Lisboa — A governadora do Rio Grande do Norte, Fátima Bezerra (PT), fez um périplo nos últimos dias por Portugal com uma missão clara: mostrar para os turistas estrangeiros, em especial, os portugueses, que é seguro viajar para o estado. O trabalho de convencimento, que ocupou boa parte da agenda dela na Bolsa de Turismo de Lisboa, coincidiu com a fuga de dois presos da penitenciária federal de Mossoró, no interior potiguar. Sempre que questionada sobre assunto, recorria a números para mostrar que os índices locais de violência despencaram, resultado de um trabalho de gestão, que passou pela criação de uma secretaria só para cuidar do sistema prisional. Mais: o controle da cadeia de Mossoró é de responsabilidade exclusiva do governo federal.
“Em 2018, o Rio Grande do Norte era o estado mais violento do Brasil. No ano passado, segundo dados do Ministério da Justiça, foi a unidade da Federação que mais reduziu as mortes violentas. Nossos índices caíram 15,6% contra menos de 4% de média nacional”, diz a governadora. Ela reconhece, porém, que há muito ainda por ser feito na área de segurança, sobretudo, na reposição de pessoal nas polícias e na renovação de equipamentos. “Desde 2019, foram realizados nove concursos. Estamos repondo as vagas gradualmente, dentro dos limites da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). “Havia áreas que ficaram sem concursos por 20 anos. Portanto, o deficit é grande”, acrescenta.
Durante a feira de turismo em Lisboa, uma das maiores do mundo no setor, Fátima Bezerra apresentou o Rio Grande do Norte como o estado mais verde do Brasil, por ser campeão nacional em produção de energia renovável. Também exaltou as belezas dos 400 quilômetros de costa litorânea. Ela reconhece, porém, que é preciso muito mais para atrair os viajantes estrangeiros, que, além de segurança, querem passagens mais baratas, boa infraestrutura hoteleira e de restaurantes. No ano passado, mais de 70 mil estrangeiros aterrissaram em território potiguar. A seguir, os principais trechos da entrevista concedida ao Correio.
Qual o impacto da violência na imagem no estado? Recentemente, houve uma fuga de dois presos da penitenciária de Mossoró, a primeira de uma cadeia de segurança máxima.
É claro que um episódio como esse, que é muito delicado, impacta. Infelizmente, há dificuldade, inclusive, de recaptura desses fugitivos. Agora, me permite aqui, de uma forma muito séria, separar as coisas. Isso aconteceu em uma prisão federal, sob gestão do governo federal. É evidente que o governo do estado fez e continua fazendo o seu papel, chegando junto. O ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, desde o primeiro momento, entrou em contato conosco, que se mantém permanente. Há um trabalho integrado em toda a operação, sob a coordenação do secretário Nacional de Política Penal e da Polícia Federal, com o governo estadual apoiando, como é o nosso dever, disponibilizando efetivo e equipamentos. Então, estamos todos empenhados. Ao mesmo tempo, vale destacar que, em decorrência desse incidente, as medidas corretivas já estão em curso, porque não basta só recapturar esses fugitivos, o mais importante é corrigir todas as falhas que permitiram esse tipo de coisa. O governo federal realmente está muito atento, muito empenhado na correção dessas falhas.
Como a senhora viu a transferência de presos da penitenciária de Mossoró, entre eles, Fernandinho Beira-mar, para outros estados?
O que eu posso dizer é que isso faz para da política de gestão do sistema prisional federal. De tempos em tempos, o Ministério da Justiça faz esse rodízio por questão de segurança.
Como estão os níveis de violência no Rio Grande do Norte?
O nosso sistema prisional está sob controle, está seguro. Se olharmos os rankings de 2023 sobre fugas de presídios, no Rio Grande do Norte foi zero. Desde que nós assumimos, a partir de 2019, a curva se inverteu, com redução da violência. Até 2018, o Rio Grande do Norte aparecia como o estado mais violento do Brasil. O mais recente anuário da segurança pública, do Ministério da Justiça, aponta que, em 2023, entre os 26 estados e o Distrito Federal, o Rio Grande do Norte aparece em primeiro lugar, como o que mais reduziu os índices de criminalidade, no item mortes violentas. De 2022 para 2023, houve redução de 15,6%, queda muito maior do que a média nacional, que foi abaixo de 4%. Também estamos reduzindo os crimes contra o patrimônio e os assaltos. O carnaval deste ano, quando houve a fuga de Mossoró, foi o mais seguro da história. Em 2022, houve 14 mortes violentas, neste ano, foram seis, com um detalhe, nenhuma relacionada com o polo carnavalesco. É preciso que se ressalte isso. São dados concretos, nada está sendo inventado.
A que essa a senhora atribui a queda nos índices de violência?
