Todo-poderoso ministro da Casa Civil no primeiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva na Presidência, José Dirceu voltou à ribalta política de Brasília, na noite de quarta-feira, com direito a holofotes, banda e discurso. Na casa de um amigo — o advogado Marcos Meira — no Lago Sul, comemorou, com três dias de antecedência, os 78 anos de idade.
Políticos de todas as matizes ideológicas fizeram fila para cumprimentar o aniversariante em uma festa que reuniu mais de 500 pessoas. A demonstração pública de prestígio foi a volta, em grande estilo, de um dos principais conselheiros de Lula, que naufragou politicamente quando o Supremo Tribunal Federal (STF) o condenou, em novembro de 2013, a sete anos e 11 meses de prisão por corrupção passiva, no âmbito do Mensalão do PT.
Perto de meia-noite e sob protestos da filha Maria Antônia, de 13 anos, que queria que o pai cortasse logo o bolo de aniversário, José Dirceu fez um discurso de oito minutos sobre o clima político e econômico do país e cheio de recados ao PT e a seus aliados. E voltou a mostrar confiança em Lula, de quem se afastou após os escândalos que envolveram o partido de ambos. "Não há nada mais importante do que o terceiro governo Lula ser sucedido pelo quarto governo do Lula. E, depois, por um outro governo (do PT)", declarou.
Ele lembrou que Lula chegou ao governo em 2003 sem maioria parlamentar, como agora, no terceiro mandato. "Não chegamos ao governo com maioria no Parlamento, não chegamos ao governo com maioria no país. Chegamos pelas circunstâncias históricas do bolsonarismo, que possibilitou a criação de uma frente ampla que levou à vitória do Lula", disse.
Com a volta do presidente ao poder, o ex-ministro defende a necessidade de se criar condições para a retomada do desenvolvimento econômico e social, "interrompido pelos seis anos de (Michel) Temer e (Jair) Bolsonaro".
Na avaliação dele, o Brasil ainda não alcançou a independência econômica. "Um país que não tem independência sobre sua política econômica, o que, de certa forma, é o nosso caso, como é que pode pensar num projeto de desenvolvimento nacional?", perguntou aos convidados.
Eram muitas as autoridades presentes, como o vice-presidente Geraldo Alckmin, os ministros Alexandre Padilha (Relações Institucionais), Fernando Haddad (Fazenda), José Múcio Monteiro (Defesa), Juscelino Filho (Comunicações), Luciana Santos (Ciência e Tecnologia), Márcio Macedo (Secretaria-Geral da Presidência), Nísia Trindade (Saúde), Sílvio Costa Filho (Portos e Aeroportos) e Vinícius de Carvalho (Controladoria-Geral da União).
O presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, também compareceu, assim como o diretor do Banco Central Gabriel Galípolo, além de uma gama de advogados, como Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, do grupo Prerrogativas.
Lula, que esteve com Alckmin horas antes, na inauguração de uma fábrica de fertilizantes no interior de Minas Gerais, não foi à festa.
Petistas históricos dividiram o espaço generoso da mansão com caciques do Centrão. O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), chegou tarde, após às 23h, e saiu antes de Dirceu cortar o bolo, mas teve tempo para uma conversa ao pé do ouvido com o líder do União Brasil na Câmara, Elmar Nascimento (BA) — seu preferido para sucedê-lo em 2024 —, e Luís Tibé (Avante-MG).
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Câmara
Dirceu sentou-se por longo tempo à mesa em que estavam Nascimento e um grupo de jornalistas. Disse que Lira está jogando certo ao adiar a disputa para a Presidência da Câmara, que só vai esquentar mesmo no fim do ano. O pré-candidato de Lira, por sinal, foi um dos principais colaboradores da festa, bancada por amigos. Foi ele quem contratou a banda, que animou a comemoração com hits do rock brasileiro dos anos 1980.
O cardápio foi costela de boi assada com acompanhamentos tradicionais de churrasco, e salmão ao molho de maracujá. O convite pedia aos convivas que levassem uma garrafa de vinho.
Outros dois pré-candidatos ao comando da Câmara — o líder do PSD, Antônio Britto, e o presidente do Republicanos, Marcus Pereira — também passaram pela festa para abraçar Dirceu, além de quase toda a bancada do PT e do PCdoB, assim como os líderes do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), e no Congresso, Randolfe Rodrigues (sem partido-AP).
Mesmo afastado da cena política, o aniversariante nunca deixou de atuar nos bastidores. Observador privilegiado do cenário político do país, aponta os desafios do governo quando olha para o futuro.
"Temos duas condições de soberania que poucos países do mundo têm, a soberania de alimentos e a climática/energética. Mas não temos a (soberania) tecnológica. Se o Brasil não superar a questão da tecnologia, da educação, da industrialização do país, vai ser sempre dependente. Sabemos que a nossa agricultura depende totalmente de importação, dos chips, dos fertilizantes", avaliou, alertando que essas mudanças precisam ser rápidas porque, "daqui a 10 anos, o mundo será tão outro mundo que não temos mais 30, 40 anos para as mudanças. Temos 10 anos."
José Dirceu não esconde a vontade de voltar a disputar um mandato de deputado federal, mas seu futuro político ainda depende do desfecho dos processos aos quais responde no STF. Ele acredita que, até meados de 2025 — ano em que completam 20 anos de sua saída da Câmara, na crise do Mensalão —, estará livre para disputar eleições.
Dirceu foi preso três vezes, ao longo dos processos do Mensalão e da Lava-Jato. No Mensalão, a pena foi extinta após indulto presidencial (ratificado pelo ministro do STF Luís Roberto Barroso, atual presidente da Corte), mas ainda há recursos às decisões da Justiça Federal referentes à Lava-Jato, que correm no STF.
Diferentemente do ex-ministro da Fazenda (e tão poderoso quanto Dirceu na equipe do governo Lula 1) Antonio Palocci, que negociou acordo de delação premiada no Mensalão, o ex-chefe da Casa Civil sempre disse que nunca teve nada a delatar. Atualmente, repete que não almeja cargos no governo. "Hoje, eu quero ajudar o Brasil e o presidente Lula", resumiu. A contar pela presença de autoridades, políticos, economistas e advogados em sua festa, está conseguindo.
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