Em resposta ao que considera interferência indevida do Supremo Tribunal Federal (STF) em assuntos do Legislativo, o Senado avançou, nesta quarta-feira, com a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) das Drogas. O texto foi aprovado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e seguirá, agora, para apreciação do plenário. Caso receba aval dos parlamentares, será encaminhado para a Câmara.
A PEC 45/2023 foi aprovada no colegiado em votação simbólica. Os parlamentares acataram o relatório do senador Efraim Filho (União-PB), que acrescenta ao artigo 5º da Constituição um inciso para caracterizar como crime a posse e o porte de qualquer quantidade de droga.
Na prática, a PEC não altera a legislação em vigor no país atualmente. A proposta de emenda busca inserir na Constituição o que hoje está previsto por uma lei ordinária.
No STF, o julgamento sobre o tema foi suspenso, na semana passada, com um pedido de vista do ministro Dias Toffoli. A Corte discute se portar maconha para consumo próprio pode ou não ser considerado crime e a quantidade da droga que distinguirá usuário de traficante. O placar está em 5 x 3 para descriminalizar o porte para uso pessoal.
Na avaliação de senadores, o julgamento no STF é uma invasão de competência do Legislativo. "Era um posicionamento que precisava ficar muito forte. O fórum adequado para que se tratem situações dessa natureza, como essa situação que poderá ou não levar à descriminalização da droga no Brasil, é o Parlamento", declarou o relator da PEC, Efraim Filho. "É aqui onde estão as pessoas que foram eleitas e escolhidas pela população para representá-las em situações dessa natureza."
Dos 27 senadores, quatro foram contrários à proposta: Humberto Costa (PT-PE), Fabiano Contarato (PT-ES), Marcelo Castro (MDB-PI) e Jaques Wagner (PT-BA).
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Efetivamente, a PEC não altera a forma como usuários de drogas serão tratados pelas autoridades policiais e pelo Poder Judiciário. A proposta não fixa um parâmetro para diferenciar traficante de usuário, deixando em aberto a lacuna, que o STF busca preencher com o julgamento em curso.
De acordo com emenda à proposta, acatada pelo relator, essa distinção será feita pela autoridade policial ou judiciária observando "as circunstâncias fáticas do caso concreto".
Dessa forma, a aprovação da PEC, na avaliação de especialistas ouvidos pelo Correio, ganha contornos de um backlash — do inglês "retaliação", expressão da ciência política que caracteriza a reação dos parlamentos frente a determinadas decisões dadas em tribunais constitucionais.
Ironia
Na votação da PEC, senadores reconheceram essa reação ao STF. "Estamos generosamente retirando o Supremo do labirinto em que se enfiou. Porque, apreciando o art. 28, primeiro foram dados cinco votos contra a reiteração da criminalização e, depois, abriu-se a sessão para cuidar da dosimetria. Dosimetria, não da pena, que é algo que o nosso Judiciário faz com sabedoria e objetividade, mas da droga. Na dosimetria da droga, nem os melhores psiquiatras do Brasil conseguem unanimidade", declarou o senador Esperidião Amin (PP-SC).
Já Fabiano Contarato enfatizou o tratamento diferenciado ao usuário de droga. "Se um pobre preto, num local de bolsão de pobreza, vilipendiado nos seus direitos elementares, como falta de saneamento básico, iluminação pública, educação pública de qualidade, saúde pública de qualidade, for flagrado com um cigarro de maconha, as circunstâncias fáticas ali serão a cor da pele e o local do crime, e a ele vai ser atribuído tráfico de entorpecente", disse. "Agora, nos bairros nobres, pelos rincões do Brasil, aquele mesmo jovem, com a mesma quantidade, pelas circunstâncias fáticas, vai ser tratado como usuário de substância entorpecente."
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