Trabalho, gestão. Mesmo pegando um estado desmantelado como eu peguei, em 2019, foi possível superar as dificuldades. Estamos investindo muito na área de segurança. Fizemos nove concursos para as polícias penal, civil, militar e bombeiros. Estamos repondo as vagas de forma gradativa, dentro dos limites da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), pois o deficit de pessoal é muito grande. Em algumas áreas, foram quase 20 anos sem concursos. Outro ponto: o Rio Grande do Norte passou 30 anos com cinco delegacias de atendimento a mulher. Em quatro anos, abri sete. Assim, na segurança pública, os dados são de queda, não de aumento da violência.
Há uma estrutura específica dentro do governo para cuidar do sistema prisional?
Sim. No meu primeiro mandato, foi criada a Secretaria de Administração Penitenciária, o que se comprovou, aliás, extremamente necessário, sem dúvida nenhuma. Os especialistas realmente recomendam que haja uma estrutura direcionada para cuidar do sistema prisional. Evidentemente, há uma conexão com todo o sistema de segurança. Isso fez uma diferença grande. Não há como não ter uma estrutura direcionada para uma área tão complexa, como o sistema prisional no Brasil. A secretaria, por sinal, está sob o comando de pessoas muito preparadas.
Segurança tem muito a ver com turismo. Muito estrangeiros se recusam a ir para o Brasil temendo a violência. Como está a situação nesse setor no estado?
O turismo tem crescido muito, sobretudo de estrangeiros. Tanto que o número de voos ligando Lisboa a Natal passou de três para sete durante a semana. Em 2023, foram 70.912 passageiros internacionais. O ano passado começou com três voos, que passaram para cinco e, agora, são sete. Comparando apenas o segundo semestre em relação ao primeiro, houve aumento de 30% no número de turistas.
Mas ainda há muito espaço para crescer. O que é preciso fazer?
Com certeza, o espaço é enorme. Para isso, temos feito e vamos intensificar a promoção das belezas do estado, capacitar ainda mais todos os setores envolvidos e ampliar a nossa acessibilidade.
O que o Rio Grande do Norte tem para oferecer aos turistas?
Primeiro, temos o estado mais verde do Brasil e do mundo. Isso porque nós fizemos o dever de casa e temos 95% da energia que produzimos de fontes renováveis. Praticamente tudo vem de energia eólica, do vento. O Brasil ocupa espaço de destaque mundial nesse quesito de energia limpa graças à produção advinda do Nordeste, que está no centro da agenda da mudança climática, da transição energética. O país tem hoje 937 parques eólicos, dos quais 827 estão no Nordeste e, desses, mais de 250 estão no Rio Grande do Norte. Neste exato momento, o nosso estado está completando uma década como maior produtor de energia eólica do Brasil. Produzimos 7,4 gigawatts de energia e consumimos apenas 2,2 gigawatts. O restante abastece o sistema interligado nacional. E já estamos nos preparando para a nova fase, de eólica offshore (no mar) e de hidrogênio verde, inclusive, com várias empresas europeias.
E além dessa pauta verde?
Queremos avançar cada vez mais no turismo sustentável. As pessoas que chegam no Rio Grande do Norte pisam no chão do estado mais verde do Brasil. Temos nossas belezas naturais. São mais de 400 km de costa, com belos destinos, como os de Pipa e São Miguel do Gostoso, conhecidos mundo afora. Há, também, a Rota das Serras, o turismo religioso. Agora, estamos avançando em outra pauta muito importante, que é o turismo de aventura, o turismo histórico, através do geoparque reconhecido pela Unesco. O Brasil tem cinco geoparques listados pela entidade, e um deles fica no Rio Grande do Norte, na região do Seridó, em Currais Novos. São seis municípios envolvidos. Eu havia lançado, em 2023, na Bolsa de Turismo de Lisboa, a proposta de fazermos um fórum, começando por reunir os geoparques da Unesco dos países da língua portuguesa para a troca de experiência, de intercâmbio. E essa proposta prosperou. O primeiro fórum será entre 25 e 28 de março, em Currais Novos.
Os europeus reclamam que é muito caro viajar para o Brasil.
Sempre é desejável o barateamento das passagens aéreas, tanto as nacionais, quanto as internacionais. Mas essa carestia não é de agora.
A TAP já avisou que não tem como abrir novas rotas para o Brasil até 2025, por causa das limitações de aviões previstas em seu plano de reestruturação. É possível atrair outros voos internacionais para o estado?
Com certeza. Estamos nesse processo de aumentar o fluxo de voos internacionais. E temos de ressaltar um passo importante nesse sentido: a conclusão do processo de relicitação do Aeroporto Internacional de São Gonçalo do Amarante. Infelizmente, esse processo teve início em 2019 e não andava. Passamos três anos com um grande prejuízo. Um aeroporto espetacular, que estava abandonado. Lutei muito para que a relicitação saísse, mas só andou agora, com o governo Lula.
O aeroporto já está funcionando?
Assim que saiu o parecer do TCU, houve o leilão de concessão em maio do ano passado, na B3, a Bolsa de Valores de São Paulo. Quem ganhou a disputa foi a Zurich Airport, uma empresa conceituada, que já atua em Santa Catarina e no Espírito Santo. Então, o aeroporto tem um novo operador. Isso agrega muito e nos abre perspectivas de atração de mais voos nacionais e internacionais.