de Nikolas desagradou até mesmo quem não está no Congresso, como o empresário João Amoêdo, que concorreu à Presidência da República pelo Novo, em 2018 — ele classificou a indicação do deputado como "vergonha" e defendeu que seja substituído.
"Os líderes partidários deveriam pressionar o PL para reverter essa nomeação e indicar um nome adequado, e não um deputado sem nenhuma experiência com o tema e que busca relevância apenas com polêmicas", cobrou Amoêdo.
Nikolas respondeu às críticas, mas se referiu à presidente do PT como "desequilibrada e antidemocrática". Disse, porém, que o PT será ouvido na comissão: "Diferentemente da Venezuela, a oposição terá liberdade e seu lugar de fala", garantiu.
Já Caroline de Toni evitou reagir a manifestações de desagrado. Preferiu agradecer pela indicação ao comando da CCJ ao ex-presidente Jair Bolsonaro. A parlamentar afirmou que atuará de forma isenta e que a pauta de projetos respeitará a proporcionalidade dos partidos. Mas deixou um recado: "Sendo uma conservadora, digo que os conservadores tiveram votações históricas (nas eleições). E essa pauta tem que ser respeitada", afirmou.
"Um orgulho"
Apesar das pressões dos governistas, o líder do PL na Câmara, Altineu Côrtes (RJ), afastou a hipótese de trocar os nomes que indiciou — disse, inclusive, que Nikolas é "um orgulho" para o partido. As escolhas da legenda são uma estratégia para manter o clima de acirramento com o PT, de olho também nas eleições.
A manobra embute, ainda, o incômodo do PL com o governo por conta das ações de busca e apreensão da Polícia Federal (PF) contra dois parlamentares da legenda — Carlos Jordy e Alexandre Ramagem, ambos do Rio de Janeiro. Por causa das operações, ocorridas em janeiro, o partido perdeu dois potenciais candidatos às prefeituras da capital fluminense (Ramagem) e de Niterói (Jordy).
Outro problema para o governo está na Comissão de Segurança Pública, cujo presidente é o deputado Alberto Fraga (PL-DF), um dos chefes da "bancada da bala". O colegiado, aliás, seguirá controlado por parlamentares vinculados às polícias: são nove delegados, quatro coronéis, três sargentos, um capitão e vários agentes federais entre os 37 titulares.
Fraga anunciou sua pauta prioritária: tornar menos rígido o controle de armas aos CACs — caçadores, atiradores e colecionadores. Ele procurará o ministro da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Lewandowski, para tratar do tema.
"Vou dizer ao ministro que o decreto massacra os comerciantes. É um absurdo o que estão fazendo com os CACs, estão marginalizando eles. Se não tiver diálogo, vamos fazer o que tem de ser feito", ameaçou Fraga.
Outra derrota para o governo foi a escolha do deputado Pastor Eurico (PL-PE) para presidir a Comissão de Previdência, Assistência Social, Infância, Adolescência e Família, que analisa e julga pautas de costume. Ele relatou o Projeto de Lei (PL) 580/07, que proíbe o casamento homoafetivo no Brasil. O parlamentar, porém, garantiu que "não vai ter retaliação" aos governistas.
